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| Foto: Vanor Correia/ Divulgação

Qual é o principal problema enfrentado pela magistratura atualmente?O principal problema é a falta de maior participação dos magistrados, sobretudo os de primeiro grau, no âmbito da administração dos tribunais. Isso tem reflexo na sociedade, uma vez que essa falta de participação inibe o enfrentamento de questões essenciais para melhorar as condições de trabalho dos magistrados (como a falta de recursos) e, consequentemente, a qualidade do serviço prestado à população.

Quais serão suas prioridades na AMB?

Primeiro: a necessidade de aprofundar a democratização interna do Judiciário. É preciso inserir os juízes na discussão dos destinos do Poder Judiciário. Segundo: nós entendemos que é de fundamental importância para a magistratura brasileira ter um regime previdenciário próprio, porque é uma carreira de Estado e uma carreira com características especiais. O terceiro ponto em que vamos nos centrar é a discussão do estatuto da magistratura, que deve ser encaminhado no início da próxima legislatura pelo Supremo Tribunal Federal, e que vai regulamentar todo o exercício da magistratura, deveres e direitos dos magistrados. E nós compreendemos que o fortalecimento da magistratura é o fortalecimento da própria democracia brasileira. Vamos nos concentrar nesses três pontos fundamentais, sem esquecer as prerrogativas da magistratura. Precisamos ter um diálogo mais franco com a sociedade no sentido de demonstrar que o fortalecimento dessas prerrogativas da magistratura é de fundamental importância para o fortalecimento da própria democracia.

Qual é a sua opinião sobre a atuação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)?

Tenho até um texto com relação ao CNJ, que está no meu blog (www.gervasiosantos.com.br), que chama O remédio não pode virar veneno. É basicamente o que penso. Com isso, quero dizer que o CNJ é uma instituição importante, porque confere ao Judiciário caráter nacional. Ele tem o mérito de permitir e aprofundar a discussão sobre o Poder Judiciário. Mas não podemos incorrer em alguns equívocos que estão sendo cometidos pelo CNJ. O principal problema do CNJ é que, até hoje, ele não tem nenhuma regulamentação. E o nosso principal objetivo dentro da AMB é que, no âmbito do estatuto da magistratura, sejam estabelecidos parâmetros claros para a atuação do CNJ.

O que o sr. pensa do quinto constitucional?

Isso tem que mudar. Sou absolutamente contrário ao quinto. O quinto surgiu em em 1934, na chamada Constituição corporativa, com a justificativa histórica de que o quinto oxigenaria os tribunais. Primeiro, isso não tem acontecido – historicamente, não se vê nenhuma mudança de postura dos tribunais em razão da presença do quinto. Segundo, hoje temos o CNJ, que é composto por pessoas alheias à magistratura (advogados, membros do Ministério Público, representantes da sociedade), que fazem esse componente, que dão essa visão externa à magistratura. E tem um outro aspecto: o quinto desvaloriza a magistratura de carreira. O quinto, que não é um mecanismo democrático, em muitos estados é utilizado como moeda política, tanto que em alguns lugares há pessoas ligadas ao Executivo local que acabam ascendendo aos tribunais.

Segundo o Índice de Confiança no Judiciário do 2.º trimestre de 2010, levantado pela Fundação Getúlio Vargas, apenas 33% da população diz confiar no Judiciário. O sr. concorda que a Justiça vive uma crise de credibilidade? O que fazer para mudar esse quadro?

Primeiramente, é preciso registrar que, apesar de os índices de credibilidade do Judiciário não estarem nos patamares em que nós gostaríamos que estivessem, a sociedade brasileira cada vez mais recorre ao Poder Judiciário. Para se ter uma ideia, no ano passado foram 28 milhões de novas ações. Nunca se bateu tanto às portas do Judiciário como na atualidade. No início da década de 1990, nós tínhamos um total de 5 milhões de ações ajuizadas no país. Hoje, nós temos 80 milhões de ações. Isso demonstra que a população descobriu que o Judiciário é um refúgio para suas demandas. Agora, evidentemente, os resultados ainda não vêm com a celeridade que a população desejaria, daí talvez decorram esses índices de aprovação reduzidos. Mas é preciso também compreender o seguinte: o juiz brasileiro, quando tomado do ponto de vista individual, é o mais produtivo do mundo. O que ocorre é que, embora tenhamos uma demanda típica do século 21, ainda trabalhamos com uma estrutura do século 20. Essa diferença faz com que a qualidade dos nossos serviços ainda nãos sejam bem avaliada pela sociedade. As soluções para esse problema são: primeiro, aumentar o investimento no Poder Judiciário; segundo, qualificar os gastos efetuados pelas administrações do Poder Judiciário; terceiro, diminuir a diferença de estrutura entre magistrados de primeiro e segundo graus, porque, via de regra, temos boa estrutura no âmbito do segundo grau e uma estrutura absolutamente precária no âmbito do primeiro grau, embora as demandas sejam maiores no primeiro grau – de cada cem ações, apenas 12 chegam ao segundo grau.

A sociedade não aprova prerrogativas da magistratura, como a aposentadoria compulsória punitiva. O que o sr. pensa a respeito?

Essa questão é mal interpretada, porque isso não significa dizer que o juiz não pode ser demitido, muito pelo contrário. Significa dizer que, no âmbito administrativo, a pena máxima é a aposentadoria compulsória. Agora, uma vez aplicada a aposentadoria compulsória, o processo administrativo deve ser encaminhado ao Ministério Público e compete ao MP proceder à respectiva ação judicial para que magistrado possa vir a perder o cargo. Isso é que nós chamamos de vitaliciedade, ou seja, vitaliciedade não é sinônimo de impunidade, mas significa tão somente que o magistrado somente poderá perder o cargo através de uma decisão judicial. Esse aspecto é de fundamental importância para o exercício da judicatura. Em todos os países democráticos, com sistemas assemelhados ao do Brasil, o magistrado é vitalício, porque a vitaliciedade é garantia de independência e autonomia do Poder Judiciário em relação aos demais poderes. Tanto que, todas as vezes que nós temos um Executivo muito forte, que temos um chefe de Executivo com objetivos de implantar uma ditadura, primeiro ele quebra a vitaliciedade, depois, cerceia a liberdade de imprensa, vide a Venezuela, onde o primeiro passo do Hugo Chávez foi quebrar a vitaliciedade da magistratura e, depois, calar a imprensa. Então, a vitaliciedade, mais do que uma prerrogativa da magistratura, é uma garantia da democracia brasileira. São duas faces de uma mesma moeda: não há estado democrático sem magistratura independente, assim como não há magistratura independente sem estado democrático. É preciso deixar isso claro para o parlamento e para a sociedade. Precisamos fazer uma re-engenharia do nosso discurso, para que a sociedade possa compreender as razões da existência dessas prerrogativas.

A sociedade também costuma criticar os 60 dias de férias da magistratura. O que o sr. pensa sobre o tema?

Isso também é muito mal compreendido. Os magistrados, diferentemente dos demais servidores e trabalhadores, não possuem carga horária máxima de trabalho, não fazem jus a horas extras, não recebem gratificação por plantão. Sob ponto de vista econômico, é muito mais barato para o erário compensar os magistrados com 30 dias de férias extras do que pagar esses direitos. E também é muito mais efetivo para a Justiça. Imagine o caso do casal Nardoni, em que o magistrado trabalhou em média 18 horas por dia. Será que ele conseguiria realizar esse julgamento se tivesse que obedecer a uma carga horária máxima de trabalho? Ele não só não foi remunerado pelas horas extras, como na segunda-feira, depois do julgamento, enquanto os jurados gozavam de folga, ele estava no seu gabinete. Esse debate, até agora, foi muito mal encaminhado. É preciso dizer, com todas as letras: é mais barato para o erário e mais efetivo para a sociedade que o magistrado tenha 30 dias de férias extras, em compensação a uma série de direitos socais que são garantidos aos demais servidores e trabalhadores.

* Conheça mais ideias e propostas do candidato Gervásio Protásio dos Santos no site www.ambcomvoce.com.br.

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