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No momento em que a opinião pública cobra medidas mais duras contra o crime e o Congresso aprova a toque de caixa projetos que criam ou aumentam penas, especialistas da área jurídica põem em xeque a eficácia de mudanças que consideram imediatistas. Para eles, mais importante do que aumentar penas, é preciso a certeza de que as leis e punições em vigor serão aplicadas. Para o especialista em Direito Penal Damásio de Jesus, não é a quantidade ou a qualidade de novas leis sobre o tema que reduzem a criminalidade, mas sim, a certeza de que, ao cometer um crime, o bandido será preso e condenado.

- Os legisladores vão à televisão e dizem que vão aumentar a pena de quem influencia menores a cometer crimes. Isso vai reduzir as ocorrências? Não vai. Podemos mudar nosso Código Penal inteiro, escrever um novo. Não vai mudar nada - critica o professor.

Só nesta semana, em meio ao choque provocado pelo assassinato de João Hélio Fernandes Vieites, de 6 anos, no Rio, o Congresso aprovou quatro medidas para combater a criminalidade. A progressão da pena para crimes hediondos deixou de ser em um sexto da pena e só passará a ocorrer após um terço em regime fechado. O uso de celulares em presídios se tornou "falta disciplinar grave". A punição para adultos que envolverem menores em crimes chegou a ser aprovada duas vezes, na Câmara e no Senado. Por pouco, o polêmico projeto que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos não foi votado, na quarta-feira, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Uma manobra da bancada governista adiou a votação.

Para Damásio, mais do que alterar a legislação, é preciso vontade política para enfrentar o problema da ineficiência do sistema penal:

- É preciso ter um sistema penal sério, eficiente e responsável. E isso nós não temos. Refiro-me às três esferas: Polícia, Poder Judiciário e sistema prisional. Enquanto tivermos três polícias que se desentendem, um Poder Judiciário que não consegue se comunicar entre si e prisões falidas, é difícil pensar em melhorias - analisa.

Damásio é enfático ao criticar a redução da maioridade penal no país:

- É claro que alguém de 16 anos é capaz de saber o que é certo ou errado. Mas o Brasil não tem condições de receber um criminoso dessa idade no sistema prisional. Feriria até o princípio de dignidade da Constituição. Se o sistema peninteciário fosse mais humano, talvez pudéssemos reduzir a maioridade, mas, na realidade brasileira, pós-graduaríaramos esses jovens no crime.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, também não acredita que o endurecimento de penas seja a solução para a violência:

- Durante a ditadura militar, chegou-se a estabelecer aqui a pena de morte, para coibir atos subversivos. E por isso acabaram os atos subversivos cometidos naquela época? Não. Porque não é a dureza da pena que desestimula o bandido, é a sensação de impunidade que o estimula - afirma Britto.

Apesar das críticas, alguns especialistas apoiaram parte dos projetos aprovados pelo Congresso. É o caso de Michel Pachá, ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio:

- O projeto que dobra a condenação de maiores que corrompem menores é salutar. Vai desestimular uma prática muito comum no país - afirma.

No entanto, Pachá insiste na necessidade de atuar em outras frentes:

- Apenas endurencimento de pena não resolve. É apenas paliativo. Crianças e adolescentes crescem no Brasil sem conhecer o Estado, que nunca o atendeu. Ele só vai ter contato com o Estado na figura de juízes e policiais. Isso preciso mudar. E isso não se resolve em dias nem em anos. É política de longo prazo.

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