
A quase 15 dias do início da campanha eleitoral em todo o Brasil, ainda há debates sobre o impacto das novas regras do pleito, impostas por uma reforma na legislação feita no final do ano passado.
A principal alteração tem ligação com a fonte de recursos para as campanhas eleitorais. Pela primeira vez, o candidato está proibido de pedir dinheiro a empresas. Até aqui, a doação feita por pessoas jurídicas representava a maior parte do financiamento das grandes e médias campanhas políticas.
Em função da mudança, o meio político já prevê uma campanha eleitoral “mais pobre”, embora amenizada por outra novidade do pleito de outubro: a redução do tempo da propaganda nas ruas, de 90 para 45 dias. Ou seja, a expectativa é que uma campanha eleitoral “mais rápida” também seja “mais barata”.
Mas o impacto da campanha supostamente mais pobre ainda é uma incógnita. Aprovado na esteira de escândalos de corrupção revelados pela Lava Jato, o fim do financiamento privado das campanhas eleitorais em tese elimina o “toma lá dá cá” entre empresas e políticos. Por outro lado, há quem alerte para um efeito negativo, o aumento do “caixa dois”, dada a dificuldade de arrecadação pelas fontes autorizadas. Há outros debates.
“A verdade é que ninguém sabe como é que vai ser a campanha eleitoral neste ano. É uma alteração de hábitos muito fortes”, comenta Paulo Cunha, especialista em marketing político da Universidade de Brasília (UnB).
Para o advogado João da Fontoura, especialista em Direito Eleitoral, o fim da participação das empresas no processo eleitoral pode equilibrar a disputa. “Para aqueles candidatos que já têm menos recursos, a mudança é bem vinda. As campanhas devem ficar todas modestas. Dá uma equilibrada”, afirma ele.
Agora, o candidato pode aceitar doações de pessoas físicas ou tirar do próprio bolso. O partido político e o Fundo Partidário também podem ajudar. “Há uma rejeição hoje à classe política. É difícil encontrar um cidadão de carne e osso que queira tirar dinheiro do bolso para um candidato. Já a doação da empresa passava por um raciocínio diferente, estratégico”, opina o advogado.
O advogado Fernando Knoerr, ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), também acredita que a redução do volume de dinheiro permite uma campanha eleitoral “mais saudável”. “Dá condições de acesso a quem não tem relações íntimas com empresas”, afirma ele.
Defensores da redução do leque de fontes de financiamento alertam ainda que, em tempo de campanhas modestas, o uso “do caixa dois”, com a injeção extra de dinheiro em materiais publicitários, cabos eleitorais e grandes produções na tevê, chamará a atenção da fiscalização.
Para Paulo Cunha, “é claro que as regras sempre podem ser burladas”, mas, de modo geral, espera-se uma campanha menor. “Eles terão que ser criativos e estamos curiosos para saber como vai ser”, diz o especialista da UnB.
Histórico
A discussão sobre financiamento de candidatos ganhou força no final de 2013, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), protocolada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), e que contestava a doação de pessoas jurídicas. Os ministros do STF só concluíram o julgamento da ADI em setembro de 2015, quando, por maioria, entenderam que pontos da legislação eleitoral, que autorizavam a contribuição de pessoa jurídica, eram inconstitucionais.
Ainda no final de 2015, o Congresso Nacional aprovou uma reforma na legislação eleitoral e manteve a possibilidade de doação empresarial. Na presidência da República, Dilma Rousseff vetou o trecho, com base na posição do STF. Pressionados pela Lava Jato – que expôs esquemas gigantes de corrupção envolvendo empresas, funcionários públicos e políticos –, os parlamentares mantiveram o veto.
“O STF entendeu que pessoa jurídica não é eleitor e que, por isso, as empresas não teriam interesse legítimo no processo”, resumiu o advogado João da Fontoura, especialista em Direito Eleitoral. “Pessoalmente, eu acho que a posição do STF é radical. A gente vê nas eleições norte-americanas, por exemplo, que as empresas se manifestam, compram espaço na televisão. Mas, por outro lado, é compreensível que se tente acabar com a relação perniciosa entre os políticos e as empresas”, avalia ele.
Redução do tempo
No pleito anterior, de 2012, a campanha eleitoral já estava nas ruas desde o início de julho. Agora, para a eleição de outubro próximo, o período da propaganda só começa em meados de agosto.
Para o advogado Fernando Knoerr, ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, a mudança é ruim. “Eu acho que o eleitor vai ter menos oportunidade para conhecer os candidatos e isso interfere na qualidade da escolha. A longo prazo, o déficit de representatividade pode aumentar, o que é perigoso”, avalia Knoerr.
A alteração do tempo foi aprovada na mesma reforma eleitoral que vetou o financiamento privado aos candidatos, no final do ano passado.



