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Há menos de 30 anos não se falava em crime de colarinho branco. A realidade indica que muita coisa mudou.”

Francis Beck, membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais

A prova de que a impunidade envolvendo casos de crimes contra o sistema financeiro deixou de ser regra veio da análise de mais de 16 mil decisões judiciais feita por Francis Beck. Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e doutor em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos, RS), ele mergulhou em processos que envolviam crimes como lavagem de dinheiro ou crimes no sistema financeiro. As informações resgatadas entre 2000 e 2012 foram reunidas em sua tese de doutorado e mostram que a impunidade desses crimes está deixando de ser regra. Entretanto, o número de condenações ainda é baixo. O advogado conversou com a reportagem da Gazeta do Povo.

Sua tese mostra que a quantidade de investigações envolvendo crimes do colarinho branco cresce a cada ano. Quanto?

Há menos de 30 anos sequer se falava em crime de colarinho branco no Brasil. Porém, a realidade empírica apresentada indica que muita coisa mudou em pouco tempo. As condenações nesse período (2000 a 2012) aumentaram mais de 600%. Na Polícia Federal entre 2003 e 2010, que é o período disponibilizado, houve um aumento de 1.500% de aumento do número de operações que envolviam crimes de “colarinho branco”. Mas é claro, não adianta a PF investigar se isso não chega até o Judiciário.

Então nos casos de crimes do “colarinho branco” são poucos que chegam efetivamente a cumprir a pena?

Analisando dados do Departamento Penitenciário, o que acontece é que a gente não vê pessoas condenadas pelo crime de colarinho branco cumprindo pena. Mas, pelo meu estudo, isso é uma questão de tempo. Porque há dez anos esses crimes também não eram investigados. Se era investigado não chegava no Judiciário, se chegava não era condenado. Estamos em um momento em que os crimes do colarinho branco estão começando a ser punidos de forma mais disseminada no Brasil.

Desde 2003, há a legislação que prevê a criação de varas especializadas nesses crimes.Isso ajuda no combate a esses crimes?

As varas formam uma estrutura de assessores, juízes, procuradores e até policiais que atuam juntos especificamente para esse tipo de criminalidade. O tipo de prova, de casos, os termos são os mesmos, aumenta a facilidade de buscar uma solução no processo.

A legislação brasileira ainda é branda quando aborda crimes do colarinho branco?

A legislação não é muito diferente da utilizada na Espanha, Portugal, ou outros países europeus. A grande questão é de inteligência, de como o Estado vai perceber esse crime sendo descoberto. É muito mais uma questão de aparatos das polícias, do Ministério Público e do Judiciário.

Qual o impacto da Operação Lava Jato para o processo jurídico brasileiro?

No mensalão e na Lava Jato pessoas de grande status social, donos de empreiteiras, políticos foram presos preventivamente. Nunca se imaginou que isso pudesse acontecer. Claro que tem o julgamento ainda [da Lava Jato], mas muitos denunciados devem vir a cumprir pena efetiva.

Operações como a Lava Jato podem ter resultados como a queda dos crimes do colarinho branco?

Há uma tendência de que as pessoas que estejam cometendo esse tipo de crime tenham maior receio de serem identificadas e de ser punidas. Vai continuar acontecendo, mas deve haver redução.

A sensação de impunidade com relação a esses crimes mudou? Por quê?

Principalmente por esse destaque que a mídia acaba dando para a Lava Jato, a população acaba tendo essa ideia, que não tinha há dez anos, de que a pessoa com poder pode chegar ao Judiciário e ser processada. Uma pessoa rica, importante e com destaque social tem chance de ser presa? Hoje, qualquer pessoa lembra da Lava Jato e começa a modificar esse entendimento que antes prevalecia.

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