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Quando jovem, uma das minhas tarefas era passar telegramas. Eu ia à sede dos Correios, aquela que fica na esquina das ruas Presidente Faria e XV de Novembro. Esperava a minha vez na fila; sempre havia fila para se passar telegramas. Alguém do outro lado do guichê copiava a mensagem e dava um recibo, o valor era calculado por palavras utilizadas. Uma forma precoce de como escrever para o Twitter: quanto menos palavras e mais entendimento melhor.

Telegrama custava caro. Eles eram recebidos dobrados, fechados e grampeados, as mensagens vinham em uma espécie de fita colada no papel base. Quando o carteiro entregava um, o bairro inteiro ficava sabendo, criava-se o mistério e as indagações corriam soltas: "Fulana recebeu um telegrama, o que será?" Especulações à parte, eles podiam tanto ser os arautos das boas-novas, trazendo mensagens como participações de nascimento, convites de casamento, felicitações diversas e a famosa frase: "Chegarei tal dia vg te amo pt saudações", ou trazer notícias de morte. Por isso muita gente tremia ao receber um telegrama. A velha piada do gato subiu no telhado saiu daí.

O mecanismo da telemetria, ainda hoje usado em satélites, rádiofaróis e na navegação aérea e marítima foi inventado por Samuel Morse em 1838. A transmissão, em código Morse, por meio de pontos e traços, é aquela que a gente vê nos filmes de faroeste. Quando os bandidos iam assaltar os trens, a primeira coisa que faziam era cortar os cabos de transmissão. Talvez a cena mais famosa de telegramas seja a do naufrágio do Titanic e a mensagem S.O.S – "save our souls" – salve nossas almas.

Telegramas foram amplamente utilizados nas guerras. O presidente americano ficou sabendo do ataque a Pearl Harbor por meio de um. Outra mensagem, tempos depois, de forma sintética contou ao mundo: "The war is over" (A guerra acabou).

Boa parte do interior brasileiro foi conquistada pelos cabos telegráficos fincados país adentro pelo Marechal Rondon entre 1900 e 1915 – algumas cidades nasceram ao lado dos postos de telégrafo, principalmente na linha Mato Grosso-Acre. Em nosso estado, até hoje, perto de Guaragueçaba, existe um trecho chamado "linha do telégrafo" – pela dificuldade de passagem, jipeiros adoram percorrer essa estrada. Outra linha, no Sudoeste, perto de Barracão, fez parte do esforço da guarnição das nossas fronteiras.

Uma senhora me contou que desmanchou um namoro, ela aqui e ele em outra cidade, com um telegrama dizendo "bum" (acabou – explodiu). A irmã do ex abriu a mensagem antes e a partir de então o mesmo passou a ser chamado de Bum.

O telegrama mais divertido que já vi foi este: no interior de Minas um sujeito ficou encarregado de acompanhar o time local à outra cidade e, após o jogo, passar um telegrama para avisar sobre o resultado. Ele escreveu: "Cheguemo, joguemo, num ganhemo, nem perdemu, impatemo – abraçu du nicodemu".

Hoje, com bilhões de e-mails cruzando os ares, penso que o deus Cronos deve estar se divertindo, pois ao nos dar a onipresença, acesso instantâneo a todos os lugares, cria em nós a arrogância, a porta para muitos pecados. E tudo começou com os bip, bip, bips.

A colunista Marleth Silva está de férias e volta a escrever em 16 de junho.

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