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DANOS MATERIAIS. PROMOÇÃO PUBLICITÁRIA DE SUPERMERCADO. SORTEIO DE CASA. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE.

A Turma, ao acolher os embargos de declaração com efeitos modificativos, deu provimento ao agravo e, de logo, julgou parcialmente provido o recurso especial para condenar o recorrido (supermercado) ao pagamento de danos materiais à recorrente (consumidora), em razão da perda de uma chance, uma vez que não lhe foi oportunizada a participação em um segundo sorteio de uma promoção publicitária veiculada pelo estabelecimento comercial no qual concorreria ao recebimento de uma casa. Na espécie, a promoção publicitária do supermercado oferecia aos concorrentes novecentos vales-compras de R$ 100,00 e trinta casas. A recorrente foi sorteada e, ao buscar seu prêmio – o vale-compra –, teve conhecimento de que, segundo o regulamento, as casas seriam sorteadas àqueles que tivessem sido premiados com os novecentos vales-compras. Ocorre que o segundo sorteio já tinha sido realizado sem a sua participação, tendo sido as trinta casas sorteadas entre os demais participantes. De início, afastou a Min. Relatora a reparação por dano moral sob o entendimento de que não houve publicidade enganosa. Segundo afirmou, estava claro no bilhete do sorteio que seriam sorteados 930 ganhadores – novecentos receberiam vales-compra no valor de R$ 100,00 e outros trinta, casas na importância de R$ 40.000,00, a ser depositado em caderneta de poupança. Por sua vez, reputou devido o ressarcimento pelo dano material, caracterizado pela perda da chance da recorrente de concorrer entre os novecentos participantes a uma das trinta casas em disputa. O acórdão reconheceu o fato incontroverso de que a recorrente não foi comunicada pelos promotores do evento e sequer recebeu o bilhete para participar do segundo sorteio, portanto ficou impedida de concorrer, efetivamente, a uma das trinta casas. Conclui-se, assim, que a reparação deste dano material deve corresponder ao pagamento do valor de 1/30 do prêmio, ou seja, 1/30 de R$ 40.000,00, corrigidos à época do segundo sorteio. EDcl no AgRg no Ag 1.196.957-DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgados em 10/4/2012.

AnáliseEm busca da reparação pela oportunidade perdida

Na década de 60, os civilistas franceses, na seara da responsabilidade civil, criaram a teoria da perda de uma chance para justificar o dever de indenizar daquele que pratica um ato ilícito, retirando a chance do lesado.

Em palavras mais simples, por tal teoria o autor do dano deve ser responsabilizado quando privar alguém da oportunidade de obter um benefício ou, ainda, se impedir de evitar um prejuízo. Portanto, não se está a prever a possibilidade de indenizar o dano hipotético, mas a perda de uma chance real.

Mas o que seria uma chance real? De acordo com Sergio Cavalieri Filho, seria a probabilidade fundada de se obter lucro ou de se evitar um perda, ou seja, mais que provável, a chance deve ser "quase certa".

A teoria timidamente vem encontrando aceitação em nossos tribunais, com ressalvas e bastante zelo pelos magistrados. Isto porque, conforme alude a ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), "a adoção da teoria da perda da chance exige que o Poder Judiciário bem saiba diferenciar o ‘improvável’ do ‘quase certo’, bem como a ‘probabilidade de perda’ da ‘chance de lucro’, para atribuir a tais fatos as consequências adequadas."

Desta forma, a reparação da perda de uma chance repousa em um juízo de ponderação sobre uma probabilidade e uma certeza. Ora, não basta uma mera probabilidade, mas, sim, uma chance séria e real, que proporcione efetivas condições para ocorrer a situação futura esperada. O que nem sempre fica evidenciado nas situações concretas.

Foi neste sentido que a quarta turma do STJ acolheu por unanimidade os embargos de declaração com efeitos modificativos, para condenar o supermercado pela perda da chance de uma cliente concorrer, entre 900 participantes, a um dos 30 prêmios em disputa (casas).

Entendeu a ministra relatora Maria Isabel Gallotti – em que pese não tenha havido propaganda enganosa, o que impediu a condenação por danos morais –, que ocorreu a violação do dever contratual de comunicação à autora de que fora uma das contempladas no primeiro sorteio e de que receberia um segundo bilhete, com novo número, para concorrer às casas em novo sorteio.

À guisa de conclusão, sustenta a relatora que, neste caso, o fornecedor é obrigado a cumprir o contrato em todos os seus termos, mesmo que gratuito. E com essas razões, condenou o mercado ao pagamento de dano material oriundo da perda de uma chance, o valor correspondente de 1/30 do prêmio, ou seja, 1/30 de R$ 40.000,00, corrigidos desde a época do segundo sorteio.

Com este caso, resta claro que a aplicação da teoria da perda de uma chance visa reparar apenas a perda de uma chance real, evitando-se premiar os oportunistas que tentam se valer de meras possibilidades para obter vantagens econômicas.

Carlos Eduardo Dipp Schoembakla, advogado, professor de Direito Civil e Processo Civil, coordenador adjunto do curso de Direito da UniBrasil

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