
O secretariado do governador eleito, Beto Richa (PSDB), ainda está indefinido, mas sua administração, que começa em 1.º de janeiro, já tem nome e sobrenome: choque de gestão. A inspiração será o governo mineiro Aécio Neves (PSDB), que reformou e modernizou a máquina pública. Mas essas inovações, devidamente reconhecidas por especialistas, escondem defeitos, como a baixa participação da sociedade nas decisões, a desvalorização do funcionalismo, dependência de consultorias externas e a dificuldade para atender às demandas da sociedade. A reportagem conversou com cientistas políticos e especialistas em gestão de Minas Gerais, com a intenção de saber quais são as práticas administrativas mineiras que podem ser copiadas e quais devem ser evitadas pelo governo de Beto Richa. "Nem tudo pode ser seguido. É preciso pensar nos problemas dominantes do Paraná", diz Ivan Beck Ckagnazaroff, coordenador do Núcleo de Estudos de Gestão Pública da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). "A busca por eficiência é uma questão óbvia, mas a eficiência tem de estar acoplada à efetividade. É inútil ser eficiente se você não consegue resolver os problemas da sociedade."
O choque de gestão de Aécio se baseou no corte de gastos e na implantação de metas e avaliação de resultados na gestão pública. Os servidores que cumprem os objetivos progridem na carreira ou recebem incentivo financeiro. Quem não corresponde ao esperado pode, caso seja reincidente mais de uma vez, até perder o emprego.
De acordo com Maria Helena Augusto, especialista em política educacional, uma das grandes vantagens do sistema mineiro foi desburocratizar o acesso das escolas aos recursos públicos o dinheiro chega rapidamente para consertar materiais ou estruturas avariadas, por exemplo.
Mas Maria Helena pondera que a política meritocrática não leva em conta as condições de trabalho do professor. Eles são avaliados, entre outras coisas, pelo desempenho dos alunos nas provas. "Isso não é justo, muitas vezes. Há colégios onde é mais fácil conseguir um bom rendimento dos alunos, porque as famílias participam e o ambiente socioeconômico é favorável. Mas há outras, geralmente em periferias, onde o rendimento não é tão bom. E o critério de avaliação do professor é o mesmo."
Segundo ela, esse tipo de situação poderia ser evitado com a participação mais ampla dos servidores na formulação das políticas públicas. "Quando o professor e a escola tomam conhecimento das regras, elas já estão valendo." Maria Helena diz que a desvalorização do magistério pode ser comprovada pela greve dos professores neste ano quase 50 dias, entre abril e maio.
Não só os professores são avaliados rotineiramente, mas todos os servidores e projetos em execução. O governo divulga as metas cumpridas, mas isso, às vezes, não representa muita coisa, observa Ckagnazaroff. "O pessoal do PSDB vende essa avaliação como um avanço, e de fato foi. Mas o que se percebe é que alguns projetos não avançam nada, outros avançam pelo próprio histórico da secretaria. Nada de novo dentro da administração pública."
O professor Carlos Ranulfo Melo, do Departamento de Ciência Política da UFMG, tem a mesma opinião. "O Aécio implantou uma administração gerencial, que foi boa. Pôs ordem na casa. Mas, às vezes, os objetivos são cumpridos apenas formalmente. Vende-se esse choque de gestão como a 5.ª maravilha do mundo, mas na verdade não é. É um método gerencial, que tem problemas e gera insatisfações."
Segundo Ckagnazaroff, o uso excessivo de consultorias externas também tem restrições. "A cultura na gestão privada é uma coisa; e a cultura e as necessidades na administração pública são outras bem diferente. Será que não há mão de obra adequada dentro do governo para fazer o planejamento?", questiona. Uma dessas consultorias usadas em Minas, a INDG, pode ser contratada no Paraná, conforme Beto Richa.
O cientista político Luís Aureliano Gama de Andrade, que atuou no banco estadual de desenvolvimento de Minas, defende as reformas de Aécio, e diz que vários projetos mais sensíveis ficaram a cargo de servidores. "O planejamento de longo prazo foi feito com pessoal do próprio governo", disse ele, citando como exemplo as obras para a Copa do Mundo de 2014, que já tiveram início.




