
A oferta de potencial construtivo pela prefeitura de Curitiba cresceu 125% nos últimos quatro anos. Só em 2010, 153 mil metros quadrados foram cedidos. Usado desde a década de 1980 e inserido em 2000 no Plano Diretor Municipal, o instrumento permite que uma empresa construa, por exemplo, um edifício mais alto e com maior área em regiões determinadas pela Lei de Zoneamento e Uso do Solo Urbano em troca de um repasse em dinheiro a uma uma obra de interesse público, como a restauração de prédios históricos ou de valor cultural e social ou a preservação de uma área verde.
Só no ano passado, as transferências geraram uma movimentação financeira de aproximadamente R$ 60 milhões, o que ajudou a viabilizar reformas e obras de manutenção na Catedral Basílica, na Sociedade Garibaldi e na Casa do Estudante Universitário. Atualmente, 90% das construções e ampliações de prédios na capital paranaense usam o potencial construtivo, de acordo com a prefeitura.
Para o superintendente de projetos da Secretaria Municipal de Urbanismo, Roberto Marangon, o crescimento da oferta é uma evidência de que o instrumento de política urbana está totalmente difundido e assimilado no meio empresarial da construção civil. "Ele é naturalmente incorporado nos estudos de viabilidade econômica dos empreendimentos", diz
A previsão da prefeitura e do setor imobiliário é que o uso do potencial construtivo cresça ainda mais. Até maio deste ano, 110,7 mil metros quadrados já foram cedidos. "A opção dos empresários pela aquisição de potencial construtivo se deve à crescente escassez de áreas disponíveis para construção no município e a viabilidade econômica verificada na utilização deste instrumento", afirma.
Benefícios
Em Curitiba, existem diferentes tipos de potencial construtivo. Eles se dividem em uso habitacional, áreas verdes, prédios históricos e especiais, como as edificações de preservação especial (imóveis considerados ícones históricos na cidade). Para cada tipo de uso, diferentes cálculos são realizados para definir o coeficiente de aproveitamento do solo em metros quadrados ou em número de pavimentos.
De acordo com a arquiteta do plantão técnico do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), Mariane Romeiro, existem várias formas de adquirir o potencial. Dá para comprar diretamente da prefeitura, da Companhia de Habitação de Curitiba (Cohab) ou de terceiros, como proprietários de imóveis tombados.
Segundo ela, em todos os casos, existe vantagem para o empresário do setor imobiliário. "O potencial sempre foi um bom negócio, desde que se pesquise bem, analise as fontes e veja qual opção se adequa melhor ao empreendimento. Dificilmente as construtoras, mesmo as pequenas, constroem sem avaliar a possibilidade de potencial construtivo. É muito vantajoso e lucrativo", argumenta.
Para prefeitura e sociedade, o potencial ajuda a financiar obras e recuperar o patrimônio. É o caso da Rua da Cidadania que será construída no bairro Tatuquara. Orçada em R$ 20 milhões, a obra será financiada com dinheiro adquirido via transferência de potencial construtivo. "É um instrumento muito interessante. Você pode induzir o crescimento de uma determinada região e ainda ajuda a preservar bens históricos e naturais da cidade", diz Carlos Hardt, coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Mecanismo também tem efeito colateral
Nem todos os aspectos que envolvem o potencial construtivo são positivos. Na opinião do professor e arquiteto Fábio Duarte, diretor do doutorado em gestão urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), quando uma área recebe muito potencial, consequentemente ganha mais moradores, que demandam mais infraestrutura, como água, luz, transporte público.
Para Duarte, a solução mais adequada seria que parte do recurso fosse destinada para o bairro ou região em que o potencial foi utilizado. "Com o adensamento populacional, aumenta a demanda por infraestrutura de trânsito, por exemplo. São mais carros circulando", diz. "A solução seria destinar parte do dinheiro para obras públicas, restauração e outra parte para investir na própria região", complementa.
Quando o potencial é concedido incontrolavelmente, sem qualquer planejamento, ele se torna nocivo, comenta o especialista. "É perigoso não fazer um planejamento adequado antes de transferir potencial construtivo. É fundamental que o poder público planeje o setor de acordo com o contingente de população. É necessário prever o acréscimo populacional", defende.
A prefeitura de Curitiba afirma que este risco não existe. Segundo Roberto Marangon, da Secretaria Municipal de Urbanismo, o uso do potencial construtivo é definido por uma legislação específica, que determina as zonas urbanas passíveis de acréscimo de área de construção, assim como os limites deste acréscimo. O benefício só é concedido para áreas preparadas para crescer. "A definição é realizada com base em estudos técnicos que determinam as regiões ou eixos de adensamento em função da infraestrutura urbana implantada", explica.



