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Francis Underwood, personagem da série “House of Cards” | Divulgação/
Francis Underwood, personagem da série “House of Cards”| Foto: Divulgação/

A jornada do democrata Francis Underwood na Casa Branca ganha novos (e dramáticos) episódios nesta sexta-feira no Netflix. Da boca do personagem principal da série “House of Cards” ja saíram máximas que podem nortear as linhas gerais do jogo político em qualquer gabinete do planeta. Em boa parte das questionáveis frases do político vivido por Kevin Spacey, é possível observar algumas “coincidências” com acontecimentos de Brasília. Talvez por isso, proeminentes políticos daqui tenham se declarado fãs da série.

O vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) é um deles. E é do partido que preside que vem a figura mais frequentemente comparada a Underwood na vida real. O atual presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), costurou nos bastidores sua ascensão ao posto. E até mesmo as propagandas da sigla tem ligação com a série americana: o publicitário da legenda, Elcinho Mouco, declarou abertamente ter se inspirado no formato da produção. Ironicamente, seja pela forma ou pelo o conteúdo — que pretende um descolamento da imagem com a do PT, reclamam alguns ministros —, as inserções na TV causaram (mais um) desconforto entre o governo e seu principal partido aliado.

Também é quase impossível, sobretudo, não traçar paralelos entre o início do segundo mandato de Dilma Rousseff (PT) e a história escrita pelo roteirista Beau Willimon. Na terceira temporada, que entra no ar às 5h (horário de Brasília), o recém-empossado presidente descobre que conduzir o governo pode ser mais difícil do que ele imaginava. A falta de apoio no Congresso torna a vida do político mais complicada do que ele gostaria de admitir, e suas taxas de aprovação não param de cair.

Por isso, selecionamos frases de efeito do parlamentar da ficção para mostrar que os brasileiros, quem diria, podem tirar muitas lições das máximas de Underwood. Afinal, a saga do inescrupuloso democrata tem predicados para ser um grande “spoiler” das manchetes dos cadernos de política nos próximos meses.

“Amigos se transformam nos piores inimigos”

Marta Suplicy deixa o PT e sai atirando

Ao deixar o Ministério da Cultura — a primeira dos 39 ministros a anunciar a saída após a reeleição —, Marta Suplicy esbravejou contra Dilma e o PT. Acusou-os de insensíveis, característica essa que, na sua avaliação, custou a derrota do partido na eleição da Câmara dos Deputados, fez críticas à equipe econômica, afirmou existir crise na relação entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional. Queixou-se de “falta de transparência” e anunciou que o PT “ou muda ou acaba” após anos de legenda. Declarações que acirraram os ânimos de parceiros históricos como Lula, que antes a preterira na indicação de candidato ao governo de São Paulo para apostar em Alexandre Padilha. Talvez por isso Marta não tenha se incomodado em evitar atrelar sua imagem à de Dilma em São Paulo no momento em que Aécio Neves crescia nas pesquisas no estado. Mas a fúria real só foi deflagrada após o último ato de desprestígio: a sugestão de Aloizio Mercadante de que entregasse carta de demissão juntamente a outros ministros. A saída coletiva facilitaria a transição de equipe e pouparia Dilma, o que soou a Marta como afronta. E, afronta por afronta, decidiu sair antes, com o papel de protagonista na demissão coletiva com críticas que parecem não terem data para cessar em fogo nada amigo.

“Se você não gosta de como a mesa está posta, vire a mesa”

Anseio por impeachment de alguns setores da oposição

Insatisfeita com o resultado das urnas, a parcela da população desfavorável à reeleição de Dilma Rousseff na Presidência da República sequer esperou a posse do segundo mandato. Encampou movimento a favor do impeachment da petista que culminou em manifestações por 23 cidades do país poucos dias após o segundo turno, no ano passado. Os eleitores descontentes alegam que Dilma sabia e, portanto, foi conivente com o esquema de corrupção na Petrobras deflagrado na Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. O PSDB e demais partidos opositores ao governo alegam não apoiar o movimento. Pelo menos não publicamente. A manifestação isolada, embora contundente, de importantes nomes do partido, como o do vice-presidente tucano Alberto Goldman, que já descreve a medida como a “saída democrática necessária, talvez a única” para moralizar a administração pública, dá a entender que nos bastidores o assunto seja tratado de forma bem diferente ao que é apresentado perante as câmeras. Fato é que as manifestações não cessaram e o decrescente índice de aprovação do governo torna a hipótese cada vez mais viral nas redes sociais.

“Para aqueles de nós escalando até o topo da cadeia alimentar, não pode haver misericórdia. Só há uma regra. Cace, ou seja caçado”

Eduardo Cunha, cuja caçada terminou no topo da cadeia alimentar

Eduardo Cunha (PMDB-RJ) escalou como poucos a cadeia alimentar de Brasília. Há quem diga que a corrida até a Presidência da Câmara dos Deputados, conquistada em fevereiro, começou antes mesmo da eleição de outubro. Porta-voz dos deputados da base aliada insatisfeitos com o PT, deflagrou uma crise quando ameaçou convocar uma convenção do PMDB para retirar o apoio ao governo em março do ano passado. O episódio aumentou ainda mais a sua influência nos bastidores da política nacional. O radialista fluminense teve 232.708 votos no pleito do ano passado e, antes mesmo da posse, partiu para o ataque, sem dar qualquer chance aos adversários. Ao articular uma chapa “independente” do Poder Executivo, atraiu — ao mesmo tempo a simpatia de deputados da situação e da oposição. Na caçada por votos, fez as alianças certas e abateu o oponente Arlindo Chinaglia (PT-SP) sem dó: 167 a 136. Frequentemente comparado a Frank Underwood, o deputado de agenda conservadora diz que viu a primeira temporada de “House of Cards” e não gostou. E se esquiva do paralelo traçado com o personagem utilizando-se de bom-humor peculiar: “Ele é ladrão, gay e corno. Não posso me sentir identificado com um cara desses”, disse ao “Estado de S. Paulo” em entrevista no ano passado.

“Cumprimente com a sua mão direita, mas segure uma pedra com a esquerda”

Relação complicada entre PMDB e PT

Por focar seus esforços no Congresso Nacional e nos estados - não tem candidato próprio para a Presidência da República há 20 anos -, o PMDB se mantém grande e indispensável a qualquer um que venha a liderar o país. Foi assim ao longo dessas duas décadas, enquanto PT e PSDB se alternavam no Palácio do Planalto. Antes mesmo de sair o resultado das urnas no ano passado, havia a certeza de que o partido seguiria impassível ditando boa parte das cartas, leitura esta ratificada pela eleição de sete governadores (mais do que qualquer outro partido). Mesmo com a sigla formalmente aliada à campanha de Dilma Rousseff, bom número de peemedebistas não se furtaram em declarar apoio a Aécio Neves, ainda que contra a recomendação de Michel Temer, presidente da legenda e vice-presidente da República. A aliança entre PT e PMDB pela governabilidade nem por isso poupa o governo de constrangimentos. A escolha para a presidência da Câmara dos Deputados foi exemplo claro disto. Arlindo Chinaglia (PT) e Eduardo Cunha (PMDB) disputaram os votos da base aliada, na qual o segundo saiu triunfante. Frente à nova realidade, o governo não teve escolha a não ser sair do auto-exílio e negociar com as lideranças do partido, incluindo Cunha, já antevendo dificuldades na aprovação de matérias cruciais à agenda de governo.

“Democracia é tão superestimada...”

O saudosismo de bolsonaro por tempos de chumbo

Democracia garante o voto a todo cidadão. Portanto, em teoria, assegura a representatividade de todos, inclusive das minorias. Na prática, o que se vê é a vontade da maioria subjugar a dos demais grupos a medida que alguns de seus escolhidos carregam bandeiras que não aceitam o diálogo e a diversidade de opinião e escolha. Este é o caso de Jair Bolsonaro, militar da reserva eleito por via democrática — foi o deputado federal mais votado do Rio de Janeiro, com mais de 460 mil votos —, que gosta de elogiar a ditadura militar e não reconhece os seus crimes, a não equiparação salarial entre homens e mulheres e que se diz contra o homossexualismo. A cartilha pregada pelo parlamentar chocou, inclusive, ao jornal francês “Le Monde”, que o classificou como “homofóbico, misógino e racista”. Em uma das polêmicas mais recentes, ele chegou a afirmar em plenário que não estupraria a deputada e ex-ministra Maria do Rosário porque ela não mereceria.

“Eu não temo o começo de uma história. E sim não saber como ela irá acabar”

Envolvidos na Lava-Jato temem os próximos capítulos

A cada nova fase da Operação Lava-Jato, parlamentares, caciques políticos e empresários têm mais arrepios. Poucos sabem dizer até onde o rastro de corrupção seguido pela Polícia Federal irá levar. A avaliação geral é que as delações premiadas aceitas pelos empreiteiros e diretores da Petrobras presos possam causar ainda mais estrago do que já causaram. Também há um consenso em Brasília de que os policiais represaram informações que envolvem os políticos. Assim, eles não conseguem obstruir o processo de investigação. Então, na fase final da operação, alguns dos alvos seriam proeminentes líderes partidários e governantes. E o sigilo pode estar chegando ao fim. O procurador-geral Rodrigo Janot deve apresentar em breve ao Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido de abertura de inquérito contra políticos suspeitos de envolvimento com o caso.

“A liderança é uma coisa maravilhosa e preciosa. Mas tem um preço: a solidão”

Dilma, isolada no Palácio do Planalto

Tida como turrona e de difícil traquejo nas discussões com a oposição e base aliada, Dilma teve de lidar com coro pela volta do presidente Lula entre os próprios correligionários. Depois de confirmada candidata do PT pela reeleição, ainda teve de acompanhar pela imprensa a debandada de supostos aliados naturais ao movimento do “Aezão”, em favor do candidato tucano Aécio Neves. Notando-se enfraquecida, investiu em viagens e reuniões com prefeitos, governadores e parlamentares para reaver a simpatia dos mesmos, prometendo-os estar sempre acessível para o diálogo. Algo que não se concretizou sequer no grupo organizado com os líderes dos partidos aliados, que previa reuniões quinzenais durante a campanha. Após a eleição, conquistada na disputa por votos mais acirrada da História, a presidente sente o racha atestado nas urnas afetar sua governabilidade. A saída é recorrer ao PMDB, do vice-presidente Michel Temer, para retomar as conversas com o Congresso Nacional e dar agilidade às matérias sensíveis ao governo nas Casas, como a votação do ajuste fiscal com a redução dos direitos trabalhistas e previdenciários.

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