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Governadores, prefeitos e parlamentares costumam justificar o aumento da criminalidade e o caos no sistema prisional à falta de recursos para investir na modernização das polícias e na construção e manutenção de cadeias, mas o relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) divulgado nesta segunda-feira mostra que o grande problema parece não ser a falta de dinheiro, mas o uso inadequado e os desvios de recursos públicos. O relatório das auditorias da CGU revela superfaturamentos de até 300% no uso dos recursos públicos e compra de equipamentos que não estavam previstos nos editais das secretarias de segurança dos 12 estados sorteados para a fiscalização.

Foram fiscalizados recursos da ordem de R$ 454,2 milhões, repassados pela União para a execução descentralizada de programas federais nas áreas de justiça e esportes, também definidas por sorteio. Os relatórios de fiscalização foram encaminhados aos ministérios, à Procuradoria-Geral da República e ao Tribunal de Contas da União, entre outros órgãos.

Na Bahia, foram detectados indícios de direcionamento e restrição da competitividade na compra de 13 itens pela Secretaria de Segurança Pública. Das 26 empresas que adquiriam o edital, só a que apresentou proposta no valor de R$ 2,287 milhões atendia às exigências. O relatório diz que não há justificativa para licitar todos os produtos e serviços em conjunto, certamente uma forma de restringir a competição e direcionar a contratação da única empresa habilitada.

Também há indícios de superfaturamento na assinatura de termo aditivo ao contrato para troca de piso em uma área do arquivo do Instituto de Detenção Pedro Melo. O custo da obra, R$ 52 mil, ficou 61,8% superior ao valor de mercado, segundo a CGU. A secretaria também teria desclassificado, sem explicações aceitáveis, a empresa que apresentou o menor preço para o fornecimento de sistema de vigilância do centro histórico de Salvador e de rádios fixos e móveis. Só esta compra teria resultado em prejuízo de R$ 52 mil aos cofres públicos.

Ainda na Bahia, os fiscais da CGU identificaram danos evidentemente intencionais aos bloqueadores de sinais de radiocomunicação de um presídio, que deveriam impedir o uso de celulares pelos detentos. Os aparelhos, instalados em local de acesso restrito a policiais militares e agentes de segurança, tiveram sua fiação arrancada e se tornaram inúteis.

No Acre, a CGU identificou uso indevido dos recursos destinados à implantação da polícia comunitária. Sob o pretexto de agilizar processos administrativos e aproveitar saldo na conta corrente do convênio, a Secretaria de Justiça e Segurança Pública do estado comprou equipamentos e material de informática e de dois jet-skis, itens que não estavam previstos no contrato. Os auditores também identificaram descumprimento de normas contratuais por fornecedores, de recepção de bens em desconformidade com as especificações e de desrespeito à lei das licitações, que podem ter causado prejuízo superior a R$ 360 mil aos cofres públicos.

No Maranhão, os auditores detectaram indícios de fraude em licitação para compra de licença de uso e instalação de programa de computador e prestação de serviços de suporte técnico. Das cinco empresas convidadas para a concorrência, três foram habilitadas, apesar de uma das propostas extrapolar o valor limite para a modalidade convite, tolerância que, indevidamente, evitou a repetição do processo, como determina a norma legal. Duas empresas negaram aos auditores da CGU que tenham participado do processo. Ou seja, na verdade, só havia uma empresa na disputa, que cobrou R$ 79,5 mil pelos produtos e serviços. Para a compra de outro programa, a mesma secretaria fez contratação sem licitação, no valor de R$ 80 mil.

Em Minas Gerais, os fiscais da CGU identificaram que os preços pagos pela Secretaria de Defesa Social em duas licitações para a instalação de sistema integrado de monitoramento por câmeras de TV em 12 presídios estavam acima dos cobrados pelo mercado. O confronto entre a cotação de preços de itens praticamente idênticos e os valores propostos pela empresa vencedora da licitação revelou variação, em licitação de 2005, acima de 36% – no período, o dólar variou 14%. A equipe da CGU identificou também que, depois de mais de dois anos, parte dos equipamentos do circuito integrado de TV das penitenciárias ainda não havia sido instalada.

