
Apesar de ter obtido uma grande vitória no início deste mês, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou seu poder de investigar juízes, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ainda é alvo de vários questionamentos judiciais na corte máxima do país. Algumas das ações em trâmite visam a reduzir o acesso do conselho a informações consideradas sigilosas; outras querem suspender normas internas que tratam sobre interceptações telefônicas e pagamento de precatórios. E, nesses casos, não há garantia de que o desfecho será favorável ao CNJ.
Embalada pela decisão favorável do início do mês, referente à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.º 4.638, a Advocacia-Geral da União (AGU) requereu ao STF a suspensão da liminar que impediu a corregedoria do CNJ de continuar o trabalho de investigação de movimentações financeiras atípicas realizadas por magistrados e servidores da Justiça. Esse trabalho havia sido suspenso por decisão liminar do ministro Ricardo Lewandowski, em dezembro.
Mas a decisão final sobre esse mandado de segurança pode esbarrar na ADI n.º 4.709, outra que tramita no STF. A Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) e outras entidades questionam o Regimento Interno do CNJ, que permite à corregedoria requisitar informações "sigilosas" a autoridades monetárias, fiscais, aos Correios e às empresas de telefonia. Em um julgamento de 2010, o STF havia decidido que a Receita Federal precisava de autorização judicial para a quebra de sigilo fiscal.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Paraná (Apajufe), Anderson Furlan, explica que a decisão do STF sobre as prerrogativas de investigação do CNJ não deve interferir em outros julgamentos. "O STF, apesar de reconhecer o poder regulamentador do CNJ, não lhe concedeu um cheque em branco. Cada nova resolução poderá ser questionada no mérito", afirma. A própria decisão sobre a prerrogativa do CNJ de investigar juízes ainda será analisada no mérito o julgamento do dia 2 de fevereiro apenas derrubou uma liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello em dezembro.
A Procuradoria-Geral da República (PGR), que defendeu a possibilidade de o Conselho investigar e processar juízes, questiona algumas normas do órgão, como as resoluções n.º 59 e 84, que tratam de interceptações telefônicas. Segundo a PGR, o texto traçou requisitos para a validade das decisões cautelares de grampos, condicionando a validade do ato jurisdicional ao ato administrativo, o que viola a lei.
A PGR também já se manifestou contra o CNJ em uma ação envolvendo o Paraná. Em maio do ano passado, o governo estadual ingressou com a ADI n.º 4.558 contra as resoluções do Conselho n.º 113 e 123, ambas de 2010. As normas estipulam o prazo máximo de 15 anos para os governos quitarem suas dívidas de precatórios, mesmo quando os entes escolhem depositar 2% da Receita Corrente Líquida (RCL) anual para o pagamento dessas dívidas. Segundo o governo do Paraná, essa exigência vai contra a Emenda Constitucional 62/09. Em parecer, a PGR confirmou o pleito paranaense e considerou as normas inconstitucionais.
Para Furlan, os questionamentos ajudarão o CNJ a se consolidar. "Sendo um órgão composto por homens, o CNJ pode cometer erros, inclusive extrapolando suas funções. Esses questionamentos e as decisões que neles serão proferidas, auxiliarão na configuração do poder regulamentador do CNJ, sendo aspecto necessário da sua própria evolução."
Análise
"Autonomia só virá com mudança na lei"
Há quem defenda que a real autonomia do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) depende de uma mudança na Constituição. Há uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) tramitando no Senado (leia mais na página seguinte). Mas o juiz Odilon de Oliveira, titular da 3ª Vara Federal de Campo Grande (MS), que apura crimes financeiros e de lavagem de dinheiro, defende uma mudança mais radical.
Segundo ele, apesar da decisão favorável do Supremo Tribunal Federal (STF), que garante poder de investigação ao Conselho, continuarão a surgir muitos questionamentos contra o órgão, a não ser que ocorra uma mudança na lei. "Para que o CNJ tenha independência efetiva, é preciso ser um órgão à parte do Judiciário, com autonomia financeira e administrativa", afirma.
Oliveira tem uma proposta para uma nova PEC, reformulando o CNJ. "A grande inovação é que o CNJ terá competência original e exclusiva para julgar ministros de tribunais", explica. Para isso, ele prevê uma estrutura maior, garantida com mais recursos orçamentários. Outra mudança é o mandato, que passaria dos atuais dois anos para cinco. "Em dois anos só dá tempo de se tomar conhecimento da realidade; não dá tempo de fazer projetos mais elaborados", afirma. Ele também sugere uma eleição direta para a escolha do presidente do CNJ, com os votos dos cerca de 17 mil juízes brasileiros.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Paraná (Apajufe), Anderson Furlan, pondera que essas mudanças não são mais necessárias com o julgamento da ADI nº 4.638. "A partir dessa decisão, o CNJ poderá retomar em sua plenitude a atuação de fiscalização e planejamento do Judiciário."
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