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Operários trabalham na barragem da Samarco, em Mariana | YASUYOSHI CHIBA/AFP
Operários trabalham na barragem da Samarco, em Mariana| Foto: YASUYOSHI CHIBA/AFP

Em um vale devastado pela lama liberada há um ano pela ruptura de uma barragem de mineração, que matou 19 pessoas em Minas Gerais, surge uma imagem incongruente: placas mostram um trabalhador que sorri sob o slogan “Comunique-se de forma positiva”.

As placas sobressaem em meio à poeira levantada pelos caminhões e escavadoras que operam na região, onde aconteceu a que é considerada a pior tragédia ambiental do Brasil.

Doze meses depois do desastre na exploração de minério de ferro da Samarco – propriedade das gigantes mundiais da mineração Vale e BHP Billiton – no distrito de Bento Rodrigues, na cidade histórica de Mariana, há pouco de positivo para comunicar.

GALERIA DE FOTOS: veja imagens atuais da região atingida pelo rompimento da barragem

A barragem cedeu em 5 de novembro de 2015, derramando 32 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro, que segundo a ONU continham perigosas substâncias contaminantes.

O tsunami de lama se arrastou por 640 km ao longo do Rio Doce, matando trabalhadores mineiros e habitantes de Bento Rodrigues. Outras milhares de pessoas perderam suas casas e seus trabalhos.

A Samarco insiste que está fazendo todo o possível para superar o que considera um acidente trágico, mas inevitável.

Mas as vítimas e os promotores brasileiros – que interpuseram acusações contra 21 executivos por homicídio qualificado, assim como demandas no valor de bilhões de dólares – contam outras versões da história.

Onde estão as casas?

O maior compromisso da Samarco é construir novos povoados para os habitantes de Bento Rodrigues e Paracatu, outra comunidade rural que foi enterrada pela lama, mas que não registrou mortes.

Até hoje, nenhum tijolo foi colocado. O único sinal de progresso é uma placa metálica onde se lê “Novo Bento”, no meio de uma floresta que se tornará um local de construção, mas que por enquanto só abriga borboletas tropicais, pássaros e ninhos de cupins.

“Um ano inteiro e não aconteceu nada. Não fizeram nada além de comprar a terra”, reclama um dos moradores deslocados, Antonio Geraldo Santos, de 33 anos, ao sair de uma reunião com antigos vizinhos em Mariana.

A anglo-australiana BHP, a maior mineradora do mundo, e a brasileira Vale, a maior produtora de minério de ferro, asseguram que eles e a Samarco estão comprometidos com a reparação de comunidades prejudicadas, da infraestrutura mineira e do meio ambiente.

Alvaro Pereira, da Fundação Renova, criada pela Samarco para coordenar ajudas e indenizações, diz que 8 mil famílias ribeirinhas do Rio Doce estão recebendo fundos de emergência. Muitas dependiam da pesca ou do turismo na região onde o Rio Doce desemboca no Oceano Atlântico, e perderam sua renda.

Mas os mais atingidos foram os que moravam perto da barragem e tiveram apenas alguns minutos para correr para salvar suas vidas quando houve a ruptura. Perderam tudo, desde carros até fotos de família.

Em Bento Rodrigues, 236 famílias foram obrigadas a fugir, segundo a Renova. Outras 108 foram deslocadas de Paracatu.

Pereira assegura que existe um “enorme senso de responsabilidade” e atribui a demora na reconstrução à lentidão das consultas com os habitantes e as autoridades.

“Muitos perguntam porque ainda não começou”, explica Pereira durante um percurso com a imprensa, no qual responsáveis da Samarco monitoravam cada conversa entre funcionários e jornalistas.

“Mas há muito trabalho que não se vê”, acrescenta, assegurando que a construção será concluída até o início de 2019.

Justiça e empregos

Em contraste, há um trabalho frenético para reconstruir uma barragem que vai reter um reservatório de rejeitos ainda maior, depois de ter ficado gravemente danificada durante o acidente no ano passado. “Estamos trabalhando 24 horas por dia, sete dias por semana”, disse a jornalistas Eduardo Moreira, chefe do projeto.

Grandes caminhões, retroescavadoras e pelotões de homens com roupas de trabalho laranjas e capacetes removem terra e rochas para construir a barragem no centro de uma ampla zona baldia que a Samarco escavou em meio a colinas verdes.

Pequenos diques estavam sendo construídos mais abaixo para garantir que os rejeitos deixados pela ruptura da barragem do ano passado não vão mais longe. Ao ser consultado sobre o risco de que outra barragem ceda, Moreira responde: “É virtualmente impossível”.

A Samarco e seus proprietários multinacionais enfrentam uma avalanche de ações judiciais, como as demandas dos promotores de indenizações no valor de US$ 155 bilhões ou a possibilidade de que os 21 executivos e funcionários acusados enfrentem longas sentenças por homicídio qualificado.

O promotor de justiça de Minas Gerais, Guilherme de Sa Meneghin, acusa a Samarco de “recorrer a truques para atrasar” cada passo nas indenizações. “Só cumprem com as suas obrigações quando são forçados pela justiça”, declarou à AFP.

Apesar da indignação, as vítimas esperam que a Samarco retome suas atividades, paralisadas desde o desastre.

A empresa empregava 3 mil pessoas, das quais cerca de mil estão agora sem trabalho. Havia também cerca de 3 mil contratistas e “muitos” foram demitidos, afirmou um porta-voz.

“É realmente uma situação muito complexa, visto que a mineração é a principal atividade de Minas Gerais. A relação com a mineração é muito forte, por isso querem que a Samarco reabra”, comenta Meneghin. “Mas não querem que eles sejam perdoados ou que fujam da sua responsabilidade”, acrescenta.

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