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Memória

Nova imagem pode reabrir investigação do caso Herzog

Agência O Globo

Um novo enquadramento da imagem do corpo de Vladimir Herzog, cuja morte nas dependências do DOI-Codi em São Paulo, em 25 de outubro de 1975, prejudicou a intenção de um projeto de poder dos setores mais radicais do Exército brasileiro durante a ditadura militar, deve contribuir para a reabertura judicial do caso. A foto e uma carta enviada pelo general Newton Cruz em 23 de janeiro do ano seguinte ao também general e seu chefe no Serviço Nacional de Informações (SNI), João Batista Figueiredo, divulgadas pelo deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) e publicadas no site www.leidoshomens.com.br na última terça-feira, reforçam a tese de que o jornalista teria sido assassinado pelos militares e não cometido suicídio como foi sugerido à época.

"A ocultação da barra ou das barras superiores àquela a que foi amarrado Herzog, na foto distribuída aos jornais, procura induzir à fantasiosa versão de suicídio, que se torna ainda mais inverossímil na foto xerocopiada no panfleto mandado por Newton Cruz a Figueiredo", diz o site ao lembrar que "a cinta passada em torno do pescoço estava amarrada em uma barra de ferro a 1,63m de altura, o que impedia a suspensão em vão livre do corpo de Vladimir Herzog, cujas pernas se dobravam no chão".

A imagem divulgada pelo Instituto de Criminalística logo após o suposto suicídio de Herzog não mostrava a parte de cima das grades, o que induziu dessa maneira à conclusão de que ele teria se matado e não sido assassinado na cela em que estava preso.

Já a carta enviada por Newton Cruz a Figueiredo indica que havia uma disputa interna de poder no comando do regime. No documento, escrito três meses após a morte do jornalista, ele reclama das divergências internas a seu superior no SNI, com um bilhete onde atesta, entre outras informações, que a tal fotografia não fora distribuída aos jornais.

Tal disputa interna ocasionou, quatro dias antes de a carta ser enviada, a demissão do general Ednardo D´Ávila Mello, do comando do 2º Exército de São Paulo, e responsável pelas dependências do DOI-Codi onde Herzog e o metalúrgico Manuel Fiel Filho foram mortos.

O Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro criou um grupo de trabalho chamado "Justiça de Transição" para promover a investigação e persecução penal de "graves violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar no Brasil", segundo o entendimento do órgão.

Orientado pela 2.ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, o grupo pretende apurar os crimes de quadrilha, sequestro qualificado, ocultação de cadáver e outros delitos cometidos no regime militar que, segundo o MPF, "envolvam atos de impedimento da busca da verdade e da justiça por parte dos investigados".

De acordo com entendimento unânime da 2.ª Câmara, os agentes públicos que se excederam e cometeram crimes durante a ditadura agiram como representantes de todo o Estado, e não apenas de seu segmento militar. Por isso, eventuais crimes cometidos submetem-se à jurisdição federal, havendo atribuição do MPF.

Segundo a lógica da argumentação, ocorreria a "independência das esferas de responsabilização", podendo os agentes públicos serem investigados pelo MPF mesmo que o Ministério Público Militar tenha arquivado ou venha eventualmente a arquivar investigações.

De acordo com o MPF, a criação do grupo "Justiça de Transição" está alinhada à sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos que condenou o Brasil por violações de direitos previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos nos vários episódios sucedidos no contexto da "Guerrilha do Araguaia".

A corte sentenciou que o Brasil teria a obrigação de investigar quem são os autores materiais e intelectuais do desaparecimento das vítimas, em razão do caráter permanente desses crimes, não aplicando a Lei de Anistia em benefício dos agentes de crime, nem prescrição ou qualquer outra excludente de ilicitude para eximir-se de investigar.

"Em atendimento ao decidido pela Corte Interamericana, a 2.ª Câmara do Ministério Público Federal reconheceu que os tratados internacionais de Direitos Humanos firmados pelo país impõem ao Ministério Público Federal e à Justiça Federal a investigação e a persecução dos ilícitos cometidos durante a ditadura militar no Brasil. Assim, desde o final do ano passado, as unidades do Ministério Público Federal vêm se reunindo e organizando para dar cabo dessa missão", afirma o procurador da República Luiz Fernando Lessa.

Anistia

Em abril de 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) se manifestou contrariamente à revisão da Lei da Anistia, proposta por ação da Ordem dos Advoga­­­dos do Brasil (OAB). A entidade pretendia que o STF anulasse o perdão dado aos representantes do Estado (policiais e militares) acusados de praticar atos de tortura durante o regime militar. O caso foi julgado improcedente por 7 votos a 2.

O voto vencedor foi do ministro Eros Grau, relator do processo. Eros fez uma minuciosa reconstituição histórica e política das circunstâncias que levaram à edição da Lei da Anistia e ressaltou que não cabia ao Poder Judiciário rever o acordo político que, na transição do regime militar para a democracia, resultou na anistia de todos aqueles que cometeram crimes políticos e conexos a eles no Brasil entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.

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