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| Foto: Ilustração: Felipe Lima

Lentidão

Proposta de Emenda à Constituição tenta acelerar forma de tramitação

Hoje tramita na Câmara dos Deputados a PEC 70/11, que deve complementar as mudanças iniciadas pela Emenda 32 (Leia mais no quadro ao lado). Uma comissão especial analisa a matéria que, se aprovada, deve ser votada em dois turnos pela Câmara para só então ser promulgada. No início de maio o deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ), relator da comissão, pediu prorrogação do prazo por mais 20 sessões. A expectativa é que ela seja votada ainda neste ano.

Contrabando

A proposta também contempla as "emendas de contrabando" incluídas nas MPs, embora a prática já seja contrária à Lei Complementar 95, de 26 de fevereiro de 1998. Nela, os incisos I e II do artigo 7º já estabelecem que "cada lei tratará de um único objeto" e "não conterá matéria estranha a seu objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão".

A MP 627/13, por exemplo, recebeu ao todo 516 propostas de emenda. O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), relator da comissão mista que realizou a análise prévia, recomendou o acolhimento integral de 33 e parcial de 26 delas. Muitas com matérias alheias ao objeto original da medida, como a já citada anistia às operadoras dos planos de saúde.

Para realizar esse tipo de manobra, os deputados se apoiam no artigo 18 da mesma lei complementar 95, que afirma que "eventual inexatidão formal de norma elaborada mediante processo legislativo regular não constitui escusa válida para o seu descumprimento".

A prática de inserir penduricalhos legislativos em medidas provisórias ganhou mais um capítulo durante a aprovação da MP 627/13 na Câmara dos Deputados, no mês passado. A emenda "jabuti" da vez foi a previsão de teto para as multas aplicadas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) às operadoras de planos de saúde. O objetivo original da MP editada pelo Executivo tratava de regras de tributação de subsidiárias de empresas brasileiras no exterior.

INFOGRÁFICO: Veja quantas MPs cada presidente editou desde a redemocratização do Brasil

A MP foi sancionada com vetos – entre eles a emenda da anistia aos planos de saúde – pela presidente Dilma Rousseff no prazo final para a decisão, mas a discussão permanece já que o caso não é exceção. A inclusão de matérias estranhas ao objeto de MPs – em geral através do relator do projeto na Câmara dos Deputados – levanta algumas questões sobre o aperfeiçoamento de todo o sistema de edição e tramitação dessa norma legislativa, criada na Constituição de 1988 para ser editada apenas em casos de relevância e urgência.

José Sarney, o primeiro presidente que pôde valer-se das MPs, editou em média sete delas por mês, durante os 17 meses de governo pós-constituinte. Os presidentes seguintes não fizeram diferente e editaram três ou mais medidas provisórias a cada 30 dias de governo, menos Fernando Collor de Mello, que editou 2,87 ao mês.

A voracidade do Executivo em legislar através das MPs é tema de embate constante entre os dois Poderes. Embora o artigo 62 da Constituição afirme que "em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional", senadores e deputados reclamam da banalização histórica do uso da norma pelos presidentes da República.

Reformas

Aprovada em 2001, a Emenda 32 alterou o processo legislativo e as regras de criação das MPs, com o objetivo de diminuir o uso desse poder pelo Executivo. Entre outras mudanças, a alteração constitucional proibiu a reedição ilimitada das medidas provisórias e definiu que, após perderem a validade, elas trancariam a pauta do Congresso enquanto não fossem votadas.

"Antes dessa emenda, o governo FHC editava sucessivas medidas provisórias, já não existia um limite máximo de reedição. Havia MPs que eram reeditadas 70 a 80 vezes. A Emenda 32 já veio para limitar o poder do chefe do Executivo com relação às MPs", afirma o professor da Unicuritiba Luiz Gustavo de Andrade, especialista em direito constitucional e eleitoral.

Iniciativa tímida e Congresso omisso

A tentativa de restrição à liberdade de atuação do Executivo por meio de medidas provisórias ainda é considerada tímida por especialistas. O professor da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e diretor do Instituto Brasileiro de Estudos Constitucionais, Dimitri Dimoulis, explica que, apesar de alterar os prazos, a Presidência da República pode continuar editando MPs. "O procedimento pode até ficar mais rápido, mas não muda muita coisa. É como se tivéssemos uma parede toda suja e nós pintássemos apenas um quadradinho dela. É melhor? É, mas a sujeira continua lá", diz.

Contudo Dimoulis não considera a MP como algo ruim, mas sim necessário. "Se você for ver a lentidão do Legislativo e a urgência do Executivo, as MPs se fazem absolutamente necessárias. Eu não acredito que deveríamos tirar ou restringir as MPs. Eu diria que seria necessário o Legislativo ter maior agilidade de apreciação de textos", afirma.

O professor da Unicuritiba Luiz Gustavo de Andrade engrossa o coro que diz que o Congresso é lento e se deixa atrofiar. "Ao invés de o Legislativo tomar a frente e começar a rejeitar medidas provisórias que não apresentam os princípios de relevância e urgência, ele se sujeita à imposição que vem do Executivo. Hoje os parlamentares acabam se tornando sancionadores de atos legislativos que emanam do Poder errado", diz.

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