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Interatividade

Os órgãos públicos cumprirão com a obrigação de fornecer os dados aos cidadãos? Por quê?

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Em 15 dias, a Lei de Acesso à Informação entra em vigor. Isso significa que a partir de 16 de maio todo cidadão brasileiro passará a ter o direito de requisitar quaisquer informações não sigilosas de órgãos governamentais. Trata-se de um passo importante no caminho da transparência e da governança aberta. A Gazeta do Povo conversou com o jornalista especializado em transparência e combate à corrupção Fabiano Angélico para avaliar quais as perspectivas da implantação da lei.

Para Angélico, os órgãos públicos devem ter dificuldades, em um primeiro momento, para aplicar a lei. "Vai ser necessário um trabalho dos órgãos públicos para se organizarem no sentido de montar uma estrutura adequada de atendimento à população", afirma. Entretanto, ele vê a aplicação lei, que acontece em paralelo com a instalação da Comissão da Verdade, como importante para a história do Brasil. "Acredito que, depois da Constituição Federal, esse é o momento mais importante da jovem democracia brasileira."

É possível prever o impacto que a Lei de Acesso à Informação vai ter no Brasil?

Ainda é um pouco cedo para prever. A depender do desenvolvimento das coisas, da atuação da sociedade civil, principalmente, ela vai ter maior ou menor impacto.

Os órgãos públicos já estão preparados?

Não. Alguns órgãos do plano federal estão trabalhando um pouco melhor, aproveitaram os últimos cinco meses desde que a lei foi sancionada e se preparam. Alguns ministérios inclusive já montaram um departamento de serviço ao cidadão, de prestação de informações. No plano federal, alguma coisa está sendo feita, mas, mesmo assim eles não estarão prontos no dia 16 de maio. E por que não?

Porque não há organização interna. Durante muito tempo essa questão de acesso à informação foi negligenciada. Vai ser necessário um trabalho dos órgãos públicos para se organizarem no sentido de montar uma estrutura adequada de atendimento à população e organizar internamente o registro da informação, a catalogação, para que, quando o cidadão pedir uma informação, o funcionário público que o atender possa encontrá-la mais facilmente.

Além da Lei de Acesso à Informação, foi sancionada pela presidente Dilma em novembro a criação da Comissão da Verdade. Como esses dois fatos se complementam?

Acredito que, depois da Constituição Federal, esse é o momento mais importante da jovem democracia brasileira. A comissão restabelece o direito à verdade, o direito a fatos históricos que ficaram nebulosos. Para qualquer democracia mais forte, conhecer bem o passado é fundamental, para não cometer erros similares no futuro e se desenvolver com mais equidade, com mais humanismo e menos beligerância. Ao mesmo tempo, a Lei de Acesso à Informação acaba com o sigilo de documentos. Com as duas leis, nós podemos entender melhor o nosso passado e também o nosso presente.

A lei permite sigilo por 25 anos em casos de segurança da sociedade e do Estado. Há um risco de se criar uma "cultura do sigilo" para esconder documentos atuais sob o pretexto de proteger a população?

Não há o risco de se criar essa cultura: já existe a cultura do sigilo. Aliás, isso tem acontecido em todos os países que já têm lei de acesso à informação há algum tempo. Quando o governo quer esconder alguma coisa da população, ele arruma subterfúgios, fala que aquela informação, se divulgada, pode colocar em risco as pessoas, a segurança do país.

É previsível, então, que isso aconteça aqui no Brasil?

Não tenho dúvidas que isso vai acontecer aqui, mas cabe à sociedade brigar pelo direito à informação. Quando houver evidências de que o interesse público envolvendo aquela informação é muito maior que qualquer risco à segurança, é preciso que a gente vá até o fim, porque nós temos direito àquela informação, ainda que isso seja uma disputa que venha a ser travada no Judiciário e vá até o Supremo [Tribunal Federal].

Não seria melhor, que essa previsão não existisse?

Que precisa haver um mecanismo na lei, precisa. Não dá pra gente imaginar que toda e qualquer informação deva ser sempre tornada pública imediatamente. De fato, algumas informações podem colocar em risco a vida das pessoas. Toda lei de acesso à informação tem essa salvaguarda, não há problema nisso. O importante é que a gente tenha certeza de que isso vai ser uma exceção.

O envolvimento da sociedade nessa questão é importante, já que pouco adianta as informações estarem disponíveis e ninguém pedir por elas. Existe aqui no Brasil essa disposição da sociedade de ir atrás da informação? Há algum movimento dos cidadãos brasileiros nessa direção?

Existe sim um movimento, mas ainda é muito pequeno, infelizmente. Em geral, as pessoas que se interessam por informação governamental têm um interesse profissional ou ideológico nisso. As pessoas em geral estão interessadas em resultados, não em procedimentos ou em informações primárias. Em nenhum lugar no mundo esse é um tema ultrapopular.

É possível mudar esse cenário no Brasil?

Ainda é muito pequeno o grupo de pessoas que conhecem a Lei de Acesso à Informação, que sabem da importância dela. E nesse ponto a mídia tem um papel fundamental.

A secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, disse recentemente que a presidente Dilma Rousseff é um exemplo na luta pela transparência. É uma análise precisa ou apenas uma cortesia?

De fato, aos olhos do mundo, o governo atual tem feito algumas coisas em prol da transparência. A própria sanção da Lei de Acesso à Informação é um exemplo. O governo Fernando Henrique assinou um decreto estabelecendo sigilo eterno de documentos; ou seja, foi contra a transparência. O ex-presidente Lula foi a mesma coisa, prometeu que ia aprovar uma lei de acesso à informação, mas a lei não foi sancionada. No primeiro ano do governo Dilma a Lei de Acesso à Informação saiu do papel. O Brasil começou a liderar essa iniciativa de governo aberto junto com os Estados Unidos. Então, existe, aos olhos do mundo, a percepção de que o Brasil recentemente tem feito mais pela transparência e de que a presidente Dilma tem alguma coisa com isso.

Colaborou Katna Baran, especial para a Gazeta do Povo.

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