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A caminhada, de 20 minutos, é feita dentro do Parque Nacional Saint Hilaire/Lange | Fotos: Marco Andre Lima/ Gazeta do Povo
A caminhada, de 20 minutos, é feita dentro do Parque Nacional Saint Hilaire/Lange| Foto: Fotos: Marco Andre Lima/ Gazeta do Povo
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Tradição

O último farinheiro artesanal

A produção de farinha de mandioca, que deu nome à trilha que corta alguns morros de Guaratuba, era uma tradição da área rural do município. Inácia Aguiar Correia, 80 anos, é uma das ex-produtoras da região. A trilha desemboca exatamente na casa onde ela morava e fazia o produto. Inácia trabalhou durante 50 anos na farinheira. "Era tudo muito difícil, um trabalho pesado, todo manual. A gente produzia mais para o nosso sustento", recorda.

Muitas farinheiras foram desativadas após a inauguração do Parque Saint Hilaire/Lange, para manter o local preservado. Os produtores que tiveram permissão para continuar o negócio foram submetidos a restrições de espaço, o que diminuiu o interesse em continuar com o empreendimento.

Não foi o caso de Denílson da Silva Alves, 44, o último produtor de farinha artesanal de Guaratuba. Ele mantém em sua casa, que fica aos pés do Morro do Cabaraquara, a última fábrica do produto. Alves herdou o gosto pela profissão do pai, Domingos Alexandre Alves, 72, que ainda o ajuda a vender farinha. "Meu pai também aprendeu com meu avô e eu quero passar a tradição para os filhos", diz.

Mesmo com as limitações ambientais e a falta de interesse da população em continuar a produzir, ele não desanima. Está terminando de construir um novo galpão, com quatro fornos, para produzir cerca de 200 quilos de farinha por semana.

A concorrência de produtos industrializados e o trabalho difícil (com quatro fases: raspagem da mandioca, prensagem, ralagem e torra) também não intimidam o pequeno produtor. O pai dele garante que a farinha industrializada, mais barata, não tem chances com o produto do filho. "Mesmo quando vendemos mais caro, as pessoas procuram a nossa farinha artesanal", afirma.

Esquecido, um caminho pelos morros de Guaratuba guarda muita tradição e história. A exemplo do Caminho do Itupava, uma das primeiras rotas do Litoral do Paraná, as encostas escondem a Trilha dos Índios e das Farinheiras, que foi usada, até o século 20, como um dos principais trajetos da população para o comércio na região.

A trilha leva esse nome porque, além de ter sido rota de passagem de povos indígenas e pescadores, era utilizada por mulheres que vendiam farinha de mandioca, produzida por elas artesanalmente ao longo do trajeto.

Inexplorado

A rota está dentro do Parque Nacional Saint Hilaire/Lange. Ela começa às margens da PR-412, perto da Prainha, em Guaratuba, e termina na Estrada do Caba­­raquara. A caminhada de 20 minutos revela, além do passado dos povos da região, um pedaço de Mata Atlântica que resiste mesmo estando tão próximo dos balneários mais movimentados do Litoral paranaense. Os morros são recantos de bromélias e nascentes d’água intocadas. O caminho revela ainda algumas clareiras, onde antes estavam instaladas fábricas de farinha de mandioca, produto tradicional da cidade.

De acordo com o coordenador do curso de Gestão de Turismo do setor Litoral da Universidade Federal do Paraná (UFPR Litoral), Luiz Brambatti, a utilização do caminho por produtores de farinha de mandioca é antiga, mas em 2001, quando o parque foi fundado, os empreendimentos foram desativados para manter a vegetação preservada. "O local, entretanto, já havia deixado de ser rota de comerciantes com a abertura da rodovia", explica Brambatti, ao se referir à PR-412, inaugurada na década de 1970 e que ladeia os morros por onde passa a trilha.

Somente moradores das proximidades conhecem o trajeto, que ainda é objeto de análise por especialistas. Os estudos sobre a utilização da trilha são recentes, conta Brambatti. "Em 2011 fizemos uma caminhada pela região e conseguimos revitalizar alguns trechos, mas ela ainda está sem estrutura para receber tantos turistas". Os pontos de entrada e saída da trilha localizam-se em propriedades privadas, por isso o acesso precisa ser feito com o consentimento dos moradores do local.

Segundo Beatriz Nascimento Gomes, analista ambiental do Parque Saint Hilaire/Lange, também há a intenção de que a trilha faça parte de um caminho alternativo de turismo que ligue os balneários ao morro do Caba­­raquara, passando por outros caminhos. Esse projeto e a revitalização da rota dos índios dependem do plano de manejo do parque, que vai incluir também outras áreas como pontos de visitação turística. "É uma idéia antiga que precisa ainda do diagnóstico da condição da trilha", explica.

Mitos

A Trilha dos Índios e das Farinheiras também é conhecida por suas lendas. Conheça duas histórias populares na região, narradas pela moradora Marilda Bach:

Lenda do homem que pede fogo

Toda terça-feira, perto da meia-noite, em um bar quase em frente à entrada da trilha, alguns moradores juram que viam um homem vestido de preto e que, mesmo segurando um cigarro aceso, pedia por fogo. Em seguida, ele virava as costas e sumia. Quem frequentava o bar ficava desesperado. "Muitos já vieram na porta da minha casa pedindo ajuda depois de ver o tal homem", disse Marilda, que também confirmou que ainda existem testemunhas vivas que viram o sujeito.

Lenda da mulher vestida de branco

Quem passa pela Estrada do Cabaraquara, perto da saída da trilha, pode ter um encontro nada agradável. Uma mulher, toda vestida de branco, atravessa a via e faz as pessoas caírem de motocicletas ou baterem os veículos, por causa do susto. Um dos casos envolve um motorista de um ônibus escolar. Ele afirma ter passado pela entrada, perto do Ferryboat, e visto a mulher sentada em um dos bancos de trás do veículo. "Ele veio dirigindo para Matinhos e percebeu que a mulher nem se mexia. Quando chegou perto da igreja de Caiobá, ele abriu a porta, a mulher desceu do ônibus e nunca mais foi vista por ele", conta Marilda, que também garante que há testemunhas vivas das aparições.

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