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Lula saiu em defesa da presidente Dilma Rousseff, chamada de "ingrata" por Fernando Henrique Cardoso | Raveendran/AFP
Lula saiu em defesa da presidente Dilma Rousseff, chamada de "ingrata" por Fernando Henrique Cardoso| Foto: Raveendran/AFP

Aliados consideram difícil evitar a abertura de investigação

Agência O Globo

Com as novas acusações feitas por Marcos Valério, em depoimento dado em setembro ao Ministério Público, dirigentes do PT e fontes palacianas, inclusive os mais próximos ao ex-presidente Lula, consideram nos bastidores que será difícil evitar a abertura de uma investigação contra ele.

Para enfrentar os escândalos dos últimos meses, Lula disse a amigos que sua ação de defesa mais enfática começará em fevereiro ou março de 2013, quando voltará a fazer pelo país as caravanas que ficaram famosas em suas primeiras campanhas ao Palácio do Planalto. O ex-presidente considera que a melhor forma de responder às acusações é conversar diretamente com o povo e defender o seu legado.

Diante da crise política que vem minando a imagem do ex-presidente, o PT também aposta que a reedição das caravanas, com o esperado fortalecimento do apoio popular, pode blindar Lula do ataque da oposição e ajudar o partido. O sinal vermelho no "QG Lulista" foi aceso após o último escândalo envolvendo Lula, o da Operação Porto Seguro, que indiciou Rosemary Noronha, ex-funcionária da Presidência da República em São Paulo que é próxima ao ex-presidente. Este episódio soma-se ao julgamento do mensalão e, agora, ao novo depoimento de Marcos Valério – ele sustenta que Lula sabia do esquema e que teve contas pessoais pagas por ele.

Candidatura

Segundo interlocutores do ex-presidente, ele quer muito levar adiante o projeto das caravanas, para resgatar sua imagem. A ideia é mostrar que se trata do "mesmo Lulinha de antes" e defender uma perspectiva de futuro, já que o núcleo petista admite que o partido sai avariado das sucessivas denúncias e escândalos. Com a retomada das viagens, que Lula empreendeu pela primeira vez durante os anos 1990, pretende-se conseguir uma mobilização popular para manter alta a aprovação do ex-presidente e fortalecê-lo como cabo eleitoral do partido.

Essas mesmas fontes, que têm contatos frequentes com o ex-presidente, afirmam que não há hipótese de Lula ser candidato a presidente em 2014. Com as caravanas, o seu intuito seria somente o de consertar o estrago em sua imagem durante este ano, considerado "duro politicamente", para continuar sendo eficiente como "garoto propaganda" do PT e do grupo aliado.

  • Freud: do dossiê dos aloprados ao envolvimento no mensalão

Uma transferência bancária de R$ 98,5 mil feita em 2003 pela agência de publicidade SMP&B para a empresa Caso, de Freud Godoy (ex-assessor do ex-presidente Lula), liga as novas denúncias do operador do mensalão, Marcos Valério, ao trabalho da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPI) dos Correios. Em 2005, a CPI detectou a transação, mas o fato acabou em segundo plano. O episódio remete à dúvida: por que Lula não foi investigado naquela época?

O relatório final da comissão, que auxiliou a investigação do Ministério Público e desencadeou a ação penal em julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), tem 1.880 páginas. Três delas são dedicadas ao tópico "A Ciência do Presidente Lula". O trecho aborda os depoimentos dos então deputados federais Roberto Jefferson (PTB), Aldo Rebelo (PCdoB) e José Múcio Monteiro (PTB) sobre o fato de que Lula havia sido informado sobre o esquema.

O texto conclui, no entanto, que não houve "responsabilidade objetiva" de Lula no mensalão. Também diz "não haver qualquer fato que evidencie" que o ex-presidente tenha se "omitido". Em todo o relatório, não há menções a Freud Godoy, que na época atuava como uma espécie de "faz-tudo" do ex-presidente.

Relator da CPI, o deputado paranaense Osmar Serraglio (PMDB) diz lembrar-se de que alguns colegas tentaram convocar Godoy para prestar depoimento. Segundo ele, a investigação sobre a participação de Lula não avançou por falta de provas. Isso poderia ter sido diferente caso Valério tivesse detalhado as denúncias recentes em 2005.

"Ele [Valério] não abriu esse tipo de informação para a gente. Fato você não tira da gaveta, precisa de alguma pista para investigar, coisa que naquela época nós não tivemos", diz o parlamentar. Serraglio lembra, contudo, que denúncias testemunhais, mesmo que sem provas materiais, como as de Roberto Jefferson, foram cruciais para nortear as investigações da CPI.

