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Samuel Klein, o dono das Casas Bahia, precisa baixar na sede de sua empresa para conjurar um atentado à preciosa marca da maior rede varejista do país. Ela tem 550 lojas em dez estados, atende 15 milhões de clientes por mês e faturou R$ 12,5 bilhões no ano passado. É caso de faxina na diretoria. Na segunda-feira, Alberto Milfont Júnior, um trabalhador de 23 anos, foi com a mulher a uma filial da Zona Sul de São Paulo para comprar um colchão. Enquanto ela estava na fila da caixa, ele esperava, sentado num sofá. Um segurança desconfiou da aparência do rapaz, bateram boca e, apesar da tentativa pacificadora de um gerente, ele o matou com um tiro no rosto. O casal tinha um filho de 5 meses.

Inépcia, preconceito e demofobia. Mesmo assim, o crime foi conseqüência de um ato individual, coisa de pessoa física. A reação das Casas Bahia foi de arrogância de pessoa jurídica. Logo ela, que se orgulha de "dedicação total a você". A empresa informou que o "incidente" (pode me chamar de assassinato) foi um "fato isolado" (ainda bem). Lembrou também que o serviço de segurança de suas lojas é terceirizado. E daí? Que tal discutir a indenização da viúva e do órfão?

A firma Gocil, responsável pela conduta do segurança, informou que o assassino possui "competência ilibada e todos os cursos exigidos para atuar na profissão". Os doutores da Gocil (e das Casas Bahia) ainda não perceberam que, quando uma pessoa dá um tiro na cara de outra, algo de terrível aconteceu. Talvez acreditem que faltaram a Milfont "competência ilibada" e os "cursos exigidos" para comprar um colchão.

Samuel Klein, hoje um dos homens mais ricos do Brasil, chegou aqui nos anos 50 com pequenas economias. Conseguiu isso porque fez freguesia entre os consumidores de baixa renda. Quando um cliente é assassinado numa de suas lojas, ele não deve permitir que o caso seja tratado como um mero episódio contratual, burocrático. Klein já conviveu, num ponto muito maior, com a banalidade do mal e a irrelevância de vida. Durante a Segunda Guerra, ele foi prisioneiro nos campos de concentração de Maidanek e Auschwitz. Salvou-se porque recebeu a graça da solidariedade humana.

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O guru do juiz De Sanctis acabou em cana

Coube ao juiz Fausto De Sanctis, sócio-atleta da Operação Satiagraha, oferecer uma explicação erudita e audaciosa para exorbitâncias de alguns delegados, juízes e promotores. Referindo-se às garantias dos direitos individuais assegurados pela Constituição, o doutor disse: "A Constituição não é mais importante que o povo (…). Não é possível inverter e transformar o povo em modelo e a Constituição em representado (…). Nós somos a Constituição, como dizia Carl Schmitt".

Luís XIV era o Estado. Para De Sanctis, "nós" somos a Lei. "Nós" quem, cara pálida? Segundo Schmitt, "nós" chegou a ser Adolf Hitler. Ele escreveu: "O Fuhrer protege a Lei". O alemão Carl Schmitt (1888–1985) foi um grande constitucionalista, crítico brilhante da democracia liberal, fascinado pela "exceção", teólogo da ditadura. Na teoria, foi um expoente do pensamento radical no início dos anos 30. Na prática, em 1933 inscreveu-se como sócio-atleta do partido nazista e justificou um massacre como uma "forma superior da lei administrativa". Pediu também que se expurgasse "o espírito judeu" da jurisprudência alemã. Patrulhado por nazistas da academia, que viam nele um oportunista, foi afastado do poder em 1936 mas, ainda assim, durante a guerra conseguia convites para fazer palestras em Paris. Capturado em 1945, passou um ano num campo de prisioneiros norte-americano. De Sanctis pode ter lido alguma coisa de Schmitt, mas leu pouco sobre a história da Europa.

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Conta cara

Os ministros Patrus Ananias e Fernando Haddad tourearam, por mais de um ano, as pressões para anistiar 2.274 entidades pilantrópicas e filantrópicas que devem pelo menos R$ 4,5 bilhões e estão metidas em 8 mil processos por atentados contra a Bolsa da Viúva. Foram vencidos, porque Nosso Guia autorizou a edição da Medida Provisória 446, perdoando os interessados.

A MP foi baixada menos de um mês depois da eleição do comissário Luiz Marinho para a prefeitura de São Bernardo do Campo. O ex-ministro da Previdência, que gostava da idéia, entrou na campanha prevendo uma despesa de R$ 15 milhões. Em matéria de custo per capita, pode ter sido a mais cara do país. Como ele teve 195 mil votos, a relação entre a despesa prevista e o resultado obtido ficou em R$ 77, ou US$ 33 por voto. Barack Obama elegeu-se a um custo bem menor. Cada voto custou cerca de US$ 10 ao presidente norte-americano eleito. (Os republicanos acham que conseguirão atazaná-lo por conta de sua fúria arrecadadora.)

Casa da Mãe Joana

Não é preciso muito esforço para perceber que, durante a Operação Satiagraha, a relação incestuosa da Polícia Federal com a Abin transformou a investigação numa casa de Mãe Joana. Agentes da PF que têm acesso ao Sistema Guardião, a central de grampos do governo, passavam suas senhas aos colegas da Abin. Em qualquer empresa privada onde os funcionários têm senhas para entrar em bancos de dados sigilosos, a terceirização do acesso é punida com demissão por justa causa. Na Câmara dos Deputados, a sublocação de senhas pode custar o mandato. No FBI, dá cadeia.

Promessa tóxica

O carioca que votou em Eduardo Paes a partir da sua promessa de instituir o bilhete único no sistema de transporte público do Rio comprou um papel tóxico. O bilhete único, instituído em São Paulo em 2004 e adotado em todas as grandes capitais do Brasil, tornou-se uma forma de engodo no Rio. O governador Sérgio Cabral prometeu concluir os estudos para a criação do bilhete único no final deste ano. Nada. Eduardo Paes fez da nova tarifa um compromisso de campanha.

Agora, anuncia-se que ela será implementada aos poucos, com a construção de pequenos terminais. (Em São Paulo e Nova Iorque, o bilhete único não precisou de terminais.) Para bom entendedor, meia promessa basta. A tarifa que permite baixar o custo do transporte virá aos poucos, mas a licitação para a construção de pequeno$ terminai$ virá logo.

Nunca é demais lembrar o tamanho da diferença existente entre as tarifas de transportes públicos do Rio e de São Paulo. Em maio passado, ela permitia ao paulistano que faz quatro percursos diários para ir e voltar do trabalho almoçar de graça entre 4 e 12 pratos feitos. (A R$ 6 cada PF.)

Bolsa BNDES

Uma prova de que a crise do papelório mundial já foi reciclada no Brasil de acordo com as velhas normas do cerco à Bolsa da Viúva: os usineiros de cana reclamam que não têm como quitar suas dívidas e querem recursos do BNDES. Eremildo, o Idiota, também quer. Ele jamais pagou uma dívida e não tem projeto, mas conhece um senador petista e quatro presidentes de sindicato.

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