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Dilma não gostou  da repercussão do “socorro político” de Lula e quer mostrar que não é teleguiada pelo padrinho político | Evaristo Sá/AFP
Dilma não gostou da repercussão do “socorro político” de Lula e quer mostrar que não é teleguiada pelo padrinho político| Foto: Evaristo Sá/AFP

Vazamento

Lula avalia que é ingenuidade acreditar no apoio de Kassab

Agência Estado

Em conversas mantidas com ministros, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que o governo foi "ingênuo" ao acreditar no prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (ex-DEM). Ao ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, Kassab prometeu apurar se houve vazamento de dados fiscais da empresa de consultoria Projeto pela Secretaria de Finanças. Palocci é o dono da Projeto.

"Esse Kassab é Serra. Não se iludam!", afirmou Lula, numa referência ao ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB). O prefeito deixou o DEM e fundou o PSD, que nasceu com a bênção do Palácio do Planalto. No governo de Dilma Rousseff, Kassab é visto como potencial novo aliado.

Foi com essa avaliação que Palocci, acusado de multiplicar o próprio patrimônio em 20 vezes nos últimos quatro anos, telefonou para o prefeito e pediu a ele averiguação sobre possível vazamento dos dados da Projeto. Kassab disse que mandaria investigar o caso, mas, de acordo com auxiliares de Dilma, a promessa não foi adiante.

Lula acredita que Serra está por trás do que chama de "vazamento". No Planalto, petistas lembram que Mauro Ricardo Costa, secretário de Finanças da prefeitura, é aliado de Serra. Quando o tucano era governador, Costa foi secretário da Fazenda.

"É preciso verificar o que há de quebra de sigilo nesse episódio e onde está o cerne da luta política. É isso o que queremos enfrentar", insistiu o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho.

Serra nem tomou conhecimento das suspeitas. Antes do contra-ataque, o ex-governador – que perdeu a eleição para Dilma – disse achar normal um político ganhar dinheiro fora do governo. Em nota, a Secretaria Municipal de Finanças explicou que os acessos às informações da Projeto foram feitos pela própria empresa ou por servidores que realizaram "procedimentos demandados pelo próprio contribuinte", como recolhimento de tributos e retificação de lançamentos fiscais.

Segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo, a Projeto faturou R$ 20 milhões em 2010, quando Palocci coordenou a campanha de Dilma. Metade dessa cifra teria sido obtida entre novembro e dezembro. No governo, comenta-se que várias notas fiscais da empresa, num total de R$ 2 milhões, foram canceladas e, portanto, o faturamento de 2010 teria sido menor.

Sem conseguir resolver o apagão na articulação política do Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff comandará várias reuniões, a partir desta semana, na tentativa de provar que o governo não está paralisado pela crise envolvendo o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci. Dilma não gostou da repercussão do "socorro" do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – que em seu governo já administrou uma crise envolvendo Palocci – e quer mostrar que não é teleguiada.

Apesar de acatar os conselhos de Lula – que assumiu as rédeas políticas do governo antes do desastrado telefonema de Palocci para o vice-presidente Michel Te­­mer, ameaçando demitir ministros do PMDB –, Dilma avalia que a entrada de seu padrinho em cena foi usada pela oposição para desqualificá-la. Ficou contrariada com comentários sobre a anemia de sua equipe e está disposta a sair da defensiva.

Na terça-feira, após voltar de uma viagem ao Uruguai, onde vai tratar de obras de infraestrutura, Dilma comandará uma reunião com governadores e prefeitos de capitais que serão sede da Copa do Mundo de 2014. Na quarta, terá almoço com senadores do PMDB, em mais uma tentativa de evitar nova rebelião de sua base no Congresso. No mesmo dia está previsto um encontro com o Conselho Político, que abriga presidentes e líderes de partidos aliados e só se reuniu uma única vez até agora. O lançamento do programa Brasil sem Miséria deverá ocorrer na quinta-feira.

Para conter a ameaça de rebelião no PMDB, Dilma também vai se reunir com mais senadores do partido, nos próximos dias, do que nos cinco meses de governo. O auge da crise com o PMDB ocorreu quando Palocci – alvejado por uma penca de denúncias de enriquecimento vertiginoso quando era deputado federal – passou a mão no telefone e ligou para Te­­mer, a mando de Dilma.

O clima era tenso. Coordenador político do governo e acuado por denúncias, Palocci foi direto ao assunto. Disse que todos os ministros do PMDB seriam demitidos se o partido contrariasse Dilma e aprovasse emenda ao Código Florestal concedendo anistia a desmatadores até 2008. Não foi só: no bate-boca, Palocci ameaçou de degola o ministro da Agricultura, Wagner Rossi, indicado por Temer.

"Amadorismo"

O PMDB contrariou Dilma na votação da Câmara e, a partir daí, a relação com o partido azedou. "O ex-presidente Lula ajudou a acalmar os ânimos", admitiu o líder do governo no Congresso, Romero Jucá (PMDB-RR). "Casamento é assim mesmo: às vezes enfrenta crises", amenizou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho.

O telefonema a Temer foi visto até por dirigentes do PT como mais um sinal de amadorismo do Planalto. Com Palocci nas cordas, sob suspeita de enriquecimento ilícito, e o ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, cada vez mais enfraquecido, até mesmo Carvalho ocupou o vazio político.

Orientado por Lula, de quem foi chefe de gabinete de 2003 a 2010, ele reforçou a ofensiva para barrar a criação de uma comissão parlamentar de inquérito destinada a investigar a evolução do patrimônio de Palocci e ajudou o colega a ligar para parlamentares. Com essa tarefa, conversou com a bancada evangélica e percebeu que havia clima propício para a instalação da CPI, caso o governo não suspendesse a distribuição do kit contra a homofobia.

Foi Carvalho, também, que saiu a público para acusar a Secretaria Municipal de Finanças de São Paulo – dirigida por Mauro Ricardo Costa, aliado do ex-governador José Serra (PSDB) – de quebrar o sigilo fiscal da empresa de consultoria Projeto, pertencente a Palocci.

"Não vou, não vou"

Deputados e senadores da base aliada, porém, avaliam que ne­­nhum contra-ataque reverterá o encrencado jogo do governo se Dilma não escolher um interlocutor com autonomia para negociar com o Congresso. E, pior, se ela prosseguir com a tática do confronto com o PMDB.

"Eu não vou misturar votação de Código Florestal com distribuição de cargos. Não vou, não vou e não vou", esbravejou Dilma, em tom exaltado, em almoço com a bancada do PT no Senado, na quin­­ta-feira. Na semana passada, no entanto, auxiliares da presidente diziam que a montagem final do segundo escalão começaria a sair do papel agora.

Além de Dilma não ter dado espaço nem mesmo para companheiros de partido reclamarem com ela sobre a falta de interlocução com o governo, petistas ficaram perplexos com o que ouviram. Quando o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), disse a ela que o PMDB apoiava o relatório de Aécio Neves (PSDB) para mudar a tramitação das medidas provisórias, Dilma não se conteve.

"Querem mudar isso justamente no meu governo?", protestou ela, desautorizando acordo firmado por Jucá, justamente o líder do governo, com a oposição. "Não se governa o Brasil sem medida provisória." Em seguida, virou-se para Palocci e perguntou, na lata: "Você sabia disso?" A resposta do ministro, cada vez mais acuado, foi sintomática. "Esse assunto eu desconheço. A Casa Civil trata de questões plurais", respondeu Palocci. Dilma dirigiu a mesma interrogação a Luiz Sérgio, conhecido nos bastidores como "garçom" do Planalto por apenas carregar a bandeja de pedidos de deputados e senadores, sem nunca decidir nada. Consta que ele não disse nem sim nem não.

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