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Ao nos depararmos com um grupo de carrinheiros conversando sobre lixo reciclável, devemos ficar atentos para a possibilidade de eles saberem mais do que nós. Se sabem o valor dos resíduos, se sabem separá-los, se sabem quanto vale cada produto, não podem ser ignorantes. O que lhes falta é um saber sistematizado, diria o pedagogo Paulo Freire. Para ele, todo saber traz consigo sua própria superação, não há saber nem ignorância absoluta. "Há somente uma relativização do saber ou da ignorância", conclui.

O que os carrinheiros dominam é o conhecimento tácito, adquirido com as próprias experiências ao longo da vida. O homem tende a captar uma realidade e fazê-la objeto de seus conhecimentos. "Assume a postura de um sujeito cognoscente de um objeto cognoscível. Isto é próprio de todos os homens e não privilégio de alguns", diz Freire. Quando o homem compreende sua realidade, pode levantar hipóteses sobre o desafio dessa realidade e buscar soluções. Assim fazem os catadores, e as soluções por eles encontradas não dizem respeito apenas à própria subsistência.

Eles respondem por 90% de todo o lixo reciclável coletados em Curitiba. E não é pouca coisa. Das 2,4 mil toneladas de rejeitos produzidas por dia na capital e cidades vizinhas, 75% vão parar no aterro sanitário da Caximba. Os catadores retiram das ruas outras 500 toneladas, dez vezes mais do que os 170 servidores e os 27caminhões dos dois programas da prefeitura, o Lixo que não é Lixo e o Câmbio Verde. Sendo a coleta algo necessário e o poder público incapaz de recolher todo o resíduo que se produz, os coletores tornaram-se, portanto, indispensáveis.

No Brasil, mais gente tira o sustento do lixo do que nos hospitais ou tribunais. Há 15 mil catadores em Curitiba e região metropolitana, 800 mil em todo o país, mais do que os 700 mil advogados e os 350 mil médicos em atividade. Mas só 60 mil estão organizados em cooperativas e associações, segundo o Mo­­vimento Na­­cio­­nal de Ca­­tadores de Materiais Re­­cicláveis. Em Cu­­ri­­­­tiba e região, 500 são atendidos pelo Instituto Lixo e Ci­­dadania, que conta com 53 arranjos coletivos no Paraná.

Ali eles aprendem a trocar a cultura da competição pela de cooperação, diz o secretário executivo do Fórum Lixo e Ci­­da­­dania, Sérgio Roberto Faria. A ONG tem permitido avanços na qualidade do trabalho, tornando-os empreendedores. Os setores público e privado encontraram neles um parceiro para pôr em prática sua responsabilidade social e ambiental, e cada vez mais têm destinado lixo reciclável às associações e cooperativas de catadores. (MK)

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