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Ex-políticos do Paraná recebem até R$ 500 mil

Rogerio Waldrigues Galindo

Assim como acontece na esfera nacional, políticos que deixam mandatos ou cargos em governos locais também costumam usar os conhecimentos adquiridos na gestão pública para trabalhar depois como consultores. Como não mantêm mais laços com governos, eles dizem estar apenas contribuindo para que empresas e prefeituras se desenvolvam, sem qualquer problema de ordem ética.

O consultor de maior sucesso entre os ex-políticos paranaenses é o ex-governador Jaime Lerner, afastado da vida pública desde 2003. Hoje ele mantém um escritório de urbanismo que trabalha para prefeituras de todo o país. Em Ub­­­­­eraba (MG), o atual prefeito, Anderson Adauto, ministro dos Transportes no governo Fernando Hen­­­­­­­­rique Car­­­doso, pagou R$ 500 mil por um projeto urbanístico e viário. A cidade está implan­­­tando ônibus em canaletas, esta­­­ções-tubo e praças criadas por Lerner.

Presidente do Instituto Ambiental do Paraná (IAP) no governo Roberto Requião, Vitor Hugo Burko também abriu uma empresa de consultoria ao deixar o cargo público. A Estratégia Ambiental trabalha com empresas, nunca com governos, segundo Burko. "É uma maneira de usar o que eu aprendi no IAP. Foi a época da minha vida que eu mais tive de estudar", diz ele.

Burko diz que o trabalho como consultor serve inclusive para recompor as suas finanças. "Tive dois mandatos como prefeito de Guarapuava e depois fui para o governo. Como acontece com muita gente que vai para a vida pública, deixei minha vida pessoal de lado. Saí com minha vida financeira arrasada", diz.

Antonio Poloni, secretário da Agricultura no governo de Jaime Lerner, trabalha hoje na Federação da Agricultura do Estado do Paraná. "Tem gente que depois de passar pelo governo não precisa mais trabalhar. Não é o meu caso. Tenho 61 anos e continuo trabalhando", diz ele. Poloni tem discurso semelhante, dizendo que é uma maneira de utilizar seus conhecimentos e ajudar a sociedade.

Foto: Antonio Costa / Gazeta do Povo

Ex-governdor Jaime Lerner deixou a política em 2003 para ser consultor

Notoriedade, informações técnicas e "facilidades" compõem o cardápio procurado pela iniciativa privada ao contratar os serviços de políticos com ou sem mandato. O grau de sigilo e de interesses econômicos dessas informações delimita se os negócios são éticos e legais. Brechas na legislação dificultam a fiscalização de abusos.

Desde que deixou o Palácio do Planalto, o ex-presidente Lula já realizou seis palestras a empresários. Estima-se que ele recebeu mais de R$ 1 milhão pela participação nos eventos. Todos os contratantes foram companhias de peso internacional – LG, Microsoft, Associação dos Bancos do México, Telefônica, Bank of America/Merril Lynch.

Na quarta-feira passada, Lula falou a bilionários e herdeiros durante o 9.º Encontro de Empresários da América Latina, na ilha de Comandatuba, na Bahia. Até agora, o ex-presidente fez explanações sobre macroeconomia, educação, democracia e estabilidade fiscal.

Assim como Antonio Palocci, outros cinco ministros do governo Dilma Rousseff tam­­bém possuem empresas de con­­sultoria. São eles: Fernando Pimentel (Desen­volvimento, Comércio e Indústria), José Eduardo Martins Cardozo (Justiça), Moreira Franco (Assuntos Estratégicos), Leônidas Cristino (Portos) e Fernando Bezerra Coelho (Integração Nacional). Em e-mail enviado na semana passada a parlamentares para explicar sua evolução patrimonial, a assessoria da Casa Civil apontou outros casos de autoridades que passaram pela área econômica do governo e construíram uma carreira sólida na iniciativa privada.

O texto cita que os ex-presidentes do Banco Central e do Banco Nacional de Desen­volvimento Econômico e Social Pérsio Arida e André Lara Resende tornaram-se banqueiros. Também diz que o ex-ministro Pedro Malan tornou-se diretor de instituição financeira e trata o ex-ministro Mailson da Nóbrega como consultor de prestígio. As citações da assessoria constrangeram Palocci, que ligou para todos os citados pedindo desculpas.

O material afirma que a experiência no governo é "única" e "dá enorme valor a esses profissionais no mercado". Todos os mencionados são economistas ou já trabalhavam na área financeira antes de integrar o primeiro escalão do governo. Já Palocci é formado em Medicina e, antes de ministro da Fazenda, foi vereador e prefeito de Ribeirão Preto.

Tênue

A presidente da regional paranaense da Associação Brasileira de Recursos Humanos, Sonia Gurgel, afirma que há uma "linha tênue" entre o que pode ser considerado um serviço ético ou não prestado pelos políticos. "É absolutamente normal contratar alguém para obter um parecer técnico, errado é pagar para alguém abrir portas no governo. O que rege essa questão é a cultura ética tanto do contratante quanto do contratado."

No caso das palestras de Lula, Sonia afirma que os empresários parecem estar atrás da notoriedade do ex-presidente. "Existe o fenômeno de as empresas chamarem gente de fora para debater determinados assuntos. Elas preferem gente que chame a atenção para atrair mais motivação."

Para o cientista político Valeriano Mendes Ferreira Costa, da Universidade de Campinas, o caso Palocci está mais sujeito a uma esfera de julgamento moral do que legal. "Uma pessoa pode ou não se beneficiar de informações públicas as transmitindo para a iniciativa privada?", questiona. "O que levanta suspeita é que o Palocci não possui uma formação acadêmica na área econômica."

O cientista político Valdir Pucci, da Universidade de Brasília, afirma que o episódio deveria servir para que o governo passe a delimitar regras mais claras para a conservação de informações que considera sigilosas. "É necessário um sistema para blindar essas informações, que pode ser construído por regras internas do governo mais rígidas ou uma lei mais rigorosa."

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