As passeatas do movimento passe livre no transporte coletivo que ocorrem em todo o país têm trazido à baila sentimentos conflitantes na sociedade, especialmente por causa dos conflitos entre a Polícia Militar e os manifestantes em São Paulo. Na "praça pública" da atualidade as redes sociais , há quem considere que a atuação da polícia é enérgica e necessária para conter vandalismo de manifestantes. Não falta também quem considere a atuação da polícia truculenta e antidemocrática. Mas, se por um instante esses juízos de valor forem deixados de lado, chega-se rapidamente a uma constatação relevante: os cidadãos brasileiros estão indo às ruas para reivindicar o que julgam essencial para suas vidas nas cidades em que moram.
E isso é muito bom. Frequentemente se declara que o brasileiro não tem cultura de participação política, que ele prefere permanecer alienado. As passeatas que ocorreram ontem em pelo menos nove cidades do país mostram o contrário. Se o objeto de reivindicação fizer sentido para as pessoas, elas prontamente vão se organizar e ir às ruas. Não por outro motivo, somente uma sociedade com tendência autoritária poderia querer evitar que as pessoas se organizem e reivindiquem aquilo que julgam ser delas por direito.
Embora o direito de livre manifestação deva ser respeitado, evidentemente não se deve aceitar atos de vandalismo, pichações, depredação de veículos e lojas. Os manifestantes que se valem desses expedientes acabam por apequenar a ação política. Criam antipatias desnecessárias e perdem aliados. Apesar desse comportamento se tratar de ato grupos isolados nas passeatas do movimento passe livre, tal fato não pode ser ignorado, nem tampouco considerado normal.
É dever dos manifestantes zelarem pela democracia e lembrar constantemente aos seus colegas que a política é a guerra por outros meios. E é por meio da política que poderão ter êxito. De outro lado, é inconcebível que a repressão policial ocorra de forma truculenta. Da mesma forma que o vandalismo civil, ela não tem espaço numa democracia.
O Estado precisa aprender a lidar com o pensamento divergente. O discurso padrão é que as cidades não podem arcar com o passe livre para estudantes, porque isso seria economicamente inviável. Em vez da negativa, seria melhor envolver os manifestantes em um debate sobre as opções orçamentárias para conceder passe livre é preciso que o dinheiro seja retirado de outra área. É preciso discutir qual é a solução mais justa para a aplicação dos recursos limitados que compõe o orçamento. Mas quase nada disso é feito. O Estado precisa ser mais competente e aprender a dialogar.
E mais. Precisa aprender a lidar com os novos movimentos sociais que surgiram, heterogêneos, organizados nas redes sociais e profundamente conectados com o local em que moram, desejosos de resolver problemas do cotidiano. Sem pancadaria.



