Pode-se criticar o governador Jaime Lerner por ter feito ou tentado fazer coisas das quais o povo e os políticos reclamam até hoje, passados já 13 anos do término do último de seus dois mandatos. Lembra-se, por exemplo, da venda do Banestado e da tentativa de privatizar a Copel, assim como se fala mal do modelo de pedágio que adotou e que acabou gerando tarifas pesadas aos usuários.
Entretanto, poucos criticam o prefeito Jaime Lerner, que por três gestões nas décadas de 1970 e 80 pôs Curitiba na vanguarda mundial do planejamento urbano. Vem desse período seu legado mais referencial e imitado por centenas de cidades mundo afora: o eficiente sistema de transporte coletivo que criou. Canaletas exclusivas para ônibus de grande capacidade e frequência são apenas um detalhe de sua obra: o transporte fazia parte de um todo, do projeto de desenvolvimento de Curitiba a longo prazo.
Mas essa é outra discussão. O que importa é que Lerner entrou na semana que passou, outra vez, no debate sobre a construção do metrô curitibano. E o fez como sempre: condenando radicalmente a realização da obra e criticando o desleixo a que as administrações municipais seguintes relegaram o sistema que criou e implantou.
Falando durante o Smart City Business América, congresso que se realizou em Curitiba na semana passada, Lerner lamentou que na última década quase nada se fez para evitar a queda de qualidade do transporte, que ficou cada vez mais caro e mais ineficiente. Para ele, é inconcebível que os ônibus precisem parar em cada esquina. Isso alonga o tempo das viagens, superlota as estações-tubo, exige mais ônibus para atender à mesma quantidade de passageiros, cria comboios e afasta usuários do sistema, que passam a preferir o carro.
Resumo da história: se medidas simples, como a sincronia dos semáforos e pequenas obras para evitar cruzamentos, fossem adotadas, seria possível ter um ônibus a cada minuto nas canaletas, transportando praticamente a mesma quantidade de passageiros que se projeta para o metrô – aliás, “meio metrô”, como acentua o ex-prefeito referindo-se à linha de apenas 17 quilômetros que seguiria praticamente o mesmo trajeto hoje cumprido pelos expressos.
Lerner defende a modernização do sistema, com tecnologias hoje disponíveis, dentre elas a eletrificação. “A essência é ‘metronizar’ o ônibus, com a vantagem de implantá-lo em três anos, com menores custos.” Com um quinto do custo é possível ter linhas mais eficientes do que o metrô, diz. Para Lerner, a discussão do metrô foi “politizada” e “infantilizada”, o que em nada beneficia a população que precisa de transporte.
Se Lerner tem razão ou não, é preciso discutir melhor. Mas enquanto isso, na prefeitura, segue emperrado o mesmo projeto (com algumas mudanças) pensado há dez anos, ao mesmo tempo em que cai a qualidade e se promove a desintegração metropolitana. A vanguarda virou retaguarda.



