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Porto de Paranaguá: controle não é proporcional às riquezas movimentadas | Albari Rosa / Gazeta do Povo
Porto de Paranaguá: controle não é proporcional às riquezas movimentadas| Foto: Albari Rosa / Gazeta do Povo

Atuação

Antaq já pediu federalização, que foi negada

Não é de hoje que operadores portuários ou exportadores falam de deficiências graves na administração do Porto de Paranaguá. Nos últimos anos, o Tribunal de Contas da União (TCU) fez pelo menos três relatórios em que aponta falhas de gestão do porto, principalmente relacionadas à conservação da estrutura portuária, uma vez que o porto é patrimônio da União, concedido ao governo do Paraná até 2027.

Os relatórios embasaram um pedido da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) em 2005 para intervenção federal no porto paranaense, o qual foi negado pelo Ministério dos Transportes na época.

O relatório do TCU é detalhista e aponta várias irregularidades, como a não utilização do dinheiro em caixa para promover as melhorias necessárias à infraestrutura portuária. Em outubro do ano passado, o ex-superintendente Eduardo Requião foi multado em R$ 15 mil por grave infração de natureza operacional.

A falta de dragagem começa a ser sanada hoje, com obras no porto. As deficiências, entretanto, já custaram caro à economia paranaense. Paranaguá perdeu o posto que historicamente ocupava na movimentação de cargas brasileiras, conforme reportagem publicada ontem no caderno de Economia da Gazeta do Povo (atalho para a reportagem: http://migre.me/3MiUv). (HC)

Testemunha

Ex-diretor diz que se sente "vangloriado"

A maior parte dos cidadãos paranaenses que tomou conhecimento da Operação Dallas deve ter se decepcionado, mais uma vez, com a ineficácia do poder público. Mas houve uma pessoa que se alegrou com o episódio: Leopoldo de Castro Campos, engenheiro de carreira do Departamento de Estradas e Rodagens (DER) com mais de 30 anos de experiência na administração pública ligada ao setor de transporte e logística. "Hoje eu estou vangloriado porque a Justiça está sendo feita", resumiu.

Campos era diretor técnico do Porto de Paranaguá em 2007. Chegou ao cargo por indicação do próprio governador na época Roberto Requião (PMDB). "O porto era um caos", lembra. Ele diz que encontrou várias irregularidades, como problemas em licitações e distribuição de propinas. "Grande parte dos projetos vinham de fora, vinham prontos."

O diretor, então, preparou um dossiê das deficiências e entregou a Requião. No dia seguinte foi demitido. "Fui perseguido, tentaram me desqualificar. Até com arma me ameaçaram, dizendo que era para ter cuidado com o que eu iria falar", conta. Mesmo assim, levou o dossiê a PF e ao Ministério Público. O MP informou que abriu cinco inquéritos que ainda estão em investigação.

Até hoje, Campos diz que não se recuperou e que continua escanteado da estrutura governamental. Mas se diz contente.

"Minha família não entendia nada [na época]. Perguntavam: o que aconteceu com meu pai? Fiquei marginalizado na minha profissão. Hoje eu sobrevivo com empréstimos, mas me orgulho disso", declarou emocionado. (HC)

Quem exerce a função de superintendente da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa) pode ter a certeza de que sua gestão enfrentará pouca ou nenhuma fiscalização. Apesar de toda riqueza gerada pelo terminal – o porto movimenta cerca de 30 milhões de toneladas de produtos por ano, tem em caixa uma reserva de aproximadamente R$ 130 milhões, arrecada em torno de R$ 17,5 milhões por mês, emprega cerca de 500 pessoas diretamente e tem outros 4 mil trabalhadores avulsos – a estrutura de vigilância administrativa é deficiente e inoperante.

Segundo especialistas, a solução para reverter esse quadro é fazer o Conselho de Autoridade Portuária (CAP) exercer seu papel fiscalizador – hoje restrito ao papel – e melhorar o acompanhamento do Tribunal de Contas (TC) do Paraná.

Sem isso, os administradores estaduais e a população paranaense não estão livres de encararem novamente escândalos de corrupção como os investigados pela operação Dallas da Polícia Federal (PF), deflagrada no dia 20 de janeiro, quando dez pessoas foram presas acusadas de participar de grupos estruturados para desviar cargas e fraudar licitações. Dois ex-superintendentes são citados nos relatórios da PF e do Ministério Público Federal (MPF): Eduardo Requião e Daniel Lúcio Oliveira de Souza.

Segundo os documentos obtidos com exclusividade pela Gazeta do Povo, o primeiro deles (que não foi preso), é apontado como principal beneficiado de um suposto esquema de propina montado para desviar US$ 5 milhões na compra de uma draga para o porto e o segundo como o principal articulador para favorecer empresas supostamente ligadas a ele, contratadas para realizar estudos ambientais. Dos dez presos, Souza é o único que permanece detido. A Justiça acatou o pedido de prisão provisória, com o argumento de que ele ainda poderia atrapalhar as investigações.

Para o ex-comandante da Marinha Mercante e especialista em Direito Marítimo e da Atividade Portuária, Wesley Collyer, é preciso que o CAP seja uma espécie de conselho revisor das decisões da direção do porto. Segundo ele, o artigo 30 da Lei n.º 8.630/93 já prevê isso. "O CAP é uma espécie de legislativo e de tribunal de contas [no porto] porque ele pode entrar e fiscalizar qualquer área", garante.

Porém, não é o que pensa o atual presidente do CAP em Paranaguá, Antonio Alfredo Matthiesen, indicado para o cargo pela Secretaria Especial de Portos. "O conselho não tem fins de apuração [de denúncias]. Isso é para a polícia e para a Receita Federal", afirma. Segundo ele, o conselho não é nem procurado quando existe alguma desconfiança da gestão portuária. "Em um ano, não recebi nenhum tipo de denúncia."

O CAP tem hoje 16 pessoas com direito a voto, que são representantes do poder público, dos operadores, dos trabalhadores e dos usuários. Collyer, autor do livro "Lei dos Portos – o Conselho de Autoridade Portuária e a Busca da Eficiência", critica ainda as indicações políticas de pessoas sem qualificação para a administração dos portos e para os conselhos. Opinião compartilhada pelo advogado e professor de Direito Marítimo e Portuário na Universidade do Vale do Itajaí (Univali), Osvaldo Agripino de Castro Jr. "A maior parte dos conselheiros olha somente para seu umbigo", diz.

Outro órgão que teria responsabilidade para evitar fraudes na Appa é o TC. Entretanto, o órgão trabalha por amostragem. Ou seja, o inspetor de Controle Externo responsável por acompanhar as decisões administrativas do porto sorteia alguns procedimentos para verificar a legalidade e, portanto, nem todas as licitações, contratos e pagamentos são auditados.

O TC informou que o único que poderia comentar os procedimentos de fiscalização seria o presidente do órgão, o conselheiro Fernando Guimarães, mas ele passou por uma cirurgia no ombro recentemente e está de licença médica. Na quinta-feira passada, o conselheiro Nestor Batista afirmou que fiscalizar fraudes em licitação "é um problema de polícia, não do Tribunal de Contas."

Desvio de conduta

O atual superintendente da Appa, Airton Vidal Maron, disse, em entrevista por e-mail, que é difícil evitar fraudes como as detectadas pela PF, porque elas são "frutos de desvio de conduta" e não de falhas de fiscalização. "Existem mecanismos internos de fiscalização que atendem a legislação em vigor. No entanto, desvios de conduta de pessoas infelizmente acontecem. As falhas que porventura aconteceram foram causadas por desvios de conduta que, como já disse, são imprevisíveis."

O secretário especial de Controle Interno do Governo do Paraná, Mauro Munhoz, acredita, porém, que o sistema de fiscalização do porto pode ser melhorado. Ele iniciou a criação, junto com a Celepar, de um software de fiscalização com o qual pretende monitar as licitações e contratos de todas as secretarias e autarquias ligadas ao governo estadual, como é o caso da Appa. "Até hoje não temos uma capacidade concreta (de fiscalização). O controle interno existe só no papel." A expectativa dele é que o programa entre em operação no segundo semestre.

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