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Depoimento

Como decidir contra um país inteiro?

Rosana Félix, repórter de Vida Pública.

Não quero fazer um juízo definitivo sobre o caso Cesare Battisti. Sei que o Judiciário pode cometer muitos erros e condenar injustamente pessoas inocentes – isso em qualquer país do mundo. Por isso achava provável a tese de que o italiano é um bode expiatório de uma Itália cuja liderança mundial vem se afundando cada vez mais, principalmente pela atuação questionável do primeiro-ministro Silvio Berlusconi, volta e meia envolvido em escândalos sexuais.

Mas, ao percorrer a Itália durante sete dias, conversar com familiares de vítimas, com políticos e com gente comum, sem interesse direto no caso, fica mais difícil concordar com a decisão tomada por Lula. Professores universitários ou camponeses, políticos de direita ou de esquerda, jornais e televisão só se referem a Battisti como "terrorista". Não existe essa expressão de "ex-ativista".

Conheci melhor a história italiana, mas minha responsabilidade sobre o caso é nula. Disse que não queria fazer um juízo sobre o caso, mas é quase impossível. Será que as pessoas responsáveis pela decisão da extradição não deveriam se informar mais sobre os anos de chumbo da Itália, tão diversos dos nossos, sob o jugo de uma ditadura militar? Será que um país inteiro está errado e a decisão de um presidente – que já virou ex – é que está certa?

O ex-presidente Lula acertou ao não conceder a extradição de Cesare Battisti. Quem afirma é Renata Saraiva, uma das advogadas responsáveis pela defesa do italiano no país. "As reações do governo italiano e de setores da sociedade italiana, com ameaças de sequestro de Battisti no Brasil, passeatas, notas oficiais, moções e propostas de boicote ao Brasil e a todas as pessoas que apoiaram Cesare Battisti falam por si", afirma Renata, em entrevista concedida por e-mail. Battisti não fala mais com a imprensa. Ele só teria interesse em continuar com sua "pacata vida de escritor", diz ela.

Renata afirma que Battisti foi julgado à revelia e não teve chance de se defender – ele foi condenado nas três instâncias do Judiciário italiano. Ela ressalta que "os verdadeiros culpados" transferiram a Battisti toda a culpa porque teriam direito à delação premiada. Ele estava vivendo em paz na França, que já havia negado o pedido de extradição. Mas, diz ela, com uma mudança na orientação ideológica do governo francês, a França acabou cedendo à Itália e decidindo por extraditá-lo.

O italiano recorreu a tribunais franceses, mas não obteve sucesso. Apresentou ainda recurso à Corte Europeia, que foi negado. Renata ressalta que esse órgão não apreciou a legalidade da extradição. "A Corte apreciou, tão somente, a adequação do julgamento à revelia face à Convenção Europeia de Direitos Humanos."

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