• Carregando...
Recadastramento de armas na PF: deputados se articulam para derrubar medida do governo
Governo Lula revogou uma série de normas sobre posse e porte de armas do governo Bolsonaro| Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Deputados pró-armas têm apontado irregularidades na portaria do governo que determinou o recadastramento de armas por CACs (colecionadores, atiradores desportivos e caçadores) em até 60 dias. Para eles, o documento é ilegal, burla competência que deveria ser exclusiva do Exército, ignora o Estatuto do Desarmamento e coloca em risco a segurança dos CACs. Os parlamentares estão se organizando para avançar um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que barre as instruções da portaria.

No dia de sua posse, o presidente Lula (PT) assinou um decreto para limitar o acesso a armas e munições no país, suspendendo a concessão de novos certificados de registro a CACs e anunciando a necessidade de recadastrar armas obtidas a partir de 2019. No dia 31 de janeiro, por meio do Ministério da Justiça, o governo definiu um prazo para esse recadastramento: até o próximo dia 2 de abril.

Todas as armas deverão ser recadastradas no sistema da Polícia Federal, o Sistema Nacional de Armas (Sinarm) – inclusive aquelas que pertencem a CACs e que, de acordo com o Estatuto do Desarmamento, deveriam ser registradas somente no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma), o banco de dados sobre armas do Exército brasileiro. Pela lei, somente as armas usadas para defesa patrimonial precisariam estar cadastradas no Sinarm, da PF.

“Essa determinação de recadastramento é absolutamente ilegal, porque contraria o Estatuto do Desarmamento, a lei 10.826, que prevê que armas de calibre permitido serão cadastradas no Sinarm e armas de calibre restrito serão cadastradas no Sigma”, critica o deputado federal Paulo Bilynskyj (PL-SP), autor de um dos projetos de lei que estão sendo protocolados contra a medida do governo.

O deputado federal Marcos Pollon (PL-MS), que coordena a Proarmas, principal associação pró-armamentismo do Brasil, diz que o cenário na classe é de “terra arrasada”. “A portaria que institui o recadastramento é completamente ilegal, porque o próprio Estatuto do Armamento estipula que a competência de fiscalizar isso é do Exército”, afirma. “Aqui no Legislativo, a gente tem tentado criar um bloco coeso de defesa dessas pautas para poder avançar nos PDLs, porque a gente sabe que é difícil você colocar um PDL contra um governo recém-eleito no começo de mandato.”

Além de Bilynskyj, deputados como Caroline de Toni (PL-SC), Pedro Lupion (PP-PR) e Ubiratan Sanderson (PL-RS) estão trabalhando em projetos de lei simultaneamente. Pollon acredita que essa estratégia é precipitada.

“Não tem o menor sentido. O ideal é ter calma. Por isso é que eu não apresentei nenhum. Em vez de ficar apresentando uma sequência de PDLs e PECs ou de qualquer outra coisa, eu estou tentando concatenar apoiadores. ‘Vou fazer uma sequência de mil projetos de lei e pronto…’ Não é assim que funciona a casa. O eleitor fica feliz, mas atrapalha o desenvolvimento do trabalho”, diz Pollon.

Co-autora do projeto de Sanderson, a deputada federal Silvia Waiãpi (PL-AP) afirma que cada parlamentar pró-armas tem adotado uma linha de atuação, mas que “lá na frente, todos atuarão em conjunto”. “Nós lutamos pela igualdade de direitos, pelo direito de defesa, inclusive da nossa própria vida. No momento em que nós enfrentamos a tentativa de uma política pública de desencarceramento de meliantes, em que nós condenamos as nossas forças de segurança, em que tiramos a legitimidade da atuação dessas forças, em que colocamos a nossa população à mercê do crime organizado, a população de bem está se tornando refém da criminalidade. Não é a população brasileira que estamos protegendo (com a portaria do governo)”, comenta a deputada.

Parlamentares veem risco à segurança dos CACs no processo de recadastramento de armas

Outro temor dos parlamentares relacionado à medida do governo é quanto a possíveis atos violentos contra CACs que forem recadastrar suas armas.

Bilynskyj afirma que a portaria “impõe uma espécie de prova de vida” ao ordenar que o atirador esportivo tenha que levar a sua arma de calibre restrito até a PF. “Isso expõe a segurança do atirador, porque ele tem que levar a arma de casa até a Polícia Federal sem nenhuma espécie de segurança. Ele não pode estar armado, então ele está 100% exposto à criminalidade.”

Pollon teme a hipótese de que criminosos fiquem próximos às delegacias da Polícia Federal para abordar quem tem armas e roubar seus equipamentos. “Imagina uma pessoa que tem 15 fuzis. Ela vai fazer o quê? Vai botar numa caçamba de uma caminhonete e vai sair desfilando pela cidade até chegar à polícia, sem ter uma arma para se proteger? Isso é um tremendo absurdo”, afirma.

Outro ponto críticado pelos parlamentares é o trecho da portaria que enquadra no crime de posse irregular de arma de fogo, descrito no Estatuto de Desarmamento, quem não recadastrar sua arma. “É um absurdo jurídico em todos os níveis. Viola o princípio da legalidade, a Constituição Federal e o Estatuto do Desarmamento, pois cria um novo crime sem lei. O objetivo real dessa portaria é criminalizar a legítima defesa no Brasil. É um absurdo”, diz Bilynskyj.

Os deputados reclamam ainda da falta de abertura ao diálogo do Ministério da Justiça. “É uma postura completamente ditatorial e antidemocrática. Na frente de trabalho deles, as únicas entidades civis que participam são entidades reconhecidamente desarmamentistas, que recebem financiamento internacional da Open Society para fazer esse tipo de intervenção. Por que eles não abrem o diálogo com as entidades da sociedade civil organizada que reconhecidamente entendem do tema e que são favoráveis ao armamento civil? Por que só abrem para desarmamentistas?”, pergunta Pollon.

Os questionamentos do deputado foram levados pela Gazeta do Povo ao Ministério da Justiça, mas o órgão ainda não havia respondido ao pedido de posicionamento até a tarde de sexta-feira (10).

Bilynskyj afirma que deverá levar o caso ao Judiciário, por considerar que o Legislativo teve a sua atribuição usurpada. “Enxergo o cabimento de habeas corpus preventivo para evitar possível prisão em virtude do descumprimento da ordem de recadastramento. Também há a possibilidade de mandado de segurança, tendo em vista o direito líquido e certo de cadastrar suas armas de calibre permitido no Sinarm e de calibre restrito no Sigma”, observa.

Enquanto buscam solução, os parlamentares pedem paciência aos donos de armas afetados pela portaria. “A orientação é que tenham calma para a gente analisar a extensão do dano e ver quais vão ser as consequências. São 60 dias para fazer. Não tem por que fazer na primeira semana. Isso pelo menos até a gente entender o que está acontecendo, porque é uma norma completamente ilegal e absurda”, diz Pollon.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]