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Entrega de cobertores no Parolin, em Curitiba: famílias tiveram de esperar discursos de políticos para receber as doações | Daniel Derevecki/ Gazeta do Povo
Entrega de cobertores no Parolin, em Curitiba: famílias tiveram de esperar discursos de políticos para receber as doações| Foto: Daniel Derevecki/ Gazeta do Povo

Entrevista

Fernanda Richa, presidente da FAS.

Depois de seu discurso, Fernanda Richa concedeu uma entrevista para a Gazeta do Povo. Disse que o evento não foi eleitoral e que a lei foi cumprida. Afirmou ainda que a cerimônia é positiva porque ajuda a população a se unir e a conversar. Veja a seguir a transcrição da entrevista:

A festa para fazer a distribuição dos cobertores é necessária? Não seria mais fácil as pessoas simplesmente irem chegando e recebendo?

Não é mais fácil, não. Isso é feito assim há 20 anos, não é uma criação nossa, é uma criação da campanha, é antiga. Promove a união da comunidade, faz com que todo mundo se converse. E as pessoas vêm para escutar música, para escutar uma nova ideia e não tem nenhuma outra conotação que não essa.

Mas a gente está em pré-campanha.

Não tem nada a ver com pré-campanha, nem com campanha, a vida inteira isso foi feito assim.

O líder comunitário, o Edson, pediu votos...

Ele pode pedir. É a liberdade dele. O candidato não está aqui, nem o pré-candidato, nem ninguém. Ele pode fazer, como liderança, o que ele quiser. Nada impede, a lei não impede.

Mas a senhora falou que se tudo der certo...

Se tudo der certo. Eu falei que ele é candidato? Não, eu falei "se tudo der certo". Portanto, não deturpe o que eu falei, por favor.

As 1,5 mil famílias que foram ontem à sede da Fundação de Ação Social (FAS) de Curitiba no bairro Parolin tiveram de ouvir discursos em favor da campanha de Beto Richa (PSDB) ao governo do estado antes de conseguirem os cobertores que haviam ido buscar. Só depois do discurso de Fernanda Richa – esposa de Beto e presidente da FAS – os cobertores começaram a ser distribuídos. Em sua fala, Fernanda pediu à plateia que "caminhe com ela". Um líder comunitário escalado para falar no evento foi mais direto e disse que conta com a comunidade para eleger o tucano governador.O evento de ontem faz parte de uma série promovida pela FAS em toda a cidade. Neste ano, já foram entregues 17 lotes de cobertores. A intenção é que 250 mil famílias sejam atendidas pelo programa Doe Calor. Cada família recebe dois cobertores de casal. A fundação mantém um cadastro de famílias carentes que têm direito ao benefício. Entidades de cada bairro também recebem peças de roupas doadas pela população. As peças são distribuídas posteriormente para as pessoas da região.

Espera

As famílias cadastradas para receber os cobertores no Parolin tiveram ar de um programa da prefeitura agradeceu publicamente a Fernanda Richa pela oportunidade: ela ganhou um dia em um salão de beleza. Em seguida veio o discurso de um pastor da região.

O terceiro discurso foi o mais explícito ao pedir votos para Beto Richa. Édson Pereira Rodrigues, presidente da Associação de Moradores e Amigos da Vila Parolin, foi direto ao ponto. "Conto com vocês porque vem uma batalha muito grande aí. (...) A gente precisa desse palanque aqui ano que vem. Para isso – não importa se a imprensa está aqui ou se não estiver – para isso, conto com vocês: Beto governador!"

Depois de mais três discursos – entre eles o do deputado estadual Ademar Traiano (PSDB) – foi a vez de Fernanda Richa. Ela começou contando de uma visita que fez à Vila Torres. Os moradores de lá teriam reclamado da falta de segurança e dito à presidente da FAS que só a polícia resolveria o problema.

"Essa polícia, Traiano, nós não temos. Essa polícia está aqui desde a época em que meu sogro [José Richa] foi governador. É o mesmo número de policiais. Não aumentou um policial, não houve uma capacitação. Se Deus quiser, se Deus quiser e as pessoas ali daquela vila tiverem um pouco de bom senso, no ano que vem, além de a gente fazer concurso, chamar muito mais policiais, capacitar, dar condições de dar segurança para a gente, a vila vai poder mudar. Caso contrário, nós vamos ficar nesse sofrimento", afirmou.

Mais tarde, pediu que a população "caminhe" com ela. "Eu preciso que vocês caminhem comigo. Preciso que vocês caminhem comigo, com o Traiano, com o Edson, porque essa equipe vai continuar mudando", disse. Em entrevista, negou que se trate de pré-campanha para o marido. Só as 15h40, depois de toda a cerimônia, a população pôde receber os cobertores.

Histórico

Fernanda Richa é presidente da Fundação de Ação Social de Curitiba desde 2005. Perma­­neceu à frente da instituição durante os dois mandatos do marido e foi mantida no posto pelo atual prefeito, Luciano Ducci (PSB), depois que Beto Richa renunciou ao mandato para poder concorrer ao governo do estado.

Segundo a prefeitura, a campanha Doe Calor atendeu 109.652 pessoas desde o seu lançamento, em abril. Além de 55 mil cobertores, foram repassadas à população 125.154 peças de roupas.

INVESTIGAÇÃO

MP diz que vai apurar situação

O Ministério Público Estadual pretende apurar se o evento da FAS no Parolin configura crime eleitoral. O promotor Armando Sobreiro, do Centro de Apoio às Promotorias Eleitorais, afirmou ontem que, em princípio, a situação é a mesma que levou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a multar o presidente Lula por campanha eleitoral antecipada em favor de Dilma Rousseff.

"É semelhante ao caso do presidente Lula porque as pessoas estão ali esperando um serviço prestado à população no momento do discurso. É algo que a legislação procura reprimir e repudiar, até para manter a isonomia entre os candidatos", afirma o promotor. Segundo ele, o Ministério Público vai averiguar se houve campanha antecipada e abuso do poder político.

Para o advogado Éverson Tobaruela, especialista em Direito Eleitoral, a situação é mais clara. "Isso é claramente um desrespeito à lei eleitoral", afirma. Tobaruela, que é conselheiro da Ordem dos Advo­­gados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), considera a atuação de Fernanda Richa "um absurdo"."A pessoa está pegando cobertor por causa do frio e o administrador pedindo voto. Cabe a nós evitar que esses absurdos se perpetuem", afirma. No entendimento de Tobaruela, Fernanda Richa estaria "pagando o voto do marido" com a doação dos cobertores. "Aí vão perguntar: ‘Mas tem que parar com o que está fazendo por causa da eleição?’ Claro. Tem que parar. Até para que os eleitores não confundam as funções do governante com o candidato", diz.

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