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Desde os primeiros dias após a proclamação da República (15.11.1889), foram concebidas a imagem, as cores e as letras do pavilhão nacional cujos detalhes estão expostos e interpretados no artigo anterior. O governo do Presidente Michel Temer adotou tais características para instituir a sua logomarca, demonstrando apreço à tradição e também à simbologia das cores, das estrelas e das palavras que devem constituir o lema de um povo, de um Estado e de uma Nação.

Apesar dessa histórica composição de elementos gráficos perfeitamente identificados com valores e sentimentos de nossa terra e nossa gente, exibidos secularmente em cerimônias militares e civis, nos estabelecimentos de ensino e, muito especialmente, durante competições desportivas do Brasil, alguns experts de plantão em arquitetura e artes gráficas iniciaram um debate estéril acerca da expressão “Ordem e Progresso”. Afirmaram na imprensa e redes sociais que a fonte inspiradora das palavras era “conservadora” por constituir “herança” do positivismo. Na ligeireza de açodadas manifestações, bem como na formação e divulgação dessa infrutífera manobra intelectual contra os valores do civismo e da cidadania, revelaram-se muito salientes os aspectos de oposição irracional ao novo governo formado poucos dias atrás.

Ordem e Progresso foi o título de um semanário do Partido Progressista fundado no Maranhão em 1860 e por meio do qual eram discutidos vigorosamente os mais diversos problemas brasileiros sob a influência doutrinária do Positivismo. O mesmo sucedeu com a publicação de um jornal em Ouro Preto (1884), que era a capital de Minas Gerais.

Pesquisas históricas demonstram que a necessidade, o quanto antes, de segurança social e paz pública, somada às expectativas de desenvolvimento do gigantesco país, estavam nas manifestações populares, nas tribunas acadêmicas, em clubes de serviço, nas reuniões sociais e no discurso de abolicionistas contra as mazelas deixadas pelos costumes perdulários do Império. Apesar do Brasil ter sido o único país da América que se tornou independente e que, por longo tempo, manteve um regime monárquico de governo (1822-1889), não conseguiu atender às aspirações fundamentais de uma sociedade civil livre e capaz de produzir os bens e os serviços indispensáveis para uma economia estável e uma qualidade de vida protegida por garantias e regras essenciais para se libertar definitivamente das amarras de Portugal. Crescia, portanto, a vontade individual e coletiva do progresso.

Naquele mesmo período, fermentavam no continente europeu as ideias básicas de um sistema político fundado na ordem e no progresso, dísticos da Sociedade Positivista, fundada em 1848 por Augusto Comte (1798-1857). A importação e a adoção de princípios identificados com a experiência das grandes comunidades sociais e culturais como a francesa iriam motivar os líderes da primeira República nacional.

A propósito dos mandamentos cívicos impressos na bandeira do Brasil, o Professor Wolf Paul, da Universidade Johann Wolfgang Goethe (Frankfurt, Alemanha), assim esclarece: “Com a inscrição na bandeira da fórmula ‘Ordem e Progresso’, o espírito do positivismo tem-se manifestado como parte integrante da filosofia oficial do Estado brasileiro. Implicitamente, a bandeira republicana do Estado professa a doutrina da chamada ‘philosophie positive’ particularmente a conhecida ‘lei dos três estados da história universal’. (...) O próprio Augusto Comte evidenciou explicitamente a relação semântica da sua filosofia da história universal ao simbolismo da bandeira política (...). Se tomarmos por base a descrição de Comte, então a bandeira nacional brasileira representa a versão nacional da bandeira do ocidente que simbolizava a primeira fase da transição orgânica para a época histórica denominada científica-industrial e, por conseguinte, manifestando claramente a sua posição ideológica” [1].

É fundamental que os cidadãos brasileiros, independentemente de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de identificação tenham, na proclamação cívica das palavras ordem e progresso, a síntese ideal de todas as aspirações populares para conduzir o nosso país a um estágio de desenvolvimento social e cultural que permita vencer todos aqueles que, mediante a corrupção e o desprezo aos direitos e garantias fundamentais, produzem as mais variadas espécies de desgraças públicas.

E que, apesar de todas as dificuldades, seja possível efetivar a promessa de um Estado do bem estar, assumida pelos representantes do povo brasileiro para a efetiva construção de um “Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”.

[1] Ordem e progresso: origem e significado dos símbolos da bandeira nacional brasileira” disponível em: www.revistasusp.br/rfdusp/article

[2] Preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil.

* René Ariel Dotti: Advogado; Professor Titular Direito Penal; Vice-Presidente Honorário da AIDP; Comenda do Mérito Judiciário do Paraná; Medalha Mérito Legislativo da Câm. dos Deputados (2007); Corredator do projeto da nova parte geral do CP e da Lei de Execução Penal (Leis 7.209 7.210/84; Membro de comissões de Ref. do Sist. Penal criadas Min. da Justiça (1979 a 2000); Diploma da OAB, Câmara dos Deputados e Comissão da Verdade (1964-1985) Secretário Secretaria de Cultura do Paraná (1987-1991).

** As opiniões expressas nas colunas apresentam o ponto de vista de seus autores e não refletem o posicionamento do caderno Justiça & Direito, nem do jornal Gazeta do Povo.

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