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Cada loteamento ganha um novo nome e funciona como célula autônoma na Regional CIC | Hugo Harada/ Gazeta do Povo
Cada loteamento ganha um novo nome e funciona como célula autônoma na Regional CIC| Foto: Hugo Harada/ Gazeta do Povo

História de terror contada por meninas

Em uma das vilas da CIC, jovens passam a tarde em canchas de areia. Os meninos jogam futebol ou andam de skate. Ao ver três meninas pequenas numa quadra, a reportagem perguntou se elas estavam acompanhadas. Resposta negativa, mas a avó mora do lado, então não há problema, dizem.

À outra pergunta corriqueira – "gostam de vir à praça?" – a resposta é desconcertante. "Nossa mãe foi morta aqui no matagal. Cortaram a bochecha dela, arrancaram o olho dela." Dizem as meninas de 10, 8 e 5 anos.

A violência também afeta quem mora nos condomínios luxuosos. Segundo Adriana dos Santos Prado, muitas pessoas deixaram de atravessar o bairro para trabalhar nas casas, por falta de segurança. O bairro CIC registrou o maior número de homicídios na cidade entre janeiro e junho – 52, de um total de 304.

População

184,2 mil pessoas moram na Regional CIC. Isso a colocaria como o 9º maior município do Paraná. Seu território – 61,5 mil quilômetros quadrados, pouca coisa menos que a Regional Boa Vista – abriga a Represa do Passaúna, com um parque municipal e lago, a Casa de Custódia de Curitiba, e também um Fórum Judiciário, que será inaugurado nas próximas semanas.

  • Grazieli Gonçalves: qualificação para buscar novo emprego
  • Alfredo Lakoski vive na área rural e produz hortaliças
  • Adriana e Jardel Oliveira: falta infraestrutura de qualidade
  • Nelson de Sousa: bairro é grande e precisa de mais atenção
  • Dona de minimercado, Andrea da Silva deixou o Bolsa Família

A Cidade Industrial de Curitiba (CIC) é tão famosa e superlativa que acaba incorporando os bairros vizinhos – Augusta, Riviera e São Miguel –, como se não houvesse divisão entre eles. Mas, na verdade, a Regional CIC é o caso extremo de fragmentação: cada loteamento, cada conjunto habitacional e cada área invadida tem um nome próprio, como se fossem bairros autônomos. Nesta grande colcha de retalhos, todas as riquezas e contradições brasileiras se fazem presentes. Há mansões luxuo­­sas e favelas transbordando em barrancos; há serviços públicos de primeiro mundo e violência típica de um estado de exceção; há indústrias produzindo riqueza e fumaça, empresas que fecham as portas e também áreas verdes que alimentam a alma e o corpo.

Também há histórias, diversas. Andrea da Silva, 34 anos, ri ao assumir que virou empresária há quatro meses, quando abriu um minimercado entre a Vila Sandra e o Atenas, onde mora. Não foi fácil chegar até aí. Ela e o marido saíram do interior do Paraná para a capital em 2004, tentar uma vida melhor. O Bolsa Família ajudava na criação dos dois filhos pequenos. Ela trabalhou na cozinha de uma creche, depois como zeladora em condomínio e eis que ela mudou de lado, virou "patrão". O Bolsa Família foi suspenso há cinco anos. "A renda da família melhorou."

Mas há muito o que fazer nas imediações, diz o casal Adriana dos Santos Prado, 33, e Jardel Martins de Oliveira, 23 anos. "Precisamos de um parque para as crianças, com brinquedos de verdade, e iluminação", diz Oliveira, autônomo. Adriana mostra a rua de saibro inclinada na Moradias Tramontina – "já levei um tombo, me machuquei" – e também pede mais segurança. "Não é seguro andar aqui", conta.

Seguindo ao longo da rua Ludovico Kaminski – onde o Fórum do Poder Judiciário será inaugurado em breve, com projetos para um programa de pacificação social – a pavimentação é precária, não há calçadas. Há alguns anos uma centena de casas espera a definição para o que eles chamaram de Vila Vitória – uma invasão que já conta com ligações de luz e esgoto, mas que ainda não tem nome nos logradouros. "A CIC é enorme. Precisamos de uma atenção melhor", opina Nelson Henrique de Sousa, 28 anos, comerciante.

Nas Moradias Diadema, Grazieli Damaceno Gon­­çalves, 26 anos, reclama de empresas desativadas na região. Ela está procurando emprego e, mesmo fazendo cursinho de informática e mecânica básica, ainda não conseguiu uma vaga. Mas gosta do lugar onde mora. "O bairro está crescendo. O ruim é que antes o ponto final do ônibus era aqui, mas agora vem das Moradias Corbélia já lotado."

Uma das coisas boas da região é o Clube da Gente, que faz a alegria do Caiuá com a oferta de atividades físicas. Dulcineia Ferreira Silva, 44 anos, desempregada, está aprendendo a nadar, sem gastar nada.

Alfredo e Miriam Lakoski, que cultivam hortaliças e são feirantes, também sofrem com o crescimento populacional da CIC. "Antes não se ouvia nada. Agora tem som alto no fim de semana, festa", dizem. A proximidade com Araucária tem vantagens e desvantagens: o filho estuda na escola do município vizinho, e tem transporte escolar rural. Mas a pavimentação e a iluminação na região são precárias. Outro problema é o acesso à internet, que ainda não chegou naquelas bandas. Mas a tranquilidade os mantém na área rural. "É qualidade de vida", resume Miriam.

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