No Pará, a CGU revelou que a execução de serviços já previstos no contrato para construção de presídio em Mocajuba justificou a assinatura de termo aditivo, no valor de R$ 76,5 mil. O escoramento e a contenção de aterro e o cimbramento em madeira para forma, segundo os auditores, constavam do projeto original e, por isso, teriam sido pagos duas vezes. Nessa mesma obra, os auditores identificaram 52 serviços previstos no projeto, mas não-executados pela construtora, e mais 13 casos de execução que não obedeceu às especificações. A estimativa do prejuízo para os cofres públicos, por conta dessas omissões e divergências é de R$ 133 mil.

Os fiscais identificaram ainda, no Pará, superfaturamento de despesas em aproximadamente 300% na construção de um centro de atendimento à família em um presídio estadual. A obra, que não passou de reforma da edificação utilizada como escritório pela empreiteira, foi paga com R$ 62,5 mil. De acordo com a equipe da CGU, a mesma edificação, nova, custaria R$ 15,5 mil.

Em Pernambuco, a CGU encontrou indícios de sobrepreço, em média de 50%, em três contratos firmados pelo governo do estado para a construção e modernização de presídios, com recursos do Ministério da Justiça. O prejuízo para os cofres públicos pode chegar a R$ 430 mil.

Em Rondônia, a equipe de fiscalização verificou que o governo do estado adquiriu equipamentos de informática e de comunicação por preços bem acima dos praticados tanto no mercado local quanto em uma grande empresa do ramo. Ao todo, o sobrepreço chegou a 100%, ou seja, os equipamentos poderiam ter sido comprados pela metade do preço pago, R$ 252 mil. Em alguns casos, a diferença foi ainda mais expressiva: os microcomputadores, por exemplo, foram adquiridos pelo preço de R$ 15 mil, cada um, valor suficiente para comprar seis unidades.

Em Santa Catarina, a CGU constatou que 45 computadores comprados pelo governo do estado em 2005 e 2006 para o reaparelhamento da segurança pública ainda não haviam sido utilizados. A fiscalização verificou que o governo estadual já possuía computadores semelhantes, adquiridos com recursos próprios, e que parte desses também permanecia em estoque, o que evidencia falta de planejamento em relação à real necessidade deles.

Em Tocantins, foi constatado que o governo estadual utilizou um tipo inadequado de licitação para adquirir equipamentos eletrônicos e de informática, de 2004 a 2006, para a modernização dos órgãos de segurança pública. Os fiscais verificaram que os editais das licitações reuniram indevidamente produtos de natureza completamente diferentes em um mesmo lote. Ao impedir a participação de empresas que só comercializassem parte dos produtos do lote, o governo estadual restringiu a competitividade. Em média, 24 empresas demonstraram interesse em participar das 15 licitações analisadas, mas apenas 2,6 apresentaram proposta. Em quatro licitações nem houve competição, já que apenas uma empresa foi habilitada para a fase final.

As fiscalizações da CGU também detectaram problemas em programas executados com recursos do Ministério do Esporte. Em Goiás, os auditores constataram descumprimento das metas previstas em convênio cujo objetivo era a inserção social por meio da fabricação de material esportivo por detentos, adolescentes infratores e populações em situação de vulnerabilidade. A 60 dias do fim da vigência do prazo de 38 meses do convênio, faltava cumprir 100% da meta para cinco dos seis produtos esportivos previstos. Das cinco mil bolas de basquete, 20 mil bonés, 150 redes de vôlei, 50 redes de futebol de campo e 100 redes de futsal, nada havia sido feito depois de três anos – só estavam prontos, da encomenda, 14 mil de 20 mil calções.

No Paraná, a equipe de fiscalização verificou que o governo estadual não transferiu aos municípios a parte que lhes cabia dos recursos repassados ao estado, em 2005, pelo Ministério dos Esportes, referentes à chamada Lei Pelé.

No Maranhão, a CGU identificou pagamento a profissionais que não atuaram no Programa Segundo Tempo, no total de R$ 35,7 mil. O secretário estadual de esporte admitiu que os favorecidos pelos créditos receberam o dinheiro em nome de outras pessoas, servidores do estado que teriam se dedicado ao programa em horário diferente do expediente e não poderiam, mesmo temporariamente, acumular mais de um salário.

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