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Manifestantes derrotados

A aprovação da minirreforma eleitoral na terça-feira mostrou que os deputados federais definitivamente esqueceram as manifestações de junho. Um dos dispositivos do texto que segue para o Senado limita o poder de fiscalização da Justiça Eleitoral nas prestações de contas dos candidatos em campanha. Pelo projeto aprovado, a Justiça somente poderá fazer o exame formal dos documentos e ficará impedida de analisar o conteúdo deles. Os senadores podem persistir nesse erro e aprovar o dispositivo. O prejuízo será da sociedade.

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Os movimentos de rua adormeceram, mas o ativismo se consolida como força política de alcance global. Veja-se o caso dos 28 ativistas do Greenpeace presos na Rússia em 19 de setembro acusados de pirataria. Uns poucos indivíduos se tornaram um incômodo a uma das nações mais poderosas do planeta e atraíram a atenção para o impacto ambiental na exploração de petróleo em águas internacionais.

Eles foram detidos pela guarda costeira russa enquanto faziam um protesto contra a extração de petróleo no mar de Pécora, no Ártico. Entre os presos está a bióloga brasileira Ana Paula Maciel. Na quarta-feira as acusações de pirataria contra os ativistas foram retiradas, mas eles podem ficar presos por sete anos, caso a Justiça russa entenda que praticaram atos de vandalismo. Se forem punidos com a prisão, um mero inconveniente com ecologistas pode causar mais incômodos do que se poderia prever.

A questão curiosa é: como tão poucos indivíduos têm o poder de atrair a atenção de toda a comunidade internacional e causar constrangimento a uma das grandes potências do planeta? Há uma explicação para isso. O mundo está vivenciando um processo histórico de ascensão do indivíduo como força política relevante. Isso começou no fim do século 20 e agora, na segunda década do século 21, vai ficando mais evidente.

Os cidadãos, solitários ou em grupos organizados, passaram a ter um papel que até pouco tempo era destinado apenas a alguns atores. No plano internacional, as nações têm de conviver, negociar e partilhar poder com grupos de interesses informais, indivíduos cuja reputação transcende fronteiras e uma miríade de organizações não governamentais (ONGs) de atuação global. No plano nacional, partidos políticos, entidades de representação tradicionais e governos agora precisam interagir com novos movimentos sociais heterogêneos, coletivos apartidários orientados à atuação política e indivíduos que exercem lideranças informais.

Novo jogo

O poder está sendo redistribuído. As regras do jogo mudaram. A comunicação, a tecnologia e a capacidade de mobilização aumentaram drasticamente. Mas os modelos de pensamento e os procedimentos usados para lidar com a política continuam a ser aqueles do século passado. Esse cenário deixou mais difícil fazer uma leitura clara da realidade. O imprevisível passou a ser a regra nos acontecimentos políticos internacionais e locais.

Os cidadãos vivem hoje regidos pelo imponderável. É o que diz o economista e jornalista Joshua Cooper Ramo, na obra A Era do Inconcebível. Segundo ele, a complexidade e a imprevisibilidade características do mundo atual mudaram as relações de poder entre nações e no interior dos países, entre governos e cidadãos. Crises deixaram de acontecer uma vez a cada década. Agora são constantes, assim como também são frequentes novas oportunidades.

A consequência da Era do Inconcebível é que o poder do indivíduo nunca foi tão grande quanto agora. Para os cidadãos atuar com eficiência, entretanto, Joshua Cooper Ramo afirma que a chave desse novo poder no exercício da "resiliência". Ou seja, é preciso saber se adaptar às experiências de vida e tarefas difíceis, buscando abordagens novas e flexíveis e as adequando às circunstâncias do ambiente em que se vive.

A estratégia de adaptação do Greenpeace para atrair a atenção da comunidade internacional tem sido bem sucedida. O mesmo, entretanto, não se pode dizer das manifestações de rua. Elas já não assustam mais os políticos brasileiros. Se quiserem defender suas causas de forma eficaz, os manifestantes vão precisar reinventar o modo de fazer política. Não com essa bobagem ultrapassada de praticar violência contra patrimônio alheio. Para reafirmar seu papel de cidadão como ator político relevante, será preciso buscar novas formas criativas de mobilização, fiscalização e atuação no ambiente público.

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