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Edson Ramon, presidente da Associação Comercial do Paraná, deveria mandar cobrir hoje o busto de Ildefonso Pereira Correia, Barão do Serro Azul. A estátua homenageia o fundador da Associação, que provavelmente estaria profundamente envergonhado com o caminho que seu sucessor adotou. Empresário dos bons, o barão sabia que dinheiro não é tudo nessa vida – e por isso ainda hoje nos lembramos dele.

A atuação política mais famosa do barão se deu na Revolução Federalista. Os rebeldes gaúchos, que seguiam rumo ao Rio de Janeiro para tentar derrubar o presidente, chegaram a Curitiba. A cidade havia sido abandonada pelos governantes. O barão se dispôs a coletar o dinheiro exigido pelos rebeldes. Em troca, conseguiu a promessa de que não haveria saques e que a cidade não seria atacada pelas tropas. Teve sucesso. Poupou vidas. Como paga, assim que a revolução foi contida, acabou assassinado pelo regime de Floriano Peixoto, acusado de traição. Uma cruz na estrada de ferro para Paranaguá marca o local em que foi baleado.

Mas o barão também foi abolicionista. Aderiu à causa e decidiu que precisava juntar dinheiro para que em breve pudesse se dizer que Curitiba não tinha mais escravos. Dizem que ignorou até mesmo uma crise econômica que afetou suas empresas e continuou fazendo caixa para libertar os negros. Eis a diferença entre ter dinheiro e saber o que fazer com ele.

Mais de um século depois, a ACP se volta contra uma rara iniciativa tomada em Curitiba para lembrar a tragédia negra no Brasil. Curitiba, que sempre adotou o marketing de capital europeia, que durante muito tempo tentou até mesmo negar em livros de história a presença de escravos, sempre evitou lembrar os que sofreram pelo nosso desenvolvimento. Fez praças centrais para quase todos os povos que para cá vieram. Os negros foram homenageados no Pinheirinho, longe dos olhos dos turistas.

Como não estamos mais na época da Colônia e os vereadores não são mais tirados dentre os "homens bons" – eufemismo para os brancos ricos que tinham direito ao poder político – a Câmara agora não consegue mais negar alguma memória a essa população, que afinal responde por 20% dos votos. E propôs o feriado que se comemoraria hoje, dia da Consciência Negra. Mas a Associação Comercial alegou possíveis danos econômicos – perda de lucro, de faturamento – para barrar a iniciativa no Judiciário.

O argumento econômico não é novo na história dos negros no Brasil. Foi em nome da viabilidade da exploração do território que se trouxeram escravos da África. Foi para garantir a pujança e o progresso da nação que por muito tempo se combateu o abolicionismo. Nunca era o racismo. Sempre havia uma desculpa perfeita: o desenvolvimento econômico. A Associação Comercial, que deveria se orgulhar de ter contrariado essa história no momento de sua fundação, preferiu retomar o argumento que novamente ocultou a história de nossos negros.

Em certa medida, os gestores da ACP estão mesmo prestando uma homenagem ao Barão. Estão mostrando como são raros os homens como ele.

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