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O que Moro fez contra o crime organizado para virar alvo do PCC
Operação da PF descobriu que PCC planejava homicídios e extorsão mediante sequestro contra o senador Sergio Moro e outras autoridades ligadas ao combate ao crime| Foto: Pedro França/Agência Senado

Um dos alvos dos atentados planejados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), maior organização criminosa do Brasil dedicada ao narcotráfico e a uma série de outros crimes violentos, o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) é um antigo desafeto do crime organizado. A Polícia Federal (PF) cumpre, nesta quarta (22), 11 mandados de prisão e 24 de busca e apreensão em quatro estados contra a facção criminosa que, além de atingir Moro, pretendia realizar ataques contra outras autoridades.

Um dos principais episódios que provocou a ira de facções como o PCC e o Comando Vermelho foi a determinação de Moro em fevereiro de 2019, quando ocupava o posto de ministro da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, de isolar lideranças de facções em presídios federais.

Ao longo daquele ano, diversas lideranças de organizações criminosas, várias do PCC, foram transferidas para presídios federais de segurança máxima, onde a rotina é mais rígida e não há possibilidade de comunicação com o exterior.

Um dos transferidos foi Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola. O criminoso, condenado a mais de 350 anos de prisão pelo cometimento de uma série de crimes como formação de quadrilha, roubo, tráfico de drogas e homicídio, é a principal liderança do PCC. Antes da transferência para a Penitenciária Federal em Porto Velho, Marcola comandava crimes de dentro da Penitenciária 2 de Presidente Venceslau, administrada pelo governo de São Paulo. Em janeiro, o criminoso foi deslocado para o Presídio Federal de Brasília após suspeita de um plano de fuga para libertá-lo.

Além de Marcola, ao todo foram transferidos para presídios federais mais de 320 líderes de facções como resultado da decisão de Moro. A ordem do ex-ministro foi um duro golpe no crime organizado e causou uma confusão generalizada nos comandos das facções.

O impacto da medida foi abordado em conversas telefônicas entre lideranças do PCC interceptadas pela Polícia Federal em 2019. Na ocasião, Alexsandro Pereira, conhecido como Elias, acusa o golpe. “Nós tiramos a liderança. Vai dar uma balançada, porque outros vão ter que assumir o lugar daqueles que saíram, mas só que também tem um ponto de interrogação. Quem vai assumir no lugar daqueles que saíram não tem a autonomia do que os que saíram tem”.

Em outra conversa, Elias critica a conduta do governo anterior contra o crime organizado e chega a citar proximidade do grupo com membros do Partido dos Trabalhadores (PT).

“Os caras começou o mandato agora, irmão. Agora que eles começou o mandato já mexendo diretamente com a cúpula, irmão. Com quem está na linha de frente. Então se os caras já começou mexendo com quem está na linha de frente, já entraram falando o que? ‘Com nós já não tem diálogo não, mano. Se vocês estavam tendo diálogo com outros que estavam na frente, com nós não vai ter diálogo’”, afirmou o criminoso.

“Esse Moro aí, esse cara é um filho da puta, esse cara é um filho da puta mesmo, mano. Ele veio pra atrasar. Ele já começou a atrasar quando veio para cima do PT. Para você ver que o PT com nós tinha diálogo. O PT tinha um diálogo com nós cabuloso, mano”.

A ordem de transferência era bastante ousada, já que as retaliações são comuns após esse tipo de medida. Uma decisão do governo de São Paulo, em 2006, de deslocar lideranças do PCC para o presídio de segurança máxima de Presidente Venceslau, no interior do estado, provocou uma onda inédita de violência com ataques orquestrados contra civis e agentes de segurança. Os ataques resultaram em 564 pessoas mortas, incluindo dezenas de policiais. Apesar disso, a desestruturação da comunicação dos líderes do grupo criminoso impediu que ataques massivos de retaliação fossem executados.

Mudanças nas regras de visitas íntimas para faccionados e pacote anticrime

Outra medida executada sob a gestão de Sergio Moro como ministro da Justiça foi a edição de portaria que tornou mais rígidas as regras para visitas sociais em prisões federais de segurança máxima. As visitas, anteriormente presenciais nos pátios de visitação, passaram a ser permitidas apenas para presos com perfil de réu colaborador ou delator premiado, enquanto os demais passaram a ter contato restrito ao parlatório e à videoconferência. Em outras palavras, presos perigosos que se negassem a colaborar com a Justiça perderam qualquer tipo de contato presencial com pessoas de fora dos presídios.

Já as visitas íntimas nos presídios federais haviam sido proibidas durante o governo Michel Temer. A portaria que trouxe essa determinação é alvo de questionamentos diversos no Superior Tribunal Federal (STF), uma delas protocolada por uma ONG acusada de ligação com o narcotráfico.

Um outro golpe ao crime organizado que teve origem a partir de atuação de Sergio Moro foi o pacote anticrime, que entrou em vigor no início de 2021 após aprovação do Congresso Nacional. As mudanças, cujo objetivo foi o endurecimento no combate à corrupção, ao crime organizado e a crimes violentos, foram propostas por Moro enquanto era ministro de Bolsonaro.

Algumas das medidas aprovadas que impactam diretamente membros de facções criminosas são o aumento do prazo máximo em que presos considerados perigosos podem ficar isolados em presídios federais, que passou de 360 dias para três anos, renováveis por mais três; a ampliação do tempo de cumprimento de prisão para que membros de facções tenham acesso à progressão de pena; o aumento do tempo máximo de cumprimento de prisão no Brasil, que passou de 30 para 40 anos para qualquer tipo de crime; e a vedação das saídas temporárias dos presídios em datas festivas para condenados por crimes hediondos.

Para Rogério Greco, especialista em segurança pública e crime organizado, pós-doutor em Direito e atual secretário de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais, o plano de atentado contra Moro pode representar retaliação por uma série de medidas do ex-ministro contra o crime organizado. Ele destaca, entretanto o isolamento das lideranças do PCC, em especial a de Marcola.

“O isolamento é uma medida muito importante, porque de fato isola de qualquer comunicação. Não tem mais contato com outros presos, fica 22 horas na cela com duas horas de banho de sol. Acaba aquela coisa da organização criminosa de dentro da cela. O contato com o mundo exterior é muito mais limitado”, explica. “Para o criminoso é horrível, porque ele quer contato com todo mundo para manter a comunicação com o lado de fora, quer acesso a celular. Mas na penitenciária federal isso não acontece”, prossegue Greco.

Operação da PF

Em investigações da Operação Sequaz, agentes da PF descobriram que o PCC pretendia cometer crimes como homicídios e extorsão mediante sequestro no Distrito Federal e nos estados do Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Rondônia. Segundo a PF, os ataques ocorreriam de forma simultânea, e os principais investigados estão no Paraná e em São Paulo. Até esta manhã, nove pessoas haviam sido presas.

Além do ex-ministro, outras autoridades ligadas ao combate ao crime eram alvo da facção, como o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, que atua há anos em investigações sobre a atuação do PCC.

Pelo Twitter, o senador anunciou que na tarde desta quarta-feira (22) fará um pronunciamento na tribuna do Senado para comentar o caso.

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