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Os equipamentos do sistema de controle aéreo brasileiro são falhos, ultrapassados e ineficientes para evitar colisões entre aeronaves. A afirmação é do representante da Federação Internacional de Controladores de Tráfego Aéreo (Ifatca, pela sigla em inglês), Christoph Gilgen, que passou uma semana em 2006 investigando o principal centro do comando de vôos do Brasil, o Cindacta-1, em Brasília.

Em entrevista à reportagem do "Fantástico", ele afirma: o programa de computador usado no país para controlar os vôos foi uma das causas que motivou o acidente entre o jato Legacy e o Boeing da Gol, em setembro do ano passado. As 154 pessoas a bordo da aeronave da companhia aérea brasileira morreram.

"Em poucas palavras, eu posso afirmar que o software X-4000 contribuiu fortemente para a cadeia dos eventos que terminou com a colisão do avião Legacy com o Boeing da Gol", diz.

Após o choque entre as duas aeronaves, a Associação Brasileira dos Controladores de Tráfego Aéreo pediu ajuda para a Ifatca, que tem mais de 50 mil associados em 130 países. A entidade enviou investigadores para o Brasil em outubro - Gilgen foi um deles. Depois da visita, foi feito um relatório que foi enviado para organizações como a federação internacional de pilotos e a organização internacional de aviação civil.

Segundo Gilgen, o programa tem uma falha grave: ele pode mudar automaticamente na tela de controle a altitude da aeronave, sem consentimento ou confirmação do controlador. "Então temos uma situação em que o controlador, que está no chão, e o piloto, que está voando, estão trabalhando com altitudes diferentes. E é lógico que isso é muito perigoso, os controladores não podem garantir segurança nem separação das aeronaves. Infelizmente, como vimos no dia 29 de setembro, isso pode acabar da pior maneira possível, em uma colisão."

O comportamento falho do software é único no mundo, segundo o especialista. "Francamente, eu viajo muito e já tive o prazer de ver muitos centros de controle no mundo, nos cinco continentes. Nunca vi um sistema que permite essa mudança automática", comenta.

Além do software, o especialista apontou ainda outras falhas no controle aéreo do país. "Os rádios são muito velhos, o alcance deles não é suficiente para cobrir todos os setores que são controlados, por exemplo, pelo centro de controle de Brasília. Os radares também são antigos, mostram muitas imagens de fantasmas e outros alvos incorretos", comenta Gilgen. "Os radares não têm o alcance que deveriam, por isso existem pontos cegos onde você não vê os aviões." O acidente

No dia da colisão, o plano de vôo do Legacy estipulava que o avião, que saiu de São José dos Campos (SP), deveria voar até Brasília numa altura de 37 mil pés. Sobre Brasília, o avião desceria mil pés e continuaria voando a 36 mil pés.

Mas os pilotos não fizeram isso: ultrapassaram Brasília e não mudaram a altitude. No centro de controle aéreo, a tela do operador teria indicado a altitude errada.

Um dos controladores que trabalhava naquele momento, Jomarcelo Fernandes dos Santos, foi acusado formalmente pela morte das 154 pessoas que estavam no Boeing da Gol e diz que não conseguiu contato com o avião por rádio. Em defesa própria, ele alega ter imaginado que estava tudo bem e que o Legacy tinha mudado de altitude. Guerra de versões

A falta de confiança no sistema é confirmada por um controlador ouvido pela reportagem do "Fantástico" durante a semana. "Nosso maior receio é um acidente. Nós não confiamos nos equipamentos, nunca sabemos quando o equipamento vai parar de funcionar ou não. Todo dia temos problemas."

Em resposta às críticas do representante da Federação Internacional de Controladores de Tráfego Aéreo, a Aeronáutica afirmou que não vai alimentar a "guerra de versões" sobre o controle do espaço aéreo brasileiro e reforça que o sistema é eficiente e seguro.

Além disso, em nota assinada pelo chefe do centro de comunicação da instituição, Brigadeiro Antônio Carlos Bermudez, a Aeronáutica ressalta que a única organização estrangeira reconhecida para emitir recomendações ao Brasil é a Organização de Aviação Civil Internacional. Gravações no trabalho

A tensão nos centros de controle aéreo chegou a tal ponto que alguns controladores passaram a fazer gravações de vídeo durante o trabalho. Uma das filmagens mostra uma suposta pane no sistema de planos de vôo do Cindacta de Brasília na véspera do feriado de Corpus Christi, no início de junho.

A Aeronáutica, entretanto, afirma que os vídeos são falsos. "Nossos técnicos analisaram essa imagem e o que ela mostra é uma simulação grotesca de uma pane", diz a nota.

Naquele feriado, houve atrasos dos vôos nos aeroportos e a Aeronáutica chegou a admitir que houve uma falha nos equipamentos - mas nada tão grave quanto alegam os controladores.

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