Em novo depoimento à Procuradoria-Geral da República (PGR), feito espontaneamente em setembro (após a condenação a 40 anos de prisão pelo STF), Valério disse que o mensalão ajudou a pagar despesas pessoais de Lula. Desses recursos, ele se referiu a R$ 100 mil transferidos a Freud Godoy. De acordo com Valério, o ex-presidente também teria avalizado os empréstimos bancários que alimentaram o esquema de compra de votos no Congresso Nacional.

O ex-assessor de Lula defendeu-se das acusações e disse que "cada vírgula" da vida dele e da empresa foi investigada por órgãos de controle do Estado. Ele também disse que, caso Valério não apresente provas, vai processá-lo. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, que revelou o depoimento de Valério na semana passada, o publicitário disse ter entregado provas à PGR.

Membro da CPI dos Correios, o senador Alvaro Dias (PSDB) diz que a oposição deveria ter insistido na investigação de Lula. "Foi o nosso erro histórico." O tucano chegou a apresentar um relatório paralelo ao de Serraglio, no qual pedia o impeachment de Lula.

Sub-relator de movimentação financeira da comissão, o ex-deputado e prefeito eleito de Curitiba, Gustavo Fruet (PDT), disse, em entrevista à Gazeta do Povo em julho, que "não se auditou 5% dos dados que chegaram à CPI". Segundo Fruet, foram encaminhados à CPI mais de 30 milhões de ligações, além de 6 milhões de registros bancários referentes à movimentação de aproximadamente R$ 1 trilhão.

"Unha e carne" do ex-presidente é o pivô da denúncia de ValérioAgência Estado

"Faz-tudo", "unha e carne" e "pau para toda obra" de Lula, o ex-segurança Freud Godoy (foto) pode ser o pivô de uma possível abertura de investigação da participação do ex-presidente no mensalão. O ex-assessor, que já foi notícia em 2006, ao ser envolvido no caso do dossiê dos aloprados, voltou a ser personagem de suspeita de irregularidade. Na semana que passou, foi revelado que o operador do mensalão, o publicitário Marcos Valério afirmou em depoimento ao Ministério Público Federal ter dado cerca de R$ 100 mil do esquema a Freud para que fossem pagas despesas pessoais do ex-presidente. Freud e Lula negam.

Freud entrou para o PT em 1981. No partido, não participava das discussões políticas e trabalhava como segurança. Logo, começou a fazer as campanhas presidenciais de Lula. Freud viajava com o então candidato petista pelo país no papel de controlar o assédio ao chefe. Acabaram tornando-se amigos.

A relação pessoal com Lula o levou para o Palácio do Planalto em 2003. Lá ganhou o cargo de assessor especial da secretaria particular presidencial. Morou com o ex-presidente e com Marisa na residência oficial nos primeiros meses do primeiro governo Lula. Foi nessa época, segundo Valério, que houve o repasse de dinheiro para Freud pagar despesas pessoais de Lula.

O segurança logo passou a organizar as peladas que Lula jogava com políticos e ministros na Granja do Torto. Também era ele quem planejava as festas juninas do Torto. Praticamente da família, passeava com os filhos de Lula e Marisa e frequentava o apartamento do ex-presidente em São Bernardo do Campo (SP).

Escândalo

A amizade entre Lula e Freud estremeceu em 2006, quando o ex-agente da Polícia Federal Gedimar Passos afirmou em depoimento à PF que, a mando de Freud, tentou comprar por R$ 1,75 milhão suposto dossiê contra o ex-ministro da Saúde e então candidato a governador de São Paulo José Serra (PSDB). A papelada teria informações sobre o envolvimento do tucano na venda de ambulâncias superfaturadas.

À época, o então ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos entrou em campo para tentar evitar que a polêmica chegasse ao presidente. Indicou, inclusive, um advogado para Freud. O ex-segurança sustentou que não tinha a ver com o escândalo e que possuía meios de provar sua inocência. Apesar da calma que procurava aparentar, teve de ser acalmado por integrantes da direção do PT para não dar declarações que pudessem trazer desgaste político ao partido e a seus dirigentes.

À Polícia Federal, Freud confirmou que estivera por quatro vezes com Gedimar, mas negou qualquer envolvimento com a tentativa de compra do dossiê. Gedimar depois voltou atrás das declarações iniciais e inocentou o ex-assessor presidencial. Freud não foi indiciado pela PF.

Empresa

Como parte da operação de contenção de danos do "escândalo dos aloprados", Freud voltou para São Paulo. Abatido pelas denúncias, passou a atuar na empresa de segurança privada da sua família, a Caso.

Hoje, a empresa tem cerca de 70 funcionários e presta serviços para diversos clientes. Um dos principais é justamente o PT, de quem recebeu até o ano passado mais de R$ 1 milhão. Também trabalha para o Sindicato dos Bancários e para o deputado Ricardo Berzoini (PT), fazendo a segurança de seus escritórios. Até há pouco, tinha como cliente a Bancoop, cooperativa habitacional do sindicato, da qual recebeu, entre 2005 e 2006, R$ 1,5 milhão.

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