
A combinação de poucas horas de sono e muito tempo dirigindo diariamente é perigosa. Quando o corpo não responde mais, motoristas que lutam contra o tempo para entregar mais cargas e, assim, ganhar mais dinheiro, começam a usar e abusar de substâncias psicoestimulantes, como café, refrigerantes e até anfetaminas (o conhecido rebite). Para a Polícia Rodoviária Federal, 18% dos motoristas parados em estradas paranaenses admitem usar anfetaminas para agüentar a rotina do trabalho. O mais curioso, entretanto, é que apenas 7% deles dizem que continuam dirigindo mesmo quando estão com sono.
A pesquisa de pós-doutorado do psiquiatra e professor da Universidade Católica Dom Bosco de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, José Carlos Souza, mostra que, dos 406 caminhoneiros entrevistados (200 de Portugal e 206 do Brasil), em média, 95% deles disseram que fazem uso de estimulantes. Ainda, 11% confirmaram já ter usado o rebite (anfetaminas).
"Falta fiscalização. O caminhão não pode circular à noite porque o pico de sonolência de uma pessoa ocorre entre as 22 horas e 3 horas da madrugada", explica Souza. No momento que o corpo não agüenta mais, descobre-se que uma carreta tombou em uma reta porque o motorista estava há dois dias sem dormir. "Se o caminhoneiro não tiver conscientização, nada vai mudar. Muitos dizem que vão até o Paraguai para comprar anfetaminas, porque lá o uso não é restrito", comenta Souza.
O psiquiatra analisou o comportamento dos caminhoneiros brasileiros e portugueses e percebeu que algumas medidas adotadas em Lisboa ajudam a minimizar os acidentes. "No Brasil, as estradas são monótonas nas laterais. Se olharmos nos cantos das rodovias, é sempre a mesma coisa. Isto causa sonolência. Em Lisboa, as rodovias são mais dinâmicas e ajudam o motorista a ficar desperto", comenta Souza. Além disso, os portugueses costumam dormir mais que os brasileiros, têm maior instrução escolar e ganham mais.
Na conclusão da pesquisa, Souza alerta para o perigo, que é tendência, de o caminhoneiros desenvolverem distúrbios do sono. "É polêmico. Mas já existe um projeto de lei que quer exigir o exame de polissonografia dos motoristas, para que eles tratem dos problemas que decorrem de uma noite mal dormida. Eles precisam estar conscientes de que é preciso parar quando se tem sono. Precisam saber dos seus limites", comenta o psiquiatra.
O presidente do Sindicato dos Caminhoneiros Autônomos do Paraná (Sindcam), Dilmar Bueno, afirma que deveria haver uma fiscalização maior nas estradas. O problema é que ainda nenhuma lei foi aprovada para assegurar a autuação, em casos de infrações.
"Existem projetos de lei para regulamentar o tempo de trabalho. Com o sistema de tacógrafo (aparelho que registra o tempo que o motorista está dirigindo e a velocidade) seria possível impedir os motoristas de fazer hora extra e trabalhar além da conta. Falta a lei ser aprovada para que se regule quanto seria este tempo. Defendemos que, no mínimo, os motoristas devem ter oito horas de descanso ininterrupto", afirma.



