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Ficha técnica

Natural de: Ruy Barbosa (BA)

Currículo: ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), mestre em direito pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e graduado pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC). Foi juiz e desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (Bahia)

Jurista que admira: José Martins Catharino

Leu recentemente: O homem que amava os cachorros, de Leonardo Padura; Operação Banqueiro, de Rubens Valente

Nas horas vagas: gosta de correr na praia

Depois de um ano como ministro do TST, Claudio Masca­renhas Bran­dão já percebeu que a realidade brasileira é distinta em cada canto do país. Por isso, defende que flexibilizar a legislação não deve levar à extinção de direitos trabalhistas. Segundo Brandão, falta também consciência ao empregador quanto à importância da prevenção dos acidentes de trabalho. Em entrevista concedida ao Justiça & Direito durante passagem por Curitiba para seminário sobre saúde do trabalho, o ministro ainda analisou as mudanças recentes no processo do trabalho e o futuro julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre terceirização. No seu discurso de posse, o senhor mencionou que era necessária uma revisão das normas trabalhistas. Como ela deve ser?

Todos concordam que a CLT precisa ser revista. A grande discussão é que tipo de revisão se quer fazer. Excluir algumas normas que perderam aplicação do ponto de vista atual, com a modernização do trabalho ou por tratar de temas que não se encontram mais na realidade brasileira. Mas nunca se pode pensar em afastar a disciplina do trabalho humano, que deve sempre estar regulada em lei. Ainda se constata que em alguns lugares a realidade é o trabalho sem regulamentação, uma exploração do trabalho humano sem compromisso com direitos básicos. Reforma não é excluir a proteção do Estado. Ao contrário, dar efetividade diante das modernas tecnologias e do descumprimento reiterado de normas. O senhor concorda com a flexibilização das normas trabalhistas?

É preciso ter uma compreensão do que é flexibilizar. Nunca pode parecer algo semelhante à precarização de direitos. Não se pode fazer uma correspondência entre flexibilização e desregulamentação e menos ainda com precarização. O termo flexibilização é associado à ideia de que o Estado deve se afastar da regência da relação laboral e deixar que os atores sociais se autorregulamentem. Isso é um equívoco, porque o Brasil não tem proteção ao emprego. Se flexibilizar for ir além da proteção mínima e discutir novas formas de proteção do contrato de trabalho, eu poderia dizer que sou favorável. Mas nunca retirando esse mínimo de proteção que jamais pode ser flexibilizado, pois seria condenar o trabalhador a um processo de regulamentação para o qual ele não dispõe de força suficiente. O Brasil ainda tem índices altos de acidente de trabalho. Por que esses números não conseguem ser diminuídos?

Ainda falta uma consciência de que o homem é a peça mais importante na engrenagem do trabalho. O homem não pode ser visto como mero instrumento de produção. Além disso, ainda há uma falsa impressão de que a prevenção custa muito e por isso é barato pagar eventual prejuízo. Mas não há preço para a vida humana. Lamento que ainda ocorram tantos acidentes e que falte visão preventiva. Falta amadurecimento do mundo empresarial sobre a importância do homem. O Brasil convive com um parque tecnológico enorme e com trabalho precarizante. A produtividade leva a ritmos alucinantes. Prevenir deve ser a meta principal a ser observada. Como a nova Lei 13.015/14 afetará o trabalho do TST?

O cenário atual sofrerá um impacto considerável, porque os tribunais ficarão como instâncias definitivas das questões locais, e o TST exercerá com mais intensidade o papel de instância revisora e estabilizadora do direito nacional. Nas questões regionais, a lei fortalece os TRTs e soluciona as divergências internas nos tribunais. As turmas de um TRT julgam diferentemente e causam para o jurisdicionado local uma grande insegurança porque, a depender da turma, o direito pode ser interpretado de maneira "a" ou "b". Isso levava para o TST um papel que não é dele, pois ele nunca foi pensado para estabilizar a interpretação do direito local nem para resolver divergências internas de TRTs. O STF reconheceu a repercussão geral e julgará recurso extraordinário sobre terceirização. Ele deve manter a posição do TST?

Espero muito que o STF estabeleça que o artigo 170 da Constituição Federal não sofre violação. A posição do TST de considerar ilegal a terceirização da atividade-fim não viola a liberdade de contratação. Porque a própria Constituição, quando estabelece a liberdade da atividade econômica, define alguns princípios, entre eles o valor social do trabalho e a função social da empresa. Por isso gostaria que o STF chancelasse essa tese. Admitir a possibilidade de que venha a ser autorizada terceirização em qualquer atividade é condenar o trabalhador à precarização. Fragmentará o movimento social, segmentará as categorias profissionais, enfraquecerá a atividade sindical. Vejo precarização do trabalho também no Projeto de Lei 4.330, que permite terceirização, quarteirização e subcontratação sem limites em qualquer atividade. A atual regulamentação do TST sobre o assunto é adequada?

A súmula 331 do TST é muito criticada por representantes do movimento sindical por entender que ela legitimou a terceirização na atividade-meio, que nem deveria existir. Mas, se estamos ruim com ela para alguns, muito pior sem ela. O TST estabeleceu pelo menos um balizamento de que a atividade periférica especializada possa ser terceirizada. O que se vê no Brasil hoje é que a terceirização de atividade especializada, com formação de conhecimento profissional direcionado e específico, ruiu por terra. Hoje terceiriza-se mão de obra em geral. As empresas de mão de obra não são especialistas em determinado segmento econômico. São especialistas em "fornecer mão de obra", a tal ponto que se encontram empresas com as mais variadas atividades envolvidas. É um mercado expressivo que não pode ficar sem a regulação do Estado. Os tribunais pelo país têm reclamado da adoção compulsória do PJe. Como o senhor enxerga essa situação?

Como toda realidade que se pretenda implantar num país continental como o Brasil e que importe em uma mudança cultural significativa, a implantação é um processo desgastante. O PJe contribuirá em muito para a efetividade e o aperfeiçoamento do Judiciário brasileiro. As premissas sobre os quais ele é calcado, de deixar para o sistema as atividades manuais, suprimir etapas, rever o modo de proceder, são a grande contribuição. O processo eletrônico não é apenas transportar a burocracia para a internet. Isso é muito pouco. Ele suprime etapas, aperfeiçoa rotinas, leva automatização para aquele ato processual, o que não é pouco. Ele muda a relação do advogado com a justiça, porque pode ser acessado de qualquer lugar. As críticas eu vejo com naturalidade e abstraio aquelas oriundas de fontes que nem sequer conhecem o PJe. A crítica é legítima e aperfeiçoa o projeto. A inclusão digital é um elemento para proporcionar ao cidadão acesso à Justiça. É uma revolução silenciosa que está sendo feita no Brasil, com passos lentos mas firmes.

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