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Ronaldo e Marinês com as filhas Isabella e Ariane (essa só de Marinês): recuperação, casamento e retribuição com trabalho voluntário | Fotos: Antonio Costa/Gazeta do Povo
Ronaldo e Marinês com as filhas Isabella e Ariane (essa só de Marinês): recuperação, casamento e retribuição com trabalho voluntário| Foto: Fotos: Antonio Costa/Gazeta do Povo

Da TV para a comunidade terapêutica

Aldo Luís Saloio viu no tête-à-tête o despertar artísticos de nomes consagrados como Tony Ramos, Lima Duarte, Eva Wilma, Antonio Fagundes, entre outros. Começou a trabalhar aos 15 anos como office-boy na extinta TV Tupi, em São Paulo, em 1961, e oito anos depois chegou ao posto de tesoureiro. Saiu da Tupi por meio de um acordo, em 1975. Depois, foi vendedor e até gerente financeiro de uma empresa em Moema (SP), mas os tempos difíceis o fizeram tomar o rumo errado.

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Uma história de despejos e de superação

Há 15 anos a Comunidade Hermon recebeu do Provopar uma área de 2,5 mil metros quadrados em Colombo, para relocar 170 internos despejados de um terreno no Bacacheri. Eles construíram casas de madeira e uma tenda de lona para as orações. Incomodados com o barulho, os vizinhos reclamaram no Ministério Público. A tenda foi retirada e os cultos ficaram para os fins de semana. Uma igreja, com isolamento acústico, está sendo erguida com ajuda de um casal norte-americano que perdeu um filho para as drogas. O casal conheceu a comunidade durante uma apresentação do pastor Ronaldo Reis nos Estados Unidos.

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Aldo, Vanderlei, Gérson, Roberto, Marinês. Vidas destruídas nas ruas de diferentes cidades do país, vidas reconstruídas sob o mesmo teto na região de Curitiba. A ameaça de despejo que até há um mês recaía sobre a Comunidade Terapêutica Hermon provocaria a diáspora de uma centena de idosos, soropositivos e dependentes químicos em recuperação. A Justiça, que rejeitava as moradias humildes erguidas no meio do mato da chácara em Colombo, decidiu dar mais oito meses de prazo à Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar) para concluir as seis casas e os quatro pavilhões, cujas obras estão paralisadas há um ano e meio.

A dilação do prazo garante a permanência – desde que concluídas as obras – à instituição criada há 24 anos pelo casal Ronaldo e Maria Aparecida Reis. Na chácara de 2,5 mil metros quadrados vivem hoje 94 pessoas, entre eles Aldo, Vanderlei, Gérson, Roberto e Marinês. Todos decidiram fixar residência na comunidade após vencidos os nove meses de internação protocolar. "Se for vontade da pessoa, não nos opomos", diz Ronaldo. Aqui eles têm assistência social, médica, psicológica, enfermagem, grupos de terapia e aulas de 1º e 2º graus realizadas no lugar pelo Cebeja (Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos).

Ninguém paga para morar ali, mas tem de assumir o compromisso de concluir os estudos e ajudar como voluntário. Roberto Daniel de Souza, de 34 anos, por exemplo, vivia na noitada, em meio à prostituição e consumo de drogas. Trabalhava de dia como pintor de faixas e letreiros para ter o que gastar nas baladas. Estava literalmente perdido na noite até conhecer a comunidade. Ali terminou o último ano do ensino médio, passou no vestibular e no ano passado concluiu a faculdade de Serviço Social. Agora repassa seus conhecimentos na instituição. Também reatou o vínculo com a família, com quem não tinha contato antes de ingressar na comunidade.

"Esse é o nosso espírito, reaproximar a pessoa da família", diz Ronaldo. Há reuniões familiares uma vez por mês, mas a qualquer hora o interno pode receber visita ou sair, acompanhado, para visitar parentes. "A família não sabia lidar com o problema antes e continuará não sabendo se não receber orientação", explica Ronaldo. Quem não tem família forma a sua ali mesmo. Os internos se juntam em grupos de 12, chamados de Amigos de Jugo, para se ajudar mutuamente, desde dividir o sabonete até compartilhar os bons e os maus momentos. Para jogar futebol, assistir a filmes e comer pipoca juntos, ou para atender ao outro num momento de solidão.

A comunidade, que nasceu da vontade do pastor e teólogo Ronaldo e da pedagoga e psicanalista Maria Aparecida, ainda hoje depende de doações. Os administradores, quase todos internos, têm de passar o chapéu de casa em casa. Os problemas de abastecimento são frequentes. "Já aconteceu de a gente sentar na mesa e não ter nada para comer, de ter que orar para ver se chegava alguma coisa", diz Ronaldo. A prefeitura de Curitiba contribui na manutenção das duas unidades da Hermon que atendem 32 crianças e adolescentes no bairro Bacacheri. A comunidade mantém ainda uma unidade no mesmo bairro para 45 mulheres. Todos são voluntários. "Ali não tem que tirar, tem que por", diz Ronaldo.

Antes e depois

Vanderlei ingressou aos 13 anos no vício, com o cigarro. Aos 14 já usava maconha e cocaína, com passagens eventuais pelo crack. Oriundo de família humilde, entrou no crime para "ser alguém", ser reconhecido pelos outros. Os traficantes se faziam de protetores, pagavam a conta de luz, davam cesta básica, distribuíam doces. As crianças cresciam com essa imagem de benfeitores, Vanderlei inclusive. Mas aos 21 a paranoia tomou conta. Chegava a pôr o colchão no chão em algum canto do quarto como despiste caso alguém tentasse matá-lo enquanto dormia. O início da virada viria depois de 15 dias sem dormir direito, pelos efeitos da cocaína.

Certo dia, às 7 da manhã, abordou a mãe no tanque de lavar roupas e clamou por socorro. Fosse em clínica, hospital psiquiátrico, comunidade terapêutica, qualquer lugar longe das drogas. Via-se perdendo a vida e se distanciando dos dois filhos. Os irmãos ajudaram a procurar um lugar e se depararam com o Senhor Alegria, evangélico cujo filho estava internado na Comunidade Hermon. Feito o meio-de-campo, Vanderlei se internou por seis meses, mas acabou saindo. Voltou para o mundo do crime. Quatro anos depois, Ronaldo e Maria Aparecida faziam um trabalho de evangelização na comunidade em que ele morava.

Vanderlei foi novamente incentivado pelo Senhor Alegria, mas relutou o quanto pôde. Um irmão e uma obreira da igreja foram buscá-lo em meio ao grupo de traficantes no alto do morro. Estava na "capa", virado em pele e osso. Acabou cedendo, e levou junto dois amigos a quem falara sobre a comunidade Hermon. Ambos se livraram das drogas e um deles até casou durante a internação, retornou para Volta Redonda e conseguiu um bom emprego. Vanderlei também casou ali. Quedou-se enamorado por Marinês, que estava em processo de recuperação na unidade da Hermon voltada para as mulheres.

O casamento, de papel passado e tudo, só se deu depois de seguidas as normas da casa: seis meses de amizade especial, mais seis de namoro, outros tantos de noivado. Do casório, sacramentado em 23 de outubro de 2004, nasceu Isabella, hoje com 1 ano e 7 meses. Desde então, a família vive numa casa da chácara, junto com Ariane, 12 anos, filha de Marinês. E também estudam. Ele chegou com a 5ª série concluída, hoje está no 2º ano do ensino médio. Ela concluiu ali mesmo o ensino médio. O casal retribui o apoio com trabalho voluntário, ministrando cultos e fazendo aconselhamentos aos que chegam.

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