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Curitiba – A transposição do Rio São Francisco, defendida com veemência pelo governo Lula, parece uma discussão recente. Mas não é. A idéia de utilizar as águas do rio para amenizar os efeitos das secas no Nordeste tem mais de um século. Em 1880, após a grande seca que matou 1,7 milhão de pessoas, os engenheiros de D. Pedro II projetaram um canal que interligaria o Rio São Francisco ao Jaguaribe, no Ceará. A transposição do rio voltou a ser discutida diversas vezes ao longo da história brasileira. E sempre gerou polêmica.

Desta vez não é diferente. O governo, enfraquecido pela crise política, enfrenta a resistência de grupos contrários ao seu projeto de transposição. A situação se agravou depois que um bispo franciscano, dom Luiz Flávio Cappio, ficou 11 dias em greve de fome em troca da revogação do projeto. A polêmica ganhou proporções internacionais, com espaço em jornais como o argentino Clarín e o francês Le Monde.

Para alívio do governo, tudo terminou bem na quinta-feira. Dom Luiz, 59 anos, bispo de Barra (BA), aceitou a proposta de prolongar o diálogo sobre o projeto, e voltou a se alimentar. Cappio recebeu a visita do ministro de Relações Institucionais, Jaques Wagner, enviado de Lula a Cabrobó (PE). O acordo vai custar ao governo atrasos no cronograma.

O local do protesto do frei Cappio foi escolhido criteriosamente. Cabrobó é o local onde as obras da transposição vão começar. No mesmo dia em que Cappio pôs fim à greve de fome, a Justiça Federal da Bahia suspendeu, por meio de uma liminar, o processo da licença ambiental em tramitação no Ibama, única pendência para o ínicio das obras.

As obras

A construção dos mais de 700 quilômetros de canais de concreto, e de 24 reservatórios na caatinga, foi dividida pelo Ministério da Integração em 14 lotes. Com processos de licitação em curso, o Ministério entregou os dois primeiros lotes, justamente nos trechos iniciais dos Eixos Norte e Leste (ver infográfico) ao Exército, que executará a obra por R$ 92 milhões.

A briga política

Durante a semana, e com o protesto do frei Cappio tomando força, o projeto do governo entrou para a seara política. Durante a missa rezada pelo bispo, na terça-feira – dia de São Francisco e aniversário do frei –, que reuniu 2,5 mil pessoas, políticos de oposição aproveitaram para criticar o projeto. O deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ) declarou que o projeto do governo tem motivação eleitoreira. Gabeira, que já integrou os quadros do PT, lembrou ainda que o programa do partido apresentado na campanha de 2002 era contra a transposição e a favor da revitalização.

O ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, rebateu as acusações. "O projeto de tranposição não existe. O que existe é um projeto de integração de bacias, que não começou. O que começou foi o programa de revitalização do São Francisco, que foca principalmente no saneamento básico das cidades da bacia do rio", disse o ministro.

A briga ambiental

Entidades ambientais, movimentos sociais e ligados à igreja alegam que uma obra do porte da apresentada pelo governo pode trazer mais problemas do que benefícios. A primeira preocupação é com a população ribeirinha: 750 famílias terão as suas casas desapropriadas.

O segundo temor é que a água chegue a grupos mais privilegiados e não resolva o real problema do sertão, a seca e a pobreza. Segundo a Frente Nacional em Defesa do Rio São Francisco, os possíveis beneficiados pelo projeto não seriam mais do que 0,28% de toda a população do Semi-Árido.

Outro ponto de contestação ao projeto refere-se à vazão do rio. Pela proposta do governo, o Rio São Francisco doaria até 65 metros cúbicos por segundo (m3/s) de vazão aos açudes e pequenos rios da região, equivalente a 30 vezes menos do que a vazão no local de captação. Mas entidades ambientais, como a ONG Projeto Manuelzão, alegam que o rio não suportaria a captação, e questionam o fato de o governo não usar uma parte do dinheiro para resolver problemas antigos, como o assoreamento, avançado em alguns trechos.

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