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Brasília – A dez dias do fim do primeiro semestre de trabalhos no Congresso Nacional, a nova legislatura patinou na votação de reformas fundamentais, mas manteve a performance na produção de escândalos. Se nos quatro anos anteriores ficaram consolidados termos como "sanguessugas" e "mensalão", bastaram pouco mais de cinco meses para que as palavras "navalha" e "Renangate" tirassem o sono dos parlamentares e indignassem a população. Outra vez, mais do que a criação de crises, o que ganha destaque é a avidez para abafá-las.

A agenda de 2007 começou tranqüila e, como antes, nas mãos do Poder Executivo. O primeiro tema a ser tratado foi o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que encheu a pauta da Câmara e do Senado de medidas provisórias. Das 22 normas jurídicas que passaram a vigorar neste ano, nove são relacionadas ao PAC.

Dessas novas regras, 18 partiram de propostas do governo, no formato de medidas provisórias. "Trabalhamos apenas em cima do que ‘eles’ querem", diz o deputado federal Gustavo Fruet (PSDB-PR), referindo-se à interferência do Executivo. Entre as normas, está a polêmica liberação de R$ 100 milhões de crédito extraordinário para a realização dos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro.

Enquanto isso, dois dos quatro projetos vindos do Poder Legislativo que já estão em vigor são referentes a aumentos de 29,81% nos próprios salários.

Um deles reajustou para R$ 16.512,09 o vencimento de senadores e deputados federais. O outro, para R$ 11.420,21 o salário do presidente.

"Acredite se quiser, mas ‘evoluímos para pior’. A Câmara manteve os vícios e problemas, enquanto o Senado conseguiu criar novos", avalia o deputado federal Affonso Camargo (PSDB-PR), que soma três décadas como congressista. "Foi um semestre terrível, o pior de todos esses que estou aqui."

Além da agenda legislativa, a interferência do Executivo também afetou a criação de comissões parlamentares de inquérito. A ingerência ficou clara durante a criação da CPI do Apagão Aéreo na Câmara, que por pouco não saiu do papel. Graças a uma manobra da maioria governista, o tema foi parar no Supremo Tribunal Federal, que decidiu por unanimidade pela abertura das investigações.

A demora fez com que o Senado abrisse uma CPI similar. E, apesar do funcionamento paralelo das duas comissões, não houve reflexos no sistema aéreo brasileiro. De crise em crise, as duas últimas semanas representaram o mais longo período de atrasos desde a queda do boeing da Gol, em setembro do ano passado.

Mas não foi apenas por força do Palácio do Planalto que poucas investigações caminharam no Congresso em 2007. Em maio, a Operação Navalha, da Polícia Federal, denunciou um esquema que fraudava licitações em obras públicas. Havia indícios de envolvimento de parlamentares, mas a CPI sobre o caso não saiu porque, depois de assinar o requerimento de abertura, vários deputados voltaram atrás.

Da crise aérea, passando pela Operação Navalha, o Congresso enfrentou até suspeitas de tentativa de homicídio entre parlamentares mineiros. De acordo com inquérito da Polícia Civil, o deputado Mário de Oliveira (PSC) teria encomendado o assassinato do colega Carlos Willian (PTC). Pastor evangélico, Oliveira nega o crime, mas já está sendo investigado pelo Conselho de Ética da Câmara.

Pelo lado do Senado, a atuação do Conselho de Ética "coroou" o primeiro semestre de escândalos do Senado. Acionado para investigar as denúncias de que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), tinha contas pessoais pagas pelo lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira Mendes Júnior, o Conselho ficou marcado por uma sucessão de jogadas para protelar a apuração do caso. Com menos de um mês no cargo, o presidente Sibá Machado (PT-AC) renunciou. Pelo mesmo rumo foram dois relatores escolhidos para o caso, Epitácio Cafeteira (PTB-MA) e Welington Salgado (PMDB-MG).

Apesar das pressões, quem não renunciou e promete "não arredar o pé" do posto é Renan. No entanto, a estratégia de protelar as investigações surtiu efeito contrário e deu tempo para que os documentos apresentados em sua defesa fossem investigados – só que pela imprensa. As suspeitas de enriquecimento ilícito do senador aumentam e, agora, ao invés de um relator "confiável" para o seu caso, ele ganhou dois dispostos a aprofundar o inquérito, que só deve acabar após o recesso entre os dias 18 e 31 de julho.

Enquanto isso, o Congresso arrasta-se para encerrar o semestre, que deixará poucas lembranças positivas para o eleitor. Assim resume o deputado federal Alceni Guerra (DEM-PR), que também foi fustigado por investigações quando ministro da Saúde do governo Fernando Collor, caiu, mas foi inocentado pela Justiça. "Trata-se de um Congresso esquizofrênico, que deixa a população paranóica. Esses escândalos só reforçam a teoria de que todo político é ladrão, até que se prove o contrário."

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