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O chamado "blocão", grupo de deputados insatisfeitos com o governo, já mostrou que tem força para bagunçar o coreto e, apesar de alegar que não pretende causar derrotas à presidente Dilma Rousseff, pode complicar a vida e trazer dor de cabeça ao Planalto. Com a possibilidade de votar propostas contrárias ao governo na Câmara, esses parlamentares, que em sua maioria integra a base governista com exceção dos membros de uma sigla da oposição, pedem mais articulação política com o Planalto, liberação de emendas parlamentares e maior participação nas mudanças ministeriais promovidas pela presidente.

Mesmo que o objetivo não seja provocar derrotas, como alegam, o grupo pode usar seu "poder de voto" para forçar o Planalto a negociar os pontos que vêm sendo alvo de queixas. Segundo um líder aliado que preferiu não ser identificado, o grupo serve tanto para demonstrar essa insatisfação com a condução política do Planalto, quanto para pressionar por cargos e emendas. E ainda pode, sim, segundo essa liderança, derrotar o governo em alguma votação para marcar posição. "É para mostrar força e ao mesmo tempo nessa demonstração, de repente, alguma coisa de interesse do governo pode acabar não acontecendo", disse o parlamentar de um importante partido da base.

Na avaliação do cientista político e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Ricardo Ismael, a situação aparentemente ainda não fugiu ao controle do Planalto. Mas isso não significa que o governo não tenha que arregaçar as mangas e tentar reduzir os riscos. "É uma posição mais para negociar do que uma posição de ir para a oposição", disse. "É mais um bloco que se formou para marcar posição de insatisfação... Se por acaso (a insatisfação) não for bem administrada, pode implicar numa derrota numa votação importante."

O movimento não passou despercebido e trouxe preocupação ao governo que, na segunda-feira desta semana, acionou sua articulação política e anunciou uma série de medidas para tentar conter o clima pesado. Sentou para conversar e, em reunião com líderes, colocou à disposição uma dúzia de ministros para resolver as demandas parlamentares, além de reforçar compromisso com liberação de emendas, instrumento, aliás, essencial para os deputados em época de eleição.

Ainda assim, o blocão demonstrou o estrago que pode provocar no dia seguinte à reunião e conseguiu colocar em pauta um requerimento da oposição para criar uma comissão para acompanhar investigação de denúncias de que empresa holandesa SBM teria pago propina a funcionários da Petrobras. Na ocasião, durante votação de um requerimento para retirada de pauta da proposta de investigação da estatal, 261 deputados votaram contra o governo, contra apenas 80 que acompanharam a orientação alinhada com o Planalto.

O líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), que coordenou o movimento nesta semana, disse que embora o bloco não tenha discutido o assunto, não se surpreenderia se fosse aprovado um pedido de criação de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a estatal. "O governo perdeu o controle sobre o resultado da pauta, o que é pior que perder o controle da pauta", disse Cunha à Reuters.

No horizonte deste grupo de deputados, há matérias como um projeto de decreto legislativo que obriga distribuidoras de energia elétrica a devolverem quantia bilionária a consumidores, e ainda um veto presidencial a projeto que mudava as regras de criação e fusão de municípios. Nenhuma das duas conta com a simpatia do Planalto, que no retorno do recesso parlamentar, havia trabalhado para adiá-las.

Outra proposta que deve trazer dor de cabeça e pode ser palco de uma votação extremamente desfavorável ao governo é o já polêmico Marco Civil da Internet, projeto que estabelece uma série de regras no setor.

Na opinião do líder aliado consultado, o marco civil será o primeiro teste para o governo neste novo esforço de negociação com o Congresso em um ano atipicamente curto por conta da Copa do Mundo, em junho, e das eleições, em outubro. "Primeiro que já há um desentendimento. E o governo quer aprovar meio que na marra. Não vai conseguir", afirmou. "Tem resistência ao projeto e o bloco vai aproveitar para mostrar força, pôr as garras de fora."

Apesar de mostrar preocupação com os insatisfeitos, o governo avalia que o movimento é limitado, segundo uma fonte do Executivo ouvida pela Reuters, uma vez que o blocão já registrou desistências -- caso do PSD -- e não teria forças para contaminar o ambiente no Senado.

"Aliança informal"

Formado por siglas como PP, PR, Pros, PDT, PSC e PTB e o oposicionista Solidariedade, e liderado pelo PMDB, o bloco inicialmente tinha a intenção de canalizar a insatisfação e afirmar-se como uma iniciativa parlamentar para privilegiar suas pautas. Mas, na avaliação de uma fonte peemedebista, pode ter se tornado um instrumento contra o governo no Congresso.

Segundo essa fonte, que não quis se identificar, o grupo contou com o apoio do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que chegou inclusive a participar da primeira reunião do bloco informal, numa tentativa de capitalizar o movimento a seu favor numa eventual reeleição à presidência da Casa em 2015.

Outra fonte que acompanhou o processo disse à Reuters que Henrique Alves considerava o movimento benéfico, inclusive, para destravar a pauta da Casa, trancada desde o ano passado, o que pode pegar muito mal para os deputados em ano eleitoral. Os interesses do bloco expandiram-se e quem passou a comandá-lo informalmente foi o líder do PMDB, passando a beneficiar-se desse exército.

Na terça-feira desta semana, a situação quase resultou numa derrota ao governo, mas Henrique Alves encerrou a sessão, impedindo a continuidade do processo de votação do requerimento de investigação da Petrobras.

Segundo essa fonte do PMDB, o vice-presidente Michel Temer chegou a pedir a Henrique Alves que o grupo não se transformasse em um bloco de oposição a Dilma. O líder da bancada peemedebista, por sua vez, nega que haja intenção de prejudicar o governo. "Não é blocão. É uma aliança informal. Não sou líder de nada", afirmou Cunha. "É uma aliança em torno de pautas, vamos nos reunir toda semana e decidir temas que nos unem", disse. "Não é uma questão de apoiar pauta da oposição (como o requerimento da Petrobras). O requerimento é de quem defende a transparência, combate à corrupção, isso todos nós queremos."

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