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Ensino

Notas vermelhas em meio às azuis

Educação pública do Paraná está entre as melhores do país. Mas o estado ainda está longe do desempenho de nações desenvolvidas e precisa corrigir discrepâncias na qualidade das escolas

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Confira alguns indicadores da educação no estado |

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Confira alguns indicadores da educação no estado

O Paraná comemorou os resultados obtidos pelo estado no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) deste ano. O ensino médio das escolas públicas paranaenses alcançou o melhor desempenho nacional, com pontuação de 3,9 – numa escala em que a nota 6 é considerada muito boa, equivalente ao desempenho de nações desenvolvidas (a meta brasileira é atingir essa pontuação em 2022). No ensino fundamental, o estado ficou em quarto lugar, com 4,1 pontos. Curitiba também foi destaque com a maior nota (5,7) entre as capitais nos anos iniciais do ensino fundamental – da 1.ª à 5.ª série.

No entanto, embora esteja melhor que a maioria dos estados, os números revelam que o Paraná ainda tem muito o que avançar. A começar, por corrigir as discrepâncias na qualidade de ensino. Segundo dados do Ideb, 42% dos 399 municípios do Paraná obtiveram notas abaixo da média estadual em 2009. Em São Paulo, essa situação atinge apenas 20% dos 645 municípios do estado.

Os números demonstram a necessidade de estabelecer um padrão de qualidade para o ensino de todo o Paraná e trabalhar para que isso seja alcançado, tanto pelas escolas estaduais quanto municipais.

Para fazer isso, sugerem alguns especialistas, o próximo governador precisará criar uma forma de avaliação do ensino do estado, para ter uma ferramenta que possibilite entender os problemas e buscar soluções para a educação. O ideal é que esse exame tenha um caráter qualitativo, com mais questões discursivas. Isso evitaria criar uma avaliação que apenas se sobreponha ao exame nacional. E o Paraná ganharia uma ferramenta específica para avaliar o ensino no estado.

"É importante a gente ter um sistema próprio sim, mas com características diferentes desse sistema de avaliação [nacional] e com metodologia própria", afirma a professora da Uni­­versidade Estadual de Londrina (UEL) Ednéia Consolin Poli, doutora em Educação pela Uni­­versidade de Campinas (Uni­­camp). "A gente pode aproveitar esses indicadores que o Saeb e a Prova Brasil [dois exames complementares que compõem o Sistema de Avaliação da Educação Básica] trazem para fazer outras análises. Analisar fatores intraescolares, fazer provas na qual a gente possa, por exemplo, olhar como as crianças pensaram para responder àquelas questões", diz Ednéia.

O professor de pós-graduação em Educação Ângelo Souza, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), também defende a criação de um sistema de avaliação diferenciado do federal, para que se consiga analisar a fundo a educação no estado. "Seja quem for o governador do Paraná, ele deveria olhar com melhores olhos a recuperação de um sistema de avaliação. Não o retorno do AVA [Programa de Avaliação do Rendimento Escolar do Paraná criado em 1995 e que seguiu até 2000, quando foi abandonado para priorizar o exame nacional de educação] porque ele era voltado para a proficiência. Mas pensar a avaliação de forma mais consistente, que tome a proficiência estudantil apenas como mais um dos elementos. Não como o mais importante, nem como o único", comenta.

Avaliar para melhorar

Essa avaliação mais profunda do sistema de educação paranaense, no entendimento dos especialistas, deverá servir para ajudar os educadores a detectar os problemas e não para criar um ranking de escolas, nem premiar quem vai melhor nos testes ou punir quem tira notas piores.

"É preciso pensar um modelo de gestão democrática, que torne a avaliação um instrumento, e não um fim. A gente não estuda para ser avaliado; estuda para aprender. A avaliação é um instrumento para detectar em que medida o ensinar e o aprender estão precisando de mais suporte", afirma Souza.

O ranqueamento de escolas e a política de premiação ou punição são considerados alguns dos motivos para os sistemas de avaliação serem vistos com desconfiança pelos professores. "Os resultados das avaliações não podem culpar o professor. E isso é o que muitas vezes acontece. Você traz um resultado baixo de Ideb e diz que o problema é o professor. Não, exatamente não", comenta Ednéia.

A presidente do Sin­­dicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP-Sin­­­dicato), Marlei Fernandes de Carvalho, reitera a necessidade da avaliação, mas vê como um problema a possibilidade disso resultar em premiações ou coisa do tipo. "Nós repudiamos essa fórmula de premiação individual para o professor ou para a escola. A avaliação tem que ser feita, mas não com objetivo de punir."

Análise

Para realmente ser útil, é preciso que a avaliação seja encarada pelos professores e gestores públicos como uma ferramenta para definição de políticas para o setor educacional e ajustes nas linhas pedagógicas. Afinal, de pouco adianta ter dados sem que seja feita uma leitura dessas informações para conseguir entender a realidade e, a partir disso, iniciar as mudanças.

Atualmente, existe deficiência na leitura dos dados apresentados pelo Ideb. Segundo Ednéia, os professores não têm "reais condições para debater os resultados [do Ideb] dentro do ambiente escolar". "Eles olham os resultados, mas não têm espaço suficiente para refletir esses resultados." Com isso, a escola acaba deixando de encarar os problemas detectados pela prova.

A necessidade de fazer uma avaliação mais aprofundada dos resultados é destacada pelo professor Romualdo Por­­tela, da Fa­­culdade de Educação da Uni­­versidade de São Paulo (USP). "A pergunta que fica é o que cada um tem de fazer para melhorar os resultados da qualidade de ensino? Porque os indicadores que nós temos, e que são muitos, evidenciam que nós temos um problema de qualidade", diz Portela, que não enxerga a necessidade de se criar um sistema de avaliação pró­­prio."É preciso tentar avançar na formulação de alternativas para intervir numa realidade que já está bem diagnosticada."

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