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Desembarquei em Brasília em 1.º de abril de 2007, dia da mentira e do aniversário do golpe de 1964. Não foi amor à primeira vista, embora tivesse nascido e vivido por essas bandas durante meus quatro primeiros anos de vida. A capital é um lugar complexo demais para ser decifrado de cara – e também por isso é o retrato mais fidedigno do país.

Brasilienses detestam quando você fala mal do Distrito Federal por analogia à bandalheira da política nacional. “Os políticos que o resto do Brasil elege vêm aqui fazer maracutaia e nós é que levamos a culpa?”, bradam os locais. Trata-se de uma verdade parcial.

Afinal, a política distrital brindou o Brasil com “expoentes” como Joaquim Roriz, José Roberto Arruda e Agnelo Queiroz. A capital está impregnada de tudo o que atrasa o Brasil, em especial, a burocracia e a cultura de improdutividade que domina grande parte do serviço público. Uma máquina grande e cara demais que entrega de menos para a sociedade.

Sem contar que sai do bolso de todos os brasileiros a despesa com as polícias Civil e Militar, o Corpo de Bombeiros Militar e o Poder Judiciário do Distrito Federal. Também são subsidiadas a Educação, Saúde e Segurança Pública.

Não existe o que pague o convívio com gente do Rio Grande do Sul ao Amapá. O sentimento de uma nação tão diferente e tão próxima é que dá a dimensão do gigantismo do Brasil.

O esbanjamento do fundo constitucional garante ao DF os maiores índices de desenvolvimento humano e de renda per capita do país. Só que, logo na fronteira com Goiás e Minas Gerais (região conhecida como Entorno), estão cinco das 100 cidades mais violentas do Brasil (Luziânia, Santo Antônio do Descoberto, Cristalina, Águas Lindas de Goiás e Valparaíso).

Brasília, por outro lado, também está impregnada de tudo o que há de bom no país. No próprio funcionalismo existe o copo meio cheio de excelentes profissionais. Nos últimos anos, passar em concurso transformou-se numa tarefa hercúlea, o que separou uma nata que não se contenta apenas com a estabilidade e quer fazer a máquina andar – basta ver os procuradores e juízes workaholics envolvidos nas recentes operações de combate à corrupção.

Há ainda a riqueza do caldo cultural que surge da mistura de gente de todos os cantos. Não existe o que pague o convívio diário com gente do Rio Grande do Sul ao Amapá. O sentimento de uma nação tão diferente e, ao mesmo tempo, tão próxima, é que dá a dimensão do gigantismo do Brasil – o que não se vê em nenhum lugar com as mesmas proporções.

Brasília é linda pela utopia da consolidação de um país tão diverso em bases democráticas. Não morro de amores pelo trabalho final da dupla Lúcio Costa/Oscar Niemeyer, mas há concepções inegavelmente geniais na cidade, como os pilotis dos prédios residenciais do Plano Piloto, que permitem a livre-circulação de todos por todos os lugares. Liberdade, democracia e direitos humanos formam uma trinca de valores inegociáveis para uma nação desenvolvida e, sem dúvida, estão presentes no DNA da nossa capital.

Por essas e outras ter tido a oportunidade de viver em Brasília como correspondente da G azeta do Povo pelos últimos 3.150 dias foi uma experiência tão gratificante. Testemunhar todas as dores e alegrias de um lugar que está em constante mutação, que muitas vezes dá dois passos e cinco para trás, não tem preço. Sou, sem dúvida, um brasileiro (agora mezzo curitibano, mezzo brasiliense) privilegiado.

A partir da próxima semana, deixo de ocupar este espaço para voltar à capital paranaense, agora na função de editor-executivo. Desde 2008, foram mais de 400 colunas publicadas às segundas-feiras.

Agradeço, de coração, a todos os que tiveram paciência de acompanhá-las e que, de alguma forma, colaboraram para que ela perdurasse até aqui.

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