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Alguém acredita que a Sandy é a garota ideal para fazer publicidade da Cerveja Devassa? Claro que não. Com sua história de menina comportada, vestal, apegada aos valores familiares e apologista do politicamente correto, nenhum publicitário, em sã consciência, a indicaria para ser a musa de uma cerveja que carrega imagem de libertinagem, devassidão e lascívia.

Então, por que foi escolhida? É aí que entra a malícia dos co­­municadores, a de criar fatos para fazer campanha da campanha. Isto é, promover o disse-que-disse da peça publicitária para gerar mídia espontânea. Jornais, revistas, programas de tevês, rádios e, agora, as chamadas mídias sociais, têm carência e se alimentam de fatos inusitados e inverossímeis. Mike Tyson não seria Mike Tyson se num rompante não mordesse a orelha do Holyfield. Romário não seria Romário se não gazeasse o expediente da Câmara para jogar futebol na praia. É assim que as coisas no mundo da comunicação de massa funcionam. Não importa o fato, mas sim a versão do fato.

O conceito do posicionamento da marca de cerveja em questão é o de seguir a linha de comunicação que privilegia a imagem da transgressão. Se o público composto pelos principais compradores aceita, a ordem é ir em frente de forma escancarada e com toda força.

Ligar a imagem da Sandy à Devassa atraiu a atenção de todos pela notória possibilidade da implausibilidade. Ela não combina com a bebida, pois não existe pertinência natural entre a modelo e o produto, uma não tem nada a ver com a outra. E foi esse não "acreditar que na vida real as pessoas não agem desse jeito" que faz a história ficar divertida. Mas onde está o truque? Escolher a Sandy, pagar R$ 1 milhão de cachê (valor divulgado) e depois fazer espuma para que as pessoas falassem do assunto. Se o anunciante gastou milhões em cachê, produção e mídia, o que parece um valor alto e uma ação incongruente para muitos, para a agência e o anunciante foi barato, se comparado com o valor não pago nas dezenas de citações em mídia espontânea.

Foi inteligente a linha do comercial ao abordar com ironia e bom humor o assunto da menina boazinha que tem o seu lado devasso. Imediatamente surgiram milhares de acessos à internet para verem o filme e, no Twitter, começaram a circular piadinhas.

A técnica não é nova. Na década de 60, o escritor e publicitário Hernani Donato salvou um amigo, empresário da área de distribuição de filmes, de um grande prejuízo. Ele havia alugado um filme "quase pornô" para seus cinemas e não estava tendo a bilheteria esperada. O publicitário não teve dúvidas: ligou indignado para a Liga das Senhoras Católicas e reclamou que era uma pouca-vergonha deixarem passar um filme da­­queles em São Paulo. As defensoras da moral pública foram reclamar nos jornais, e os cinemas fizeram bilheterias por várias semanas. Todos queriam ver o filme proibido.

O colunista Fernando Martins está de férias e volta a ocupar este espaço dia 4 de maio.

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