• Carregando...
Porto de Paranaguá: operação da Polícia Federal prendeu 10 pessoas em janeiro | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Porto de Paranaguá: operação da Polícia Federal prendeu 10 pessoas em janeiro| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

Ações da PF são anuladas pela Justiça com frequência

Não é regra, mas são cada vez mais frequentes casos de grandes operações da Polícia Federal (PF) que são desarticuladas por decisões do Poder Judiciário. E uma das causas pode ser justamente a legislação brasileira – mais especificamente a desarmonia existente entre o Código de Processo Civil (CPP), que é de 1941, e as normas e leis atuais.

A operação Castelo de Areia ruiu este ano depois que Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou ilegais todas as provas obtidas a partir da quebra do sigilo de dados telefônicos. A Operação foi deflagrada em 2009 para investigar supostos crimes envolvendo a construtora Camargo Corrêa.

Nesta terça-feira, o Ministério Público Federal (MPF) e a PF do Paraná viram parte da Operação Dallas, que investigou irregularidades no Porto de Paranaguá, também desmoronar por causa de uma decisão judicial.

Tentar anular os efeitos de uma operação policial é uma rotina entre os advogados criminalistas. E faz parte do jogo. O jurista e constitucionalista Luiz Roberto Barroso acredita que "é normal e compreensível que advogados criminais explorem aspectos relacionados aos vícios formais de um processo". Mas, ao mesmo tempo, ele en­­tende que há casos de abuso por parte da autoridade que investiga, principalmente nas questões relacionadas a interceptações telefônicas.

Tendo no currículo grandes operações contra o narcotráfico, como a Fênix, que resultou na maior condenação do traficante Fernandinho Beira-Mar, o delegado regional de investigação e combate ao crime organizado da PF do Paraná, Wágner Mesquita de Oliveira, acredita que ainda são exceções casos como a Castelo de Areia e a Dallas.

Para ele, as técnicas utilizadas pela PF são todas acompanhadas de perto pela Justiça de 1.º grau e pelo MPF. Oliveira diz que, quando o caso chega na segunda instância, o magistrado está distante dos fatos – e por isso passa a fazer a interpretação jurídica.

Três motivos

O procurador regional da República em Salvador, Vla­­­dimir Aras, enumera três motivos pelos quais grandes operações da PF são desconfiguradas quando são questionadas na Justiça: "O emaranhado legislativo criado com sucessivas normas e leis defasadas; a sensibilidade de certos tribunais a teses processuais de violação do processo legal; e, por último, a existência de profissionais que exorbitam suas funções".

Tanto Mesquita quanto Aras, que já foi procurador no Paraná e atuou nas investigações sobre evasão de divisas por meio das contas CC5 do Banestado, dizem ser mais que necessária uma reforma legislativa para harmonizar as novas leis com o CPP.

A Procuradoria Regional da República da 4.ª Região vai recorrer à Justiça para garantir que as provas obtidas pela Polícia Federal (PF) na Operação Dallas não percam a validade. E, para isso, usará as mesmas "armas" que foram usadas pelos investigados que conseguiram anular as provas: irá alegar que a defesa recorreu a um juízo incompetente para anular os dados colhidos na investigação.

A operação da PF prendeu dez pessoas em janeiro deste ano acusadas de envolvimento em supostas fraudes cometidas no porto de Paranaguá. Mas a 7.ª turma do Tri­­bunal Regional Federal (TRF4) tornou sem efeito jurídico as escutas, interceptação de e-mails e os documentos apreendidos na operação.

Entre os crimes investigados no Porto estavam o desvio de cargas a granel, favorecimento de empresas responsáveis pela retirada de resíduos do terminal portuário, além dos crimes de corrupção ativa e passiva, desvio de dinheiro público, superfaturamento, fraude em licitação e formação de quadrilha. Segundo estimativa da Receita Federal à época, apenas os desvios de carga podem ter lesado os cofres públicos em até R$ 8,5 milhões.

Na última terça, o TRF4 decidiu que a vara Federal de Para­­­naguá era incompetente para autorizar escutas telefonicas na investigação. O procurador Douglas Fischer disse ontem por telefone que vai usar a mesma tese para recorrer da decisão: vai alegar a incompetência da 7.ª turma do tribunal para julgar o caso. Fischer só aguarda a publicação do acórdão para protocolar o recurso.

Para o procurador, o juiz de Paranaguá e o MPF, que atuaram na Operação Dallas, agiram de forma "legítima e consoante com as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ) – ao contrário do que entenderam os desembargadores da 7.ª turma". Caso a nulidade das provas seja mantida, Fischer deve ingressar com mandado de segurança no STF para garantir a continuidade das investigações.

Ontem por telefone, o procurador explicou que a competência para julgar ações sobre a Operação Dallas seria da 8.ª turna do TRF4, pois o desembargador Paulo Afonso Brum Vaz, membro desta turma, julgou em janeiro deste ano um pedido de habeas corpus do ex-superintendente da Admi­­nistração do Porto de Paranaguá e Anto­­­nina (Appa), Daniel Lúcio de Oliveira. Desta forma, a competência para julgar casos relacionados à Operação Dallas seria da 8.ª turma pelo critério jurídico da prevenção (o juiz que primeiro atua na causa até o final).

Todas as decisões judiciais que deflagaram a operação Dallas partiram do juiz federal Marcos Josegrey da Silva, da Vara Federal de Paranaguá. Mas os desembargadores da 7.ª turma do TRF4 entenderam que, pela natureza das irregularidades, principalmente a suposta lavagem de dinheiro, a competência para autorizar a investigação seria das varas especializadas em Crimes contra o Sistema Financeiro, da Justiça Federal de Curitiba.

Para o procurador Fischer, no entanto, a decisão que declara a nulidade das provas afronta entendimento do STF tendo em vista que, durante a investigação, havia apenas suspeita de crime de lavagem de dinheiro, considerado crime contra o sistema financeiro. "O juízo de Paranaguá tinha absoluta competência para conduzir o inquérito", disse.

Se os argumentos do procurador forem aceitos pela turma recursal do TRF4, as provas obtidas com escutas telefônicas autorizadas pela Justiça serão revalidadas. Fato que por si só não garante a continuidade dos inquéritos, explica Fischer, pois o habeas corpus que anulou as provas teria que ser apreciado novamente pela 8.ª turma.

Procurado pela Gazeta do Povo, o advogado Juliano Breda, que obteve a anulação das provas, disse que só vai se manifestar depois de analisar o recurso.

Interatividade

A culpa pela anulação de ações da PF se deve à lei ou a erros dos policiais federais?

Escreva para leitor@gazetadopovo.com.br

As cartas selecionadas serão publicadas na Coluna do Leitor

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]