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Seis meses depois do início da crise que abalou o governo Lula, o homem que operou o valerioduto e todo o esquema de pagamentos a políticos com a cúpula do PT ainda usufrui do conforto de sua vida de milionário. Apesar de ter uma conta com R$ 1,8 milhão na agência mineira do Banco de Boston bloqueada por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), Marcos Valério Fernandes de Souza está fazendo uma grande reforma em sua casa no bairro Castelo, em Belo Horizonte, andando pela cidade em carros importados e gastando verdadeira fortuna com os cinco advogados que contratou, entre os mais famosos e mais caros de Minas. Uma assessora de imprensa exclusiva se encarrega do contato com jornalistas.

Valério perdeu todos os contratos de publicidade com estatais como Banco do Brasil e Correios, suas galinhas dos ovos de ouro, mas do ponto de vista financeiro aparentemente não sofreu abalos. Na verdade, até ampliou seus gastos após o escândalo: contratou a firma de segurança de um delegado de polícia de Uberaba (MG) para proteger a casa no luxuoso condomínio Retiro do Chalé, a 40 quilômetros de Belo Horizonte, onde mora com a mulher Renilda e os dois filhos. O condomínio, que já tem forte segurança armada, tentou impedir a entrada dos homens da Moura Vigilância mas foi obrigado a aceitar a companhia indesejada.

— Valério conseguiu autorização da Polícia Federal para a segurança própria e nada pudemos fazer — disse o morador Oswaldo Drumond, o Vavá, diretor de segurança do condomínio.

Paredões

Renilda abriu um processo contra o condomínio por não ter impedido a entrada de jornalistas quando as denúncias começaram a aparecer. Na casa, permanentemente vigiada pelos seguranças, Valério montou amplo circuito interno de TV, com câmeras em diversos cômodos, cerca elétrica e sistema de alarme completo. Mas nada se compara à fortaleza em que transformou sua casa do bairro Castelo, onde cerca de 20 operários estão construindo uma sauna, ampliando a piscina e concluindo a reforma geral. Muros de cinco metros de altura e uma guarita com seguranças dão à casa a aparência de um presídio bem vigiado. Por cima dos paredões de concreto só é possível ver o telhado.

Além do inquérito em tramitação no STF para apurar o esquema do mensalão, o empresário e seus ex-sócios das agências DNA Propaganda e SMP&B Comunicação respondem a nove ações de execução movidas pelos bancos Rural e BMG para cobrar os empréstimos que fizeram, supostamente para repassar o dinheiro ao PT. Ao todo, os bancos cobram R$ 55 milhões com juros e correção monetária. Nada que abale Valério. Antes mesmo de o escândalo estourar, ele transferiu seus imóveis para o nome dos filhos Nathalia e João Victor, inclusive os terrenos onde hoje estão as pistas de salto do Centro de Preparação Eqüestre da Lagoa (Cepel), e uma sala comercial. Com isso, Valério não corre sequer o risco de ter o patrimônio penhorado para pagar dívidas.

Os únicos que se deram mal, por enquanto, foram seus sócios na DNA, na SMP&B e na MultiAction Entretenimentos, que estão sendo obrigados a fechar as empresas diante da forte rejeição do mercado à exposição negativa na mídia, e o cavaleiro Pedro Paulo Lacerda, o dono do Cepel, onde Valério guardava seus 13 cavalos de competição. Segundo Lacerda, Valério levou os cavalos para a fazenda de um amigo alegando ter de reduzir despesas. Foi embora inclusive a égua Petra Z, com a qual o cavaleiro disputava competições profissionais. Só ficou no Cepel um dos cavalos montados por Nathalia, campeã brasileira mirim de saltos. Lacerda está sem cavalos para disputar as competições e teve de demitir dez dos 40 funcionários do Cepel. Valério, porém, sequer mencionou a hipótese de se desfazer dos terrenos da hípica.

Mas se do ponto de vista financeiro a vida do operador do mensalão continua sem grandes problemas, pessoalmente ele tem passado por situações constrangedoras. Na semana passada, a agência de publicidade Libra Comunicação espalhou outdoors por Belo Horizonte com a fotografia de uma carequinha igual à de Valério com o desenho de uma mão espalmada na nuca, como se o empresário estivesse levando um tapa. Ao lado, a inscrição: "Agência de mãos limpas não tem nada a temer". A campanha deverá ser estendida a TV, cinema, rádio e jornais. Desde que estouraram as denúncias, Valério e Renilda evitam lugares públicos para não serem hostilizados. Valério deixou de aparecer em seus restaurantes preferidos e Renilda só sai de casa com um penteado diferente e óculos escuros.

A rotina do operador do valerioduto praticamente resume-se a despachar com os advogados no escritório que mantém na Tolentino & Melo Assessoria Empresarial, empresa de lobby da qual é sócio com os advogados Rogério Tolentino e José Roberto Moreira de Melo. Lá, ele lê diariamente o noticiário sobre o valerioduto e sempre convoca a assessora de imprensa Cláudia Leal para escrever notas contestando declarações de parlamentares das CPIs ou de envolvidos no escândalo. Na sexta-feira, divulgou nota repudiando afirmação do governador Aécio Neves de que teria repassado dinheiro público ao PT. Não exerce atividade remunerada, quase não recebe visitas ou telefonemas e sua relação com os ex-sócios, exceto Tolentino, é muito ruim, embora ainda se encontrem para tentar resolver problemas.

— Ele já teve dias muito tristes, mas sempre procura reagir. É uma pessoa tranqüila e já está conseguindo lidar com tudo isso. E sabe que o período dos holofotes está chegando ao fim — diz a jornalista Cláudia Leal.

Deputados Há dois meses, Valério sofreu um baque com a morte do pai, Adeliro. Os deputados mineiros, que antes viviam pedindo favores e agora apagaram seu nome das agendas dos celulares, não foram ao enterro. Só estava presente o deputado federal Virgílio Guimarães (PT), o conterrâneo de Curvelo (MG) que apresentou Valério à cúpula do PT. Ultimamente, o empresário recusa-se a dar entrevistas e passa boa parte do tempo em casa. Parou de sair para fazer cooper e dificilmente passeia com os filhos. Nas primeiras viagens a Brasília para depoimentos na CPI e na Polícia Federal, foi de jatinho particular. Numa das vezes, chegou a voltar de carro a Belo Horizonte, percorrendo 700 quilômetros de estrada, para não pegar vôos de carreira. Mas já foi visto embarcando em vôos regulares, sob curiosidade geral.

A obsessão por privacidade não evitou que há algumas semanas garotos do Retiro do Chalé reagissem aos gritos de "ladrão, ladrão" ao vê-lo baixar o vidro do carro para passar o crachá de identificação na entrada do condomínio. Valério foi embora sem reagir. Com Nathalia, de 14 anos, o problema foi mais grave. Colegas de colégio passaram a hostilizá-la em sala de aula, obrigando a família a pedir ajuda à direção do colégio, que a mudou de turma.

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