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Confira: novo modelo de gestão em Minas não foi suficiente para sanar os problemas |
Confira: novo modelo de gestão em Minas não foi suficiente para sanar os problemas| Foto:

Análise

Marketing esconde problemas

A gestão de Aécio Neves em Minas Gerais é tão elogiada porque foi beneficiada pela complacência da mídia em relação ao governo mineiro e pela comparação com a gestão anterior, de Itamar Franco (1999-2003). A avaliação é do professor Carlos Ranulfo Melo, da Universidade Federal de Mi­­­nas Gerais (UFMG). Segundo ele, se não fosse por isso, ficariam mais evidentes os problemas sociais do estado.

"Comparando, o estado melhorou, porque o governo Itamar foi muito ruim, uma confusão generalizada. Mas um ponto fraco da gestão do Aécio sempre foi a política social. O governo se notabilizou por um controle muito forte da imprensa. É um governo bom, mas existe muito marketing, pro­­paganda, e um controle exercido diretamente sobre a imprensa", relata Melo.

A eficiência administrativa de Minas Gerais, por exemplo, não se comprova em alguns números. O estado tem um comprometimento alto com a folha de pagamento: 46,16% da receita corrente líquida (RCL) em 2009, bem perto do limite prudencial determinado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, de 46,55%. A situação do Paraná, em que pesem todas as críticas de Beto Richa sobre o "inchaço da máquina", é um pouco melhor: o gasto é de 45,1%.

"Estar perto do limite não quer dizer inchaço", contrapõe o cientista político Luís Aureliano de Andrade. Mas ele confirma que o mote "déficit zero", difundido pelo governo mineiro, não corresponde bem à realidade. "A dívida é impagável. Ela é renegociada e protelada. O que o Aécio conseguiu foi um fluxo de dinheiro positivo. Arrecada-se mais do que gasta e sobra recursos para os investimentos."

Atualmente, Minas Gerais deve o equivalente a 176,3% da RCL; o Paraná deve 118,7%. O limite permitido por lei é de 200%. Aécio Neves teve o mérito de reduzir a relação dívida/receita, que era de 203,1% em 2006. (RF)

  • O ex-governador mineiro Aécio Neves, em março deste ano, durante visita à Cidade Administrativa de Belo Horizonte, obra orçada em R$ 1,4 bilhão: mais dinheiro para investimentos depois de reforma na gestão pública

O secretariado do governador eleito, Beto Richa (PSDB), ainda está indefinido, mas sua administração, que começa em 1.º de janeiro, já tem nome e sobrenome: choque de gestão. A inspiração será o governo mineiro Aécio Neves (PSDB), que reformou e modernizou a máquina pública. Mas essas inovações, devidamente reconhecidas por especialistas, escondem defeitos, como a baixa participação da sociedade nas decisões, a desvalorização do funcionalismo, dependência de consultorias externas e a dificuldade para atender às demandas da sociedade. A reportagem conversou com cientistas políticos e especialistas em gestão de Minas Gerais, com a intenção de saber quais são as práticas administrativas mineiras que podem ser copiadas e quais devem ser evitadas pelo governo de Beto Richa. "Nem tudo pode ser seguido. É preciso pensar nos problemas dominantes do Paraná", diz Ivan Beck Ckagnazaroff, coordenador do Núcleo de Estudos de Gestão Pública da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). "A busca por eficiência é uma questão ób­­via, mas a eficiência tem de estar acoplada à efetividade. É inútil ser eficiente se você não consegue re­­sol­­­ver os problemas da sociedade."

O choque de gestão de Aécio se baseou no corte de gastos e na implantação de metas e avaliação de resultados na gestão pública. Os servidores que cumprem os objetivos progridem na carreira ou recebem incentivo financeiro. Quem não corresponde ao esperado pode, caso seja reincidente mais de uma vez, até perder o emprego.

De acordo com Maria Helena Augusto, especialista em política educacional, uma das grandes vantagens do sistema mineiro foi desburocratizar o acesso das escolas aos recursos públicos – o dinheiro chega rapidamente para consertar materiais ou estruturas avariadas, por exemplo.

Mas Maria Helena pondera que a política meritocrática não leva em conta as condições de trabalho do professor. Eles são avaliados, entre outras coisas, pelo desempenho dos alunos nas provas. "Isso não é justo, muitas vezes. Há colégios onde é mais fácil conseguir um bom rendimento dos alunos, por­­­que as famílias participam e o ambiente socioeconômico é favorável. Mas há outras, geralmente em periferias, onde o rendimento não é tão bom. E o critério de avaliação do professor é o mesmo."

Segundo ela, esse tipo de situação poderia ser evitado com a participação mais ampla dos servidores na formulação das políticas públicas. "Quando o professor e a escola tomam conhecimento das regras, elas já estão valendo." Ma­­­­ria Helena diz que a desvalorização do magistério pode ser comprovada pela greve dos professores neste ano – quase 50 dias, entre abril e maio.

Não só os professores são avaliados rotineiramente, mas todos os servidores e projetos em execução. O governo divulga as metas cumpridas, mas isso, às vezes, não representa muita coisa, observa Ckagnazaroff. "O pessoal do PSDB vende essa avaliação como um avanço, e de fato foi. Mas o que se percebe é que alguns projetos não avançam nada, outros avançam pelo próprio histórico da secretaria. Nada de novo dentro da administração pública."

O professor Carlos Ranulfo Me­­­lo, do Departamento de Ciência Política da UFMG, tem a mesma opinião. "O Aécio implantou uma administração gerencial, que foi boa. Pôs ordem na casa. Mas, às vezes, os objetivos são cumpridos apenas formalmente. Vende-se esse choque de gestão como a 5.ª maravilha do mundo, mas na verdade não é. É um método gerencial, que tem problemas e gera insatisfações."

Segundo Ckagnazaroff, o uso excessivo de consultorias externas também tem restrições. "A cultura na gestão privada é uma coisa; e a cultura e as necessidades na administração pública são outras bem diferente. Será que não há mão de obra adequada dentro do governo para fazer o planejamento?", questiona. Uma dessas consultorias usadas em Minas, a INDG, pode ser contratada no Paraná, conforme Beto Richa.

O cientista político Luís Aurelia­­­no Gama de Andrade, que atuou no banco estadual de desenvolvimento de Minas, defende as reformas de Aécio, e diz que vários projetos mais sensíveis ficaram a cargo de servidores. "O planejamento de longo prazo foi feito com pessoal do próprio governo", disse ele, citando como exemplo as obras para a Copa do Mundo de 2014, que já tiveram início.

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