• Carregando...

Calote, fuga e prisão em SP

O desespero tomou conta de Campo Largo no dia 20 de março de 2006. Depois de uma série de boatos de que o então vereador Cláudio Thadeu Cyz não teria condições de retornar o dinheiro aplicado por centenas de moradores, Cyz e a esposa Adelir Suzuki desapareceram. Após faltar a cinco sessões ordinárias consecutivas na Câmara Municipal, no dia 24 de abril, Cyz teve o mandato cassado. Provas foram apreendidas no escritório e no apartamento de Cyz. Dois meses após a fuga, ele e a esposa foram presos pela Polícia Federal (PF) em São Paulo, quando desembarcavam de Portugal. Ficaram 52 dias presos e conseguiram habeas-corpus para responder o processo em liberdade. Desde então, moram em Curitiba. A PF estimava que o suposto golpe tenha rendido cerca de R$ 70 milhões, mas os rumores na cidade indicam um calote muito maior: Cyz teria sumido com R$ 200 milhões. Ele alega que o prejuízo tenha ficado em torno de R$ 10 milhões e conta que teria cerca de 2,5 mil clientes.

Às vésperas de completar um ano do calote milionário aplicado pelo ex-vereador Cláudio Thadeu Cyz em centenas de moradores de Campo Largo, na região metropolitana de Curitiba, ainda nenhuma vítima conseguiu reaver o dinheiro investido. Enquanto pilhas de ações, processos e recursos de advogados são analisadas pelo Poder Judiciário, antigos clientes de Cyz, como o caminhoneiro Antônio Alaor Leal, 49 anos, e a dona de casa Rosa Vidal Radcisiwski, 52 anos, mantêm sonhos que gostariam de concretizar com as economias que sumiram como em um passe de mágica.

Em um ano e dois meses, os juros oferecidos pelo escritório de consultoria financeira de Cyz transformaram os cerca de R$ 170 mil de Leal – guardados durante cinco anos de trabalho – em quase R$ 280 mil, um crescimento de 63%. "A proposta era boa. Os juros eram altos. Depositava dinheiro quase todo mês. Fui deixando meu dinheiro lá para crescer mais", explica o caminhoneiro. A oferta atraiu também três irmãos e a mãe dele, Marina Ferreira Leal, 75 anos. "Vinha a minha aposentadoria e eu já depositava", conta ela.

O sonho do caminhoneiro de trocar a carreta Mercedes, ano 85, por um caminhão novo, além de comprar uma casa para a família, foi adiado. "Esse continua sendo o meu sonho. O jeito é voltar a economizar ou arrumar o (caminhão) velhinho mesmo", brinca. Depois dos momentos de revolta por saber que seu dinheiro havia sido perdido, Leal conta que ficou esquecido e bastante chateado. A mãe lembra que o filho passou três dias deitado, sem sair de casa. O motivo: a vergonha. "Os amigos ficavam tirando sarro", explica Leal.

Já Rosa Vidal não tem vergonha em contar as dificuldades que tem passado no último ano. Depois de um divórcio em 2005, a casa da família foi vendida para que o valor fosse dividido com o ex-marido. Ela depositou os seus cerca de R$ 76 mil na conta que já tinha com Cyz e passou a morar em uma casa alugada com dois filhos. "Eu nunca trabalhei na vida. Eu tinha os jurinhos para sobreviver", conta. As despesas da família eram destinadas à comida, água, luz e medicamentos. No total, ela perdeu cerca de R$ 80 mil.

Rosa tem problema de pressão alta e dores nas pernas devido a quatro cirurgias feitas no tendão-de-Aquiles. A filha, de 28 anos, sofre de endometriose (doença que afeta o sistema reprodutor feminino)."Não podemos abrir mão dos gastos com remédios nem com o plano de saúde", afirma a dona de casa. Para contornar as necessidades, a mulher que nunca havia trabalhado passou a limpar as casas de vizinhos e a fazer pastéis para vender em bares. "Vou achar emprego onde? Com essa idade, sem carteira e com problema nas pernas", questiona. Hoje, a família de Rosa sobrevive com cerca de R$ 800 que os filhos ganham durante o mês nos empregos.

As histórias de Leal e Rosa são apenas dois exemplos de pessoas que perderam as economias em Campo Largo. Em rodas de bate-papo nas praças e ruas da cidade, todos conhecem pelo menos uma família que passa pelo mesmo sofrimento. Gente que vendeu imóveis e veículos e abandonou o emprego para viver dos juros e até quem se desfez de todos os bens para conseguir pagar tratamento de câncer com o rendimento mensal que os negócios de Cyz proporcionavam.

Não foram apenas os clientes do ex-vereador que sentiram o impacto da quebra financeira na pacata cidade. O comércio ficou estagnado durante seis meses depois do calote – até setembro do ano passado –, quando tudo começou a voltar "ao normal". Os setores mais afetados foram os de construção civil e automobilístico, que tiveram até 80% de queda nas vendas. "Veículos foram devolvidos e dívidas na construção eram refinanciadas" conta o presidente da Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Campo Largo (Acicla), Miguel Fernando Spack. Em outros ramos, estima-se uma redução de 20%.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]