
Embora possam ser consideradas como de boa qualidade no que se refere à estrutura, revestimento, instalações elétricas e hidráulicas, as obras públicas paranaenses deixam muito a desejar quando o assunto é acessibilidade. Levantamento feito ao longo de três meses e meio pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-PR) e Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) mostra que apenas uma entre cada dez obras analisadas atendeu mais de 75% dos itens obrigatórios para facilitar o acesso em edificações a pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida.
INFOGRÁFICO: Veja os resultados da fiscalização do Crea-PR e TCE-PR
Entre os problemas mais comuns estão a ausência de vagas sinalizadas e destinadas a pessoas com deficiência, lavatórios sem adequações e inexistência de rebaixamentos em locais de travessia, em frente aos edifícios ou em ruas recém-construídas. No total, 418 obras, concluídas entre setembro e dezembro de 2012, foram vistoriadas por técnicos dos dois órgãos a partir de agosto deste ano, nos quesitos qualidade e acessibilidade esse último, o mais problemático: 43% das obras nem sequer atenderam a metade dos itens verificados.
"Mesmo com campanhas de conscientização e normas específicas para proporcionar acesso aos espaços públicos a uma maior quantidade de pessoas, os profissionais envolvidos no planejamento e execução das obras públicas ainda não incorporam conceitos básicos de acessibilidade no desenvolvimento de projetos e obras", resume o relatório final das inspeções, divulgado há duas semanas. Além de comprometer a efetividade das obras, as inadequações também escancararam o mau uso do dinheiro público, uma vez que as intervenções não saíram barato no total, todas as obras vistoriadas custaram R$ 270 milhões.
Reação
A partir da divulgação do relatório, técnicos do TCE-PR irão se debruçar sobre cada caso para verificar a responsabilidade dos problemas se os defeitos são resultado de projetos malfeitos pelos municípios ou de execuções aquém do esperado por parte das construtoras. O Crea-PR também planeja uma série de eventos em Curitiba e no interior do estado para tentar reforçar, junto aos gestores municipais, as normativas que regem a acessibilidade em obras. "Nós temos uma legislação muito boa, que determina e orienta o que deve ser feito. Mas ainda temos dificuldade em tornar isso real", afirma Joel Krüger, presidente do Crea-PR.
Em relação às obras de pavimentação analisadas, quase metade apresenta trechos em que as calçadas têm piso irregular, e a ausência de sinalização tátil é comum. "Esses problemas já são tradicionais. Infelizmente, a falta de acessibilidade é uma questão crônica. Mesmo se sabendo que uma boa calçada é útil para todo mundo, não só para os deficientes", critica o presidente da Associação dos Deficientes Visuais do Paraná (Adevipar), Flávio Hermany.
Mediocridade construtiva ainda marca setor público
Apesar dos problemas no quesito acessibilidade, o resultado das vistorias sobre a qualidade das obras públicas foi considerado positivo na opinião do TCE-PR e do Crea-PR. Ao fim, 306 das 418 obras avaliadas o levantamento considerou somente aquelas de responsabilidade das prefeituras , atenderam entre 75% e 100% dos itens checados, que envolviam estrutura das edificações, alvenaria, revestimentos e instalações elétricas e hidráulicas, dentre outros.
No entanto, 72 obras (17% do total) ficaram em uma classificação intermediária, não atendendo vários itens e apresentando problemas como manchas de umidade, rachaduras e goteiras (veja infográfico). A situação é ainda mais preocupante porque todas as edificações foram concluídas há, no máximo, um ano o que mostra que ou foram inauguradas com problemas ou apresentaram defeitos logo após a conclusão.
"Não é porque uma obra é pública que precisa ser de menor qualidade. Muito pelo contrário. O estado deveria primar pela excelência e não pela mediocridade. Mas como muitos quadros técnicos não têm sido renovados e não existe uma cultura de continuidade e de busca pela excelência, começa a se ver uma certa permissividade", analisa o engenheiro e diretor de Comunicação do Instituto Brasileiro de Auditores de Obras Públicas (Ibraop), Pedro Paulo Piovesan de Farias.



