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O governo Requião encerra um ciclo político como uma promessa não realizada de modernização da gestão pública do Paraná. A agenda política progressista que o elegeu e reelegeu não foi cumprida ou implementada. Práticas políticas arcaicas e o atraso político perpassaram o sistema político paranaense e impediram o avanço da modernização. Redes de nepotismo e dinastias políticas mantêm, preservam e reproduzem o arcaísmo como projeto político em várias instâncias do Poder Executivo, Legislativo, Judiciário e atingem instituições como o Tribunal de Contas, o Ministério Público e os cartórios e tabelionatos. O símbolo mais visível dos problemas políticos paranaenses ficou completamente a descoberto na crise da Assembléia Legislativa, com a falta de transparência, funcionário fantasmas e descontrole nos gastos. Um sistema político monopolizado por dinastias políticas e redes de nepotismo não é transparente e sim dependente do nepotismo que somente traz parente!

Governadores anteriores encerraram seus ciclos políticos com avaliações negativas nas esferas de gestão política e administrativa no passado, com visível mal estar político. Affonso Camargo, em 1930, Lupion, em 1961, Ney Braga, em 1982 e Jaime Lerner, em 2002, todos passaram pela síndrome de final de governo com a sensação de certo descontrole e colapso político.

Para uma análise da gestão política e administrativa do ciclo de Requião é preciso avaliar que as áreas mais problemáticas foram os setores mais vinculados ao nepotismo, ao clientelismo, à patronagem e ao favoritismo político. O balanço administrativo apresenta os melhores resultados nas áreas com pessoal administrativo de caráter mais técnico e profissionalmente melhor orientado. Nos últimos anos houve crescimento econômico e avanços sociais em todo o Brasil. Políticas sociais e políticas nacionais ganharam dimensões estaduais nos programas assistenciais e políticas de caráter social, como o programa do leite, luz fraterna, tarifa social da água e outros. Outra área de políticas progressistas ocorreu nas políticas de saúde, construções de hospitais, na recuperação de estradas, no apoio à agricultura familiar, na isenção fiscal e no aumento do salário mínimo regional. Houve alguns avanços, mas a educação continua com graves problemas e baixos salários. O pedágio herdado do governo anterior não acabou e nem abaixou!

O problema é que faltou uma marca central ao governo Requião, uma grande obra ou um paradigma que conseguisse se sobrepor à identidade do nepotismo militante, que contagiou todos os outros poderes e instâncias político-administrativas do Paraná. A gestão política do governo anterior, de Jaime Lerner, foi caracterizada pela problemática orientação neoliberal, com flexibilizações, desregulamentações e privatizações. O governo Lerner conheceu grande ônus político na condução da privatização da COPEL, um verdadeiro desastre político. As terceirizações desmontaram a estrutura administrativa do Estado do Paraná. O resgate do público e a reconstrução da esfera administrativa do Paraná foram tarefas esperadas com a vitória de Requião em duas eleições. No entanto, lamentavelmente não houve reformas administrativas e nem avanços na forma do aperfeiçoamento da racionalidade burocrático-legal no Paraná. O número de cargos comissionados continua a ser expressivo e aparentemente irracional. A Governadoria apresenta relativamente mais cargos comissionados do que a educação e quase o mesmo número que a saúde, ainda que as atividades fins da educação e saúde sejam muito mais importantes e necessárias para o bem estar da população. Não adianta querer esconder, a crise na Assembléia Legislativa também atinge o núcleo duro do Governo Requião. O poder executivo tem grande preponderância na direção política e moral do sistema político estadual, indicando os Procuradores Gerais e politicamente influenciando decisivamente os conselheiros do Tribunal de Contas, responsáveis diretos pela fiscalização da ALEP. Um dos parentes do governador quase foi para o Tribunal de Contas! Os diferentes poderes têm que se fiscalizar e se supervisionar de maneira direta. É inadmissível uma rede de nepotismo e de interesses na qual os poderes e as instituições se acobertam e se protegem com silêncios cúmplices em jogos de mútuos interesses. Boa parte do atraso político paranaense está relacionada com o nepotismo direto e nepotismos cruzados, bem como estruturas de parentesco conectando e atravessando múltiplos poderes, que deveriam ser independentes e autônomos entre si.

A baixa renovação da elite política paranaense e a persistência de dinastias e linhagens político-familiares em diferentes poderes e instituições, ao longo de várias gerações, têm motivado problemas e dificuldades administrativas. O monopólio do poder político em poucas famílias tende a viciar o sistema político com várias irregularidades e muitas incorreções. Os partidos políticos deixaram de ser o centro da organização política em detrimento das relações familiares e dependências pessoais.

A construção de um projeto paranaense de desenvolvimento sempre passou pela formação de uma burocracia moderna, legal, meritocrática, eficiente e produtiva. Lamentavelmente a cultura do nepotismo foi reforçada pela gestão que se encerra, o que é um obstáculo considerável à renovação e modernização da burocracia estadual do Paraná, em todos os poderes e instâncias.

Concluímos com a impressão de que não houve nenhum grande projeto, nenhuma grande organização ou visão sistêmica na gestão pública e administrativa do Paraná dos últimos anos. Problema que vem também dos últimos governos, quando o grande planejamento, a racionalidade, a moralidade, a publicidade, a impessoalidade, a competência e a eficiência nas grandes instituições públicas foram abandonadas em proveito do dia-a-dia das moedas eleitorais embaladas pelas sinecuras e prebendas com os cargos comissionados.

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Ricardo Costa de Oliveira é Sociólogo e Cientista Político UFPR.

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