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O assassinato do menino Bernardo, de 11 anos, sendo suspeitos o pai, a madrasta e uma amiga desta. Como entender? Uma médica, que era contra o namoro do filho, atira e mata o casal e, ao final, suicida-se. O policial, com história passada de certo grau de alterações de comportamento, que mata a namorada em plena rua de Curitiba, tentando contra sua própria vida, logo após. O cineasta Eduardo Coutinho, atacado e morto a facadas pelo filho, enquanto a sua esposa é ferida no mesmo incidente. Episódio similar da professora da UFPR do litoral, morta pelo filho, tido como esquizofrênico e tendo agido num momento de crise, enquanto a mãe tentava medicá-lo...

Certamente esses fatos e cenas nos atordoam. O que eles têm em comum, no que se diferenciam e a que reflexões nos levam? Não seria exagero afirmar que, ultimamente, convivemos e testemunhamos uma crescente de crimes com características atrozes e perversas, de difícil absorção por nossas mentes "normais".

Como instrumento do direito, a medicina legal elenca situações que determinam os fatos acima descritos e é capaz de classificar comportamentos de indivíduos envolvidos em crimes e a capacidade destes de julgar seus atos. Todos esses acontecimentos nos remetem à capacidade que tem o ser humano de agir contra seu semelhante. Não por acaso, entre as dez proibições que, desde Moisés, fazem parte de nossa consciência civilizatória, está a condenação a esses atos no "Não matarás" bíblico, fundamentação a todas as legislações do mundo ocidental. Dito isso, podemos afirmar que todas as situações descritas representam claras desobediências a esse mandamento. Em todos os casos, somos testemunhas de vidas perdidas, fato que, por si só, representa o resultado de atitudes que, em princípio, temos a clara e compreensível propensão a condenar e rejeitar. Exceto em situações excepcionais como a guerra, somos culturalmente tendentes a refutar qualquer forma de extermínio.

Mesmo considerando as manifestações impulsivas em situações de erupção de sentimentos de extrema raiva, decepção e ideias de vingança, com "eu te mato" ou similares, entendemos essas como passageiras e não chegando às vias de fato. Enfim, considerando-se as diferentes circunstâncias, todos os fatos descritos redundam em perda inaceitável, fútil e não raramente atroz de vidas.

Mas a medicina, em especial o estudo da mente – a psiquiatria – e o estudo da participação desta em atos que redundam em muitas das situações citadas nos apontam para fatos que permitem diferenciar, entre os autores, aqueles responsáveis e os incapazes de responder pelos seus atos. É o que a medicina psiquiátrica e o direito chamam de juízo crítico e capacidade de julgamento, referindo-se à necessária capacidade do indivíduo em reconhecer a natureza criminosa de seus atos. Ao leigo parecerá estranho imaginar que, consciente do caráter maldoso de um ato, seja uma pessoa, mesmo assim, propensa a realizá-lo.

No entanto, é exatamente o que acontece com os delinquentes, assassinos e criminosos dos mais variados tipos. E é nesse preciso contexto que é possível diferenciar os casos citados. Na medida em que o autor seja incapaz de diferenciar entre o bem e o mal – outra forma de descrever o juízo crítico e a capacidade de julgamento – poderá ser julgado inimputável, ou seja, não responsável por seus atos. Um dos responsáveis por mortes já citado, por exemplo, dava a entender que o fez sob a influência de vozes que o levaram a agir, conhecida como alucinações. Esses são doentes dos mais variados tipos, e não necessariamente esquizofrênicos como se tem tendência a "diagnosticar", que assim serão julgados e encaminhados a tratamento ao qual deveria, há variados períodos de tempo, estar submetidos. O que, possivelmente, evitaria o que agora só podemos entender como consequências. São, porém, menos frequentes.

São mais comuns, porém, e lotam nossas delegacias, prisões e penitenciárias os que se julgam no direito de agir não conforme a sociedade, por meio de suas normativas e leis, espera, mas de acordo com seus próprios princípios, independentemente do que representem para o próximo. Como já visto, esses são os autores das mais variadas infrações representando a própria incapacidade de viver em sociedade, exigindo, portanto, afastamento dela.

Para colaborar na solução de casos complexos como esses, a medicina, através de estudos em profundidade, principalmente o estudo do passado existencial e comportamental dos envolvidos nesses casos, parte do princípio de que nós somos o que a nossa genética, em interação com o nosso meio ambiente, nos faz e estabelece o que somos e como agimos. Cada um desses aspectos é individual e produto dessa somatória.

Estudando cada caso, a tendência é encontrar, no mesmo indivíduo, transgressões dos mais variados tipos, e esses aspectos todos explicam por que, após longos períodos isolados, se mostram incapazes de aprender, voltando a reincidir.

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