
Enquanto Curitiba discute projetos para a implantação do metrô, municípios do Vale do Ribeira, uma das regiões mais pobres do Paraná, querem é se livrar da estrada de chão. Ao mesmo tempo em que Araucária inaugura seu próprio hospital municipal, com 116 leitos, Doutor Ulysses não consegue diminuir a mortalidade infantil, uma das mais altas do Paraná. Trabalhar e estudar em Curitiba faz parte da rotina de cerca de 40 mil moradores de Colombo. Já quem mora na Lapa, a 68 quilômetros do polo, pensa duas vezes antes de enfrentar trânsito e pagar pedágio para buscar serviços na capital.
Realidades distintas como estas formam o quebra-cabeça da região metropolitana de Curitiba (RMC), criada para otimizar a vida dos moradores de municípios que têm forte ligação entre si. É como se cada um dos 26 municípios da RMC fosse uma peça que deveria se encaixar nas outras para montar um cenário único e desenvolver ações integradas, formando a maior área entre as regiões metropolitanas do Brasil. Na prática, porém, o que se vê atualmente é um encaixe praticamente impossível entre os municípios.
"Se formos analisar a região metropolitana de Curitiba, veremos que o tamanho dela não corresponde ao que se entende por área metropolitana. Há apenas um pequeno núcleo que precisa de políticas integradas para habitação, emprego, transporte", comenta a geógrafa e professora da Universidade Federal do Paraná Olga Firkowski. O professor da Universidade Federal de Minas Gerais e engenheiro civil Ronaldo Guimarães Gouvea afirma que a extensão deslegitima o conceito de região metropolitana. "O caso de Curitiba é o mais alarmante. A região é maior que a de São Paulo."
Segundo estudo feito pelo Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), em 2007, o aglomerado metropolitano, que vai da divisa de São Paulo com a de Santa Catarina, é formado por 14 municípios na prática. Dos restantes, dois têm nível de integração baixo e dez são classificados como muito baixo. Dessa forma, 54% dos municípios estão integrados na RMC, índice inferior ao verificado em 15 unidades metropolitanas do país, com 67% de integração.
O estudo do Ipardes chama a atenção para a extrema contradição no espaço metropolitano. De acordo com a pesquisadora Rosa Moura, existe diferenciação dentro da região metropolitana e, ao se afastar do polo, há piora nos índices. O técnico do núcleo de estudos setoriais do Ipardes, Paulo Roberto Delgado, confirma que para o cidadão dos municípios carentes não faz diferença alguma participar da região metropolitana, já que não recebe repasse especial.
Interesses
A escolha das cidades que integram uma região metropolitana deveria seguir critérios técnicos, mas acaba sendo motivada por interesses políticos, principalmente porque, depois da Constituição Federal de 1988, a inclusão passou a ser de responsabilidade do governo estadual e deve ser votada pelos deputados. "Por que existe uma região metropolitana de Curitiba de direito e não de fato? É por interesses políticos, para os deputados dizerem coloquei tua cidade na RMC", afirma o ex-presidente da Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Curitiba (Assomec) Antônio Wandscheer.
O resultado é que muitas cidades distantes dos polos centrais foram incluídas com a expectativa de que teriam verbas adicionais do Fundo de Participação dos Municípios, o que não ocorreu. Um consenso é que nenhuma região metropolitana do país faz a gestão comum dos problemas. Bons exemplos só vêm de fora. Canadá e África do Sul conseguiram gerir suas demandas criando "super-municípios" a exemplo do parlamento europeu.
Nesse cenário, a arquiteta e urbanista do Instituto Brasileiro de Administração Municipal, Marlene Fernandes aponta que Curitiba vem se destacando nos indicadores. A RMC tem o quarto maior Índice de Desenvolvimento Humano Municipal entre 20 regiões metropolitanas, segundo dados do Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil, de 2003. Um aspecto positivo do espaço metropolitano foi a diminuição da tarifa de ônibus, mas apenas 14 municípios fazem parte da Rede Integrada de Transportes. Outro benefício foi a maior exigência em relação à elaboração dos Planos Diretores dos municípios.
Mudanças
Na configuração original, a RMC era composta por 14 municípios do entorno da capital. Com o passar dos anos, o que se viu foram leis estaduais incorporando novas cidades. O último projeto aprovado na Assembleia Legislativa incluiu, em 2008, o município de Piên, a 80 quilômetros da capital. O prefeito de Piên na época, Francisco Marques, era contra a cidade participar da RMC porque não via vantagem, pelo contrário, preocupava-se com possíveis prejuízos. A proposta aprovada está há um ano para ser sancionada pelo governador Roberto Requião, segundo o atual prefeito, Gilberto Dranka: "Eu acredito que seria bom incluir. Mas pelo, o que conversei, não vai ser homologada".
O secretário de Curitiba para assuntos metropolitanos, Manassés Oliveira, aponta que a capital está trabalhando em conjunto com os municípios e se diz favorável à integração de novas cidades. Defende a inclusão de Guaratuba, Matinhos, Pontal do Paraná, Morretes, Antonina e Paranaguá. "Tenho imóvel em Matinhos e a discussão do condomínio acontece em Curitiba", diz ele, exemplificando a necessidade da integração. Seriam mais peças para uma quebra-cabeça com pouco encaixe